José Flórido
A propósito de um
texto recente, perguntou-me um Amigo a razão por que, nesse texto, fiz referência à 'Linguagem dos Pássaros'.
Confesso que não o sei dizer inteiramente. Mas, a "Linguagem dos
Pássaros" é talvez a linguagem do Amor, sendo certamente por esse
motivo que o poeta persa do século XII,
Farid ud Attar, atribuiu esse título a
um grande poema místico, que contem a essência do pensamento sufi. E é, de
facto, uma verdadeira epopeia do Amor.
Depois de um prólogo de grande beleza, o autor apresenta uma
reunião de pássaros, em que a grande Guia, a Poupa, insiste na importância de um coração puro,
para que seja possível seguir o Caminho
conducente ao Supremo, a Via do Amado, que "está bem próxima de cada um de
nós, mas em que nem todos estão próximos dela". Convida então outros
pássaros, no sentido de seguirem por esse Caminho superior. Mas, a maior parte,
recorre a desculpas tolas, recusando avançar: O rouxinol argumenta que, para
ele é suficiente o amor da rosa; o papagaio pretende apenas beber a água da
fonte 'verdejante'; o pato sente-se satisfeito com a superfície da água onde
costuma nadar; a perdiz ambiciona as pedras preciosas; o falcão pretende
somente a companhia dos reis; a garça quer
desfrutar a beleza de uma gota de água à beira-mar; e o pardal,
reconhecendo a sua própria fragilidade, receia a caminhada...
Mas, para se empreender esta Viagem, é preciso, além de um
coração puro, possuir as virtudes da
coragem e da constância, porque isso envolve o 'Combate interior' (Jihad) com
as nossas próprias fraquezas e limitações. Para a Poupa, "só aquele que
abre os olhos para o Amor e que sabe que o Amor é a substância do
Universo", é capaz de alcançar o Supremo objectivo.
Eis alguns fragmentos do Poema:
A LINGUAGEM DOS PÁSSAROS E AS TRANSFORMAÇÕES DA ALMA
.
Oh, homem do Caminho, não leias o meu livro como lírica ou
como fruto da altivez. Observa o meu texto sob o prisma do amor, para que de
cem dores de amores confies num deles. Quem isto observar sob o prisma do amor,
lançará para a sua presença a bola do triunfo.
Esquece o ascetismo e a simplicidade: é necessário amor,
amor e renúncia.
Todo aquele que tem amor renúncia ao remédio, aquele que
deseja remédio renúncia à alma. “A Linguagem dos Pássaros”, de Farid ud-Din
Attar, versos 4495 a 44991
.
Há um caminho para os que, de coração, cheguem ao rei, mas
para o coração extraviado não há caminho. Idem, verso 1137
.
Espalhei por aqui e por ali as rosas deste jardim, que fique
boa memória de mim, amigos!
No meu livro, cada um e a seu modo se vê a si mesmo num
instante e se deixa de ver.
Também eu, pois, como os que partiram, descobri o pássaro da
alma perante os adormecidos.
Se, com este livro, o coração de um constante adormecido for
despertado por um instante,
Terei então a certeza de ter cumprido o meu dever e a minha
inquietação e tristeza terão fim.
Como uma tocha ardi longo tempo para iluminar, chamejante,
um mundo.
Como da tocha, saiu fumo do meu cérebro. Chama da
eternidade, até quando soltarei este fumo? Idem, versos 4519 a 4525
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