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terça-feira, 29 de julho de 2025

Início do Verão, 2025

 Luís Santos

O PALACETE DOS CONDES DE SAMPAYO

Deambulando pela terriola, Alhos Vedros, fomos apreciando, admirando, um conjunto de lugares que ao longo dos tempos se foram erguendo e que dão valor, beleza, bem-estar, a quem por aqui faz a sua vida, ou simplesmente vai passando.

Momentos em que, por satisfação interior, só se nos inclina o olhar para o que de mais positivo as coisas têm:

a Igreja Matriz que nos olha do alto dos seus aproximados novecentos anos de história;

o harmonioso conjunto arquitetónico da Biblioteca/Centro Cultural José Afonso;

todo aquele espaço verde florido lúdico calmo do Parque das Salinas;

o velho cais que, como por lá se diz, remonta ao início da nacionalidade, e nele, obra de nós todos, a fabulosa reconstrução do Palacete dos Condes de Sampayo que em deslumbrante conjunto cultural único se liga ao Moinho de Maré da Azenha.

E, sobre ele, no portal do Município da Moita, diz-se assim:

Concluída a primeira fase da intervenção de conservação e restauro, este novo equipamento da rede de infraestruturas culturais do concelho da Moita, constitui um novo e importantíssimo recurso cultural que projeta o Palacete Condes de Sampayo como a futura sede do Museu Municipal da Moita.

Venha então a segunda fase de tão significativo investimento, de obra tão bem conseguida.

De certa forma, estas GUARDIÃS DA VIDA assemelham-se a figuras humanas. Assinalável presença, estão bem vivas, observam-nos, têm emoções e são o respirar nosso de cada dia.

Lembram-nos uns irmãos nossos da Etiópia, nas margens do rio Omo, que quando colocam colmeias entre as suas ramadas, cantam-lhes canções sagradas, porque sem elas as colmeias poderiam aparecer sem mel...

Esse lugar, naquela zona do "corno de África", morada desse povo, foi onde foram encontradas as ossadas dos hominídeos mais antigos que se conhecem, assim tipo, Adão e Eva no berço da humanidade.

A um desses esqueletos encontrados, uma mulher, como na altura passava na rádio uma canção dos Beatles, "Lucy in the sky with diamonds", os arqueólogos deram-lhe o nome de Lucy.

Portanto, entre outros mais antigos que naquele lugar se encontraram, Lucy, a mãe de nós todos, gente de uma mesma família, de uma mesma estrela.

quarta-feira, 4 de junho de 2025

José Pacheco. Fazendo a Ponte.


José Pacheco 

 José Francisco de Almeida Pacheco educador e pedagogo, grande defensor e dinamizador da gestão democrática da educação, nasceu no Porto em 10 de maio de 1951.

Foi professor primário e universitário. Crítico do sistema tradicional de ensino, defende uma escola sem turmas, sem testes ou exames, sem reprovações, sem campainhas Para ele, a aula tradicional é um sistema ultrapassado de reprodução de conteúdos que impede cada criança, cada pessoa, de se cumprir em corpo e alma.

Em meados de 2017, era impulsionador de dezenas de projetos para uma nova educação no Brasil e colaborador voluntário no Projeto Âncora, que segue o mesmo método de ensino da "Escola da Ponte". Uma escola focada na autonomia e protagonismo do aluno, no “aprender a aprender”, na “autoformação orientada”, centrada numa relação estreita entre professor e aluno. “A Escola com que Sempre Sonhei sem imaginar que Pudesse Existir”, como diz o título do livro do grande pedagogo brasileiro Rubem Alves.

A famosa Escola da Ponte em Portugal está a fazer 50 anos. José Pacheco um dos seus criadores vive há 25 anos no Brasil, mas o projeto ficou bem ancorado e, até hoje, continua bem vivo, assente num modelo pedagógico de vanguarda que o distingue dos princípios políticos educativos que orientam a gestão da escola pública no país.

Embora radicado no país irmão, José Pacheco vem habitualmente a Portugal participar em encontros vários, onde discorre sobre os seus ideários pedagógicos, e a praxis em que eles se erguem, sendo que é esse um dos méritos que se lhe reconhece, não se reduzir à elaboração de ideias num plano exclusivamente teórico, mas antes servir-se da teoria para desenvolver práticas bem consolidadas. A Escola da Ponte em Portugal, o Projeto Âncora no Brasil, são dois desses significativos projetos, também sustentados pela publicação de uma centena de livros pelo mundo inteiro.

Nos últimos anos tem vindo também a globalizar as suas ideias na criação de uma “rede de comunidades de aprendizagem”, com encontros regulares online, onde com vai partilhando e debatendo as suas propostas educativas.

Este ano, 2025, meses de abril e maio, preparou para Portugal uma série de Encontros sobre Educação, Guimarães, Lisboa, Setúbal… onde, onde em articulação com entidades e colegas, vem falar das suas mundivivências pedagógicas e lançar dois novos livros: “Porque não há mais Escolas como a Escola da Ponte?” e “Inovação Mata Inovação”. Curiosamente, a sua obra, embora publicada em vários países do mundo, não está publicada e é pouco conhecida em Portugal. Porque será?

É evidente que as ideias em que José Pacheco alicerça o seu pensamento não surgem unicamente das experiências acumuladas enquanto professor, num percurso já com mais de cinco décadas. Herdeiro que se diz do movimento social do “Maio de 68”, iniciou a profissão ainda no tempo da “velha senhora”, leia-se, ainda durante o regime fascista em Portugal, antes da Revolução Democrática do 25 de abril de 1974, período em que chegou a ser preso político, por oposição ao regime.

As suas ideias são sustentadas pelos desenvolvimentos pedagógicos da modernidade, muito particularmente, depois do aparecimento do movimento da “Escola Nova”, que António Sampaio da Nóvoa adjetiva como “a melhor geração pedagógica de sempre”, uma síntese herdada de ilustres educadores e professores que alguém apelidou como os “filhos de Rousseau”, tais como, Dewey, Montessori, Steiner, Freinet, Freire, Adolfo Lima, António Sérgio e, como diz Pacheco, muito particularmente Agostinho da Silva. Como disse neste abril no Encontro de Guimarães, foi quando conheceu a obra de Agostinho da Silva, avidamente lida de uma ponta a outra, que consolidou o ideário pedagógico  com que se lançou no projeto da Escola da Ponte.

Agostinho da Silva que, aproveite-se a deixa, também passou 25 anos da sua vida no Brasil, onde lecionou em várias universidades, do norte ao sul do país, tal como criou vários Centros de Estudos, como por exemplo, o Centro de Estudos Afro-Orientais, na Universidade de São Salvador da Bahia, e o Centro de Estudos Portugueses, na Universidade de Brasília, onde acaba por fechar a sua atividade docente, depois do golpe militar que instaurou a ditadura no país.

Agostinho da Silva regressa a Portugal em 1969 e, além do mais, é nele que José Pacheco, como o próprio diz, vai encontrar o impulso decisivo que o levaria aquele ímpar projeto de inovação pedagógica. Mas, acrescente-se que no arranque inicial do Projeto não estava só, com ele estavam mais duas professoras, cujos nomes pouco aparecem a público, que erguendo os valores da liberdade, responsabilidade e solidariedade, o ajudaram a “Fazer a Ponte”.

Luís Carlos R. dos Santos
maio/2025

Referências principais: José Pacheco, Educação Nova, Escola Moderna, Célestin Freinet, Agostinho da Silva, Rubem Alves.


domingo, 27 de abril de 2025

Crónicas de Viagem

 Luís Santos


“The total number of minds in the universe is one. In fact, consciousness is a singularity phasing within all beings.” (Erwin Shrodinger)

ROMA

FRONTEIRA. Uma simples linha branca que separa 2 Estados: pé direito em Itália, pé esquerdo no Vaticano.

Domingo de Páscoa. Não fomos cumprir promessa, nem fomos em peregrinação, mas assistimos às Comemorações na Praça de São Pedro.

Por isso, ouvimos as últimas palavras do Papa Francisco: Desejos de uma boa Páscoa para todos, todos, todos.

E mais não disse... mas pressente-se: Partir desta forma, numa data destas, parece-nos uma boa escolha.

FLORENÇA

Como contar isto?

Regressámos lá

um antro de arte a céu aberto

infinita beleza

nas coisas mais simples

gelado e café

arquitetura, pintura, escultura

Miguel Ângelo, David, Pietá

Vénus,

o Amor

e vimo-La

em carne e osso,

deusa na terra nascida.

Receba as flores que lhe dou


ROMA, Para terminar a trilogia da viagem.

Sempre instigante a sua leitura de trás para a frente, como se tivesse em si tudo e o seu contrário.

E, de facto, a capital do grande império, do "mar nostrum", dos grandes exércitos, das hordas de escravos, do "dolce far niente", Vénus, da beleza e do amor, dos divinos bacanais, do vinho, do circo romano, do polegar do imperador. O espetáculo do sangue, do estalar dos ossos, homens e animais, ao vivo e a cores.

Da região do Lácio, da última flor do lácio, Língua Portuguesa, inculta e bela, Olavo Bilac, entre outras latinas, e muitas mais latinas que ao mundo se haviam de dar.

Do cristianismo. Concílio de Niceia. Faz mil e setecentos anos.Jubileu 2025.

Francisco.

Morrer assim, entre cristalinos valores, no curso do rio da história, fraternidade e liberdade, em busca da paz, com o Coliseu nas costas, acaba por dar mais dignidade ao projeto.

Portugal, etc.

No tempo longo tudo muda... muito. Embora, intrinsecamente, tudo permaneça, mais ou menos, na mesma. Como no ciclo da chuva. Natureza.


domingo, 9 de março de 2025

Quando eu for grande quero ir à Primavera

 por Luís Santos

José Pacheco na Escola Superior de Educação de Setúbal

QUANDO EU FOR GRANDE QUERO IR À PRIMAVERA

É o título de um livro do Professor José Pacheco. Grande homem. Tudo pelos alunos, por uma boa educação, ajudando-os tanto quanto possível a construírem-se como pessoas de excelência, sobretudo os mais frágeis, os abandonados à sua sorte, numa natureza dura de contrariar. Em breve, vindo do Brasil, onde vai desenvolvendo um extraordinário projeto de educação, voluntário, regressará à nossa Escola para nos oferecer a todos, mais uma das suas belas lições.

José Pacheco leva-nos a Rubem Alves, um outro pedagogo e poeta dos grandes, brasileiro, que fisicamente já nos deixou. E deixou-nos muito. Como, por exemplo, “A Escola com que sempre sonhei, sem sem imaginar que pudesse existir”, a tal Escola da Ponte, Vila das Aves, que há muitos anos funciona como um farol que nos orienta.

Uma citação do livro de Rubem Alves que se refere: “O pássaro pousa no ombro de todos os que sobreviveram à pergunta: o que queres ser quando fores grande?...”

Juntamos também um poema dos nossos:

Estudar é procurar
o caminho de lá chegar,
aprender a ser


Ir à escola é ir estudar
Ensinar é ajudar a crescer,
a ser feliz


Ir à escola
não é (só) ir trabalhar
é ensinar e aprender,
a brincar


sábado, 15 de fevereiro de 2025

UMA LÍNGUA DE FOGO

Arte de Rua
por Luís Santos


Agarro o pensamento
e paro, por um pequeno momento,
o tempo.

Dobro e redobro o papelinho,
guardo a ideia na carteira,
e espero que a inspiração
dure a semana inteira
Arte de rua em projeto, ou acrescentando palavras às árvores


No espírito da Street Art, relembrando uma fotografia nossa a belíssimo graffiti, feito a partir de fotografia de Augusto Cabrita, por Ricardo Tota

segunda-feira, 30 de dezembro de 2024

Trovas do vento que passa

Luís Santos


THE BOAT LOVE 

Uma casa feita um barco

de barro,

casca de nós ao luar

deslizando pelo meio do mar

estrelado imenso, ondas de luz

e truz

vai atracar

porto de vida que não cessa

um abraço que não pára.

Festas Felizes.

O barquinho vai,

a tardinha cai.

O PÁSSARO AZUL

Faz já algum tempo, um pássaro como numa aparição, pousou mesmo à nossa frente.

Quando o passámos para poema, logo o pintor, amigo, António Tapadinhas lhe dedicou uma tela. Chamou-lhe "o pintor e o pássaro azul".

Este "pássaro azul", uma ave que anuncia boa sorte, boas aventuranças, além de poema também nos inspirou uma canção, inédita, que deixamos em baixo.

Ainda este ano, Janita Salomé também lhe deu nome no seu último album. Muito bom. Basta ir no "you tube".

António Arnaut, o pai do Serviço Nacional de Saúde, publicou um livro de contos e poemas de Natal que assim o intitulou. Um livro que encerra em si a ideia de milagre... Livro que agora inspira uma Cantata de Natal hoje apresentada, às 18h, no Convento de São Francisco, em Coimbra, e que é dedicada justamente ao SNS.

Mas há mais...


Eis a canção:

PÁSSARO AZUL

Pássaro azul - Bis

Passar o mi

Passar o sol - Bis

Pássaro azul - Bis

Cantar o lá

Passar esta vida

Cantar o lá

Tocá-la em si

Passar o mi

Pássaro azul - Bis

Parar o tempo

Passar a dor

Vencer o espaço

Passar o amor

Pássaro azul - Bis


domingo, 8 de dezembro de 2024

"Fui Lá Visitar Pastores..."

 por Luís Santos


1. O PENSADOR

Quando o irmão Bapu* nos convidou para o visitarmos em Luanda(!), entre vários outros artefactos, trouxemos de lá um "Pensador", companheiro de todos os dias, extraordinária estatueta que é um dos símbolos nacionais de Angola.

Essa estatueta, anos passados, acabou por dar um trambolhão e ficou amputada nalgumas partes do corpo... e nós amputados também... mas, curiosamente, logo nos ofereceram outra com o dobro do tamanho.

Temo-la exposta em casa, ao lado da secretária de trabalho, escritório e quarto, e hoje ao olharmos para ela, mais uma vez, admirámos a perfeita estética, a robusta e encantadora madeira, pau-preto.

Depois o pensamento levou-nos ao Mpingo, o nome da árvore, à semente que a deu, na terra vermelha em que cresceu, da água que bebeu, luz do sol, via láctea, galáxia das galáxias. Quem diria, este Pensador feito uma semente, tem em si o universo inteiro.

Mais ainda, além de uma admirável cultura, representa a experiência dos longos anos, a sabedoria e o conhecimento dos segredos da vida.

Valete, fratres.

(*) Bapu, quer dizer “pai”, nome com que os indianos se referem carinhosamente a Mahatma Ghandi. Mahatma, por sua vez, significa grande alma, venerável. Aqui, extensível a um querido irmão, e ele sabe quem É.


2. OS PAPÉIS DO INGLÊS

Ontem à noite fomos revisitar Angola. Fomos sozinhos, mas não desacompanhados. Esta coisa de deixar o medo e pensamentos negativos de lado, foi princípio que a vida nos ensinou. E até porque, em boa verdade, somos todos muitos mais do que só um.

Na lembrança, lá mais atrás, uma inesquecível visita a um irmão de armas, mas não militares, embora em período de guerra civil. Daquela vez à volta de Luanda, até ao Mussulo. Sempre fomos puxando pelo fim das guerras, e conseguimos. 40 anos.

Ontem, foi o deserto do Namibe. Corre-nos no sangue. Toda aquela faixa de areia avermelhada, onde não há mais nada, a beijar a longa costa atlântica, de onde nos chegam flores do lácio, Mariana.

Fomos lá visitar pastores.

P.S.: Os Papéis do Inglês é um filme produzido por Paulo Branco e realizado por Sérgio Graciano a partir do livro do antropólogo Ruy Duarte de Carvalho "Vou Lá Visitar Pastores".


quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Mural da História

 por Luís Santos

OUTONAIS

Ainda há pouco, quando fui comprar o pão nosso de cada dia, dei com uma conversa de circunstância entre vizinhos, sobre um conflito primário que se lhes relacionava e, pensei eu com os meus botões, certamente de forma algo injusta, tratarem-se de pessoas com um qualquer tipo de ligação à azáfama de coisas mais básicas que durante o resto do dia ficam ligados nos crimes do “correio da manhã tv” que, como se sabe, a julgar pelo elevado “share” das audiências, é um dos canais que determinam a representatividade política da nossa jovem democracia. E, de repente, pelo meio do ruído que ecoava pelas paredes da padaria, sem olhar a quem, de forma inesperada e em jeito conclusivo, saiu-se assim: “deixe lá, o universo sempre acaba por pôr as coisas no seu lugar”.

Mural da história: Tão evidentes que são os limites da nossa natureza e, ao mesmo tempo, tão ilimitados. 

UMA FAMÍLIA DO NEPAL

Ontem numa turma que junta estudantes de dois cursos de licenciatura, "Comunicação Social" e "Tradução e Interpretação da Língua Gestual Portuguesa", falámos de estudos antropológicos sobre a organização da família em vários povos espalhados pelo mundo.

Nesses estudos, fizémos referência ao que se chama de monogamia, bigamia, poligamia e poliandria. De forma simplificada, chama-se de monogamia quando uma união familiar junta um homem e uma mulher; de poligamia quando um homem vive maritalmente com duas ou mais mulheres; e de poliandria quando uma mulher casa com vários homens.

O primeiro caso faz regra um pouco por todo o mundo ocidental; o segundo caso é muito frequente no continente africano; o terceiro caso encontra-se em países da Ásia.

Na foto, uma mulher do Nepal com seus três maridos.

Mural da história: As sociedades humanas caracterizam-se, de facto, por uma grande diversidade cultural nas múltiplas formas em que se organizam.


sábado, 12 de outubro de 2024

Coisas que se vêm da nossa janela

 por Luís Santos


Filho de muito boa gente, mas muito pouco dados às letras, ainda assim, puseram-me na escola paga logo aos 3 anos. Desconheço as razões porque o fizeram, mas fiquei de tal forma com o destino marcado que nunca mais de lá saí. No meio de inúmeras dificuldades e obstáculos, lá fui fazendo uma vida de Professor, faz muitos anos.

Quando ingressei na Universidade, tive como Professor um chileno, que fugia do golpe fascista de Pinochet, e acabou a coordenar licenciatura que eu fiz, enquanto já ia dando umas aulas que me garantia a almejada autonomia financeira.

Esse Professor, de seu nome Raul Angel Iturra, que veio do lugar chileno de Vale Paraíso, se bem me lembro, com doutoramento pelo meio feito em Cambridge, acabou também por presidir à Associação Portuguesa de Antropologia que, por seu convite, acabei por integrar durante dois biénios. Em resumo, aqui ficaram dez anos de vida que nos juntaram, o Doutor que veio do Chile e o filho de gente nada ligada à escola que, por ironia do destino, haveria de cair nas letras que tão pouco lhe diziam.

Hoje, o distinto Doutor que, entre-tanto, se tornou Professor catedrático, agora jubilado, depois de muitos anos de intervalo, tornou-se nosso colaborador neste pasquim digital que vamos mantendo por aqui, já faz quase década e meia. Assim, uma vez por mês, e de há meia dúzia de meses para cá, vai assinando uma rubrica que tem como título "Do Diário de Vida de Raul Iturra. A vida no Lar." E escreve o Professor de forma tão distinta, e tão esclarecida, pela farta experiência nas letras que a vida lhe deu, que nós vos recomendamos vivamente a ler.

 

 *          *          *          *          *

 

Quando interrogados sobre a última das verdades, os videntes védicos resumiam dizendo: “Eu sou o Universo”.

Ora, “ser tudo”, na nossa cultura é uma afirmação que não deixa de soar estranho, e a propósito até se conta a história de uma dama inglesa que ao visitar umas grutas na Índia onde yogis faziam as suas meditações, foi amavelmente recebida por um deles e, no fim da visita, ela disse-lhe:

- Talvez o senhor não costume sair daqui, mas eu gostaria muito de lhe mostrar Londres.

- Minha senhora – respondeu-lhe calmamente o yogui -, eu sou Londres.

 

 *          *          *          *          *

 

Não é fácil o Amor.

Faz já algum tempo, um PÁSSARO AZUL como numa aparição, pousou mesmo à nossa frente. Quando o passámos para poema, o extraordinário pintor, amigo, António Tapadinhas dedicou-lhe uma tela. Chamou-lhe "o pintor e o pássaro azul".

Janita Salomé, canta-autor que tem alguns irmãos ali para o Redondo, Alentejo, também deu nome de tal pássaro ao seu último album, basta ir no "you tube" e ouvir, por exemplo, "Tardes de Casablanca" ou "Não é Fácil o Amor", entre outras.

Pois bem, a belíssima pintura de que falamos é a que se vê. Deu capa a um livro de contos que chamámos "O Espírito dos Pássaros", tal como o dito cujo deu título a um dos contos que dele fazem parte.

O livrinho foi editado pela Bubok, uma editora espanhola de vendas on-line, mas o número de livros em papel impresso foi muito reduzido. Como também o editámos em formato digital, acessível a todos, aqui deixamos o endereço para alguém que tenha curiosidade em visitá-lo. Basta ir no seguinte endereço: http://oespiritodospassaros.blogspot.com

Tem fotografias muito bonitas e podem simplesmente correr o texto que não se vão arrepender. Trata-se de uma ave de BOA SORTE. BOAS VIAGENS.

 


terça-feira, 23 de janeiro de 2024

14 anos de Estudo Geral

 O Estudo Geral faz hoje, 23 de janeiro de 2024, 14 anos, o que denota uma existência persistente e significativa. Pressupostamente, o mesmo dia em que se assinalam os 500 anos de nascimento de Luís Vaz de Camões. Parabéns aos dois. Não querendo deixar de assinalar a data aqui deixamos uma quadra de Agostinho da Silva, do seu livro Quadras Inéditas, p. 72, Ed. Ulmeiro, que reza assim:


Naquela Ilha dos Amores

que sonhou Camões outrora

só entra e fica liberto

quem lá viva desde agora



Travessa do Abarracamento de Peniche, nº7, frontaria do prédio onde o Professor Agostinho da Silva viveu os últimos anos da sua vida.

Fotografia de Luís Santos


sábado, 6 de janeiro de 2024

Crónicas de Dezembro

 Luís Santos

É a Hora. Fomos de visita à LIVRARIA UNI VERSO, em Setúbal, que muito se recomenda, ali a uma dezena de metros da lateral esquerda da Câmara Municipal. Muito mais que bons livros. Amistoso atendimento. Bons presentes de Natal. Entre-tanto, o nosso amigo Bocage ia-se fazendo anunciar. Entrámos em pastelaria a que deu nome e, curiosamente, entre as muitas pessoas que se entrecruzavam, entrando e saindo, mónadas de interligadas almas, a larguíssima maioria eram mulheres. Tal como atrás do balcão, umas quantas empregadas em atarefado serviço, tudo mulheres. Não havia como não pensar, eis as musas do Bocage que se vão multiplicando e saltitando entre poemas. As suas muito cantadas mediadoras divinas, qual carrocel mágico de eternas curvas rodando sem parar. Nelas, todas as ~~~ do mar, todas as *** do céu, tudo o que não tem mais fim.

P.S.: Este textinho, inspirado pelo dia em que faria 87 anos, é dedicado ao meu pai.

Breve testemunho do Encontro de ontem no Moinho de Maré do Cais Velho, a culminar a 1ª edição do PRÉMIO LITERÁRIO DE ALHOS VEDROS, patrono Leonel Eusébio Coelho, onde se comemoraram também os 509 anos da atribuição de Carta de Foral à vila, pelo alcochetano rei D. Manuel I, ainda que a idade da terra, pelo menos com este topónimo, vá até perto do início do país oitocentos anos atrás. Mas, o que mais importa agora reconhecer é que este Prémio Literário, cuja segunda edição para 2025 foi anunciada, já que a sua periodicidade se determinou bienal, vem mais enriquecer as boas dinâmicas culturais e artísticas que caracterizam esta região e, muito em particular, este lugar que nos dá porto de abrigo.


domingo, 10 de setembro de 2023

Textos Soltos

Luís Santos

1.
No genograma que se vê em baixo, representam-se número de ascendentes diretos quando recuamos sete gerações... Ora fazendo um exercício simples, se o meu avô paterno José António dos Santos nasceu em 1887, quando chegamos ao meu quinto avô há-de ter nascido lá para 1700, seguramente, muito perto do século XVII, ainda antes da "Era das Revoluções", quer dizer, da Revokução Industrial, Revolução Americana e Revolução Francesa, o que dá a ideia da relatividade do tempo histórico e da enormidade de parentes e de territórios que temos por detrás de cada um de nós.

No meu caso, como o dito avô nasceu em Alhos Vedros e casou com uma moçoila que veio de Niza, Portalegre, cujo pai, por sua vez, veio de Peral, Castelo Branco, reparem só que em quatro gerações os meus antepassados estendendem-se por uma mancha geográfica que abrange as províncias da Beira Baixa, Alto Alentejo e Estremadura.

Agora, experimentem para vocês e vejam o engraçado da questão.


2.
Tempo de relembrar que Alhos Vedros registou este ano a 50ª edição da sua histórica Feira do Livro, organização da Academia Musical e Recreativa 8 de Janeiro, desde 1972, o que é obra!
Aproveitando o número redondo que faz dela uma das Feiras do Livro mais antigas do país, a Junta de Freguesia teve, em boa hora, a feliz ideia de iniciar a realização do 1º Prémio Literário Leonel Coelho.
Aqui, no palco da Feira, com cenário bem a propósito, feito com materiais antigos que vieram de outras edições, Dores Nascimento relembrando num emotivo e único momento o patrono do Prémio e um dos grandes obreiros da Feira, seu pai.


3.
CHAKRAS, ou chacras, segundo a cultura hindu, iogue, estudos da teosofia, entre outros, são centros de absorção e exteriorização de energias no corpo subtil (duplo etérico).
O conceito de corpo subtil encontra-se tanto em tradições ocidentais quanto orientais, geralmente significando um aspeto corpóreo "quase material" entre corpo e mente, ou um revestimento da alma cujos elementos são mais subtis, finos ou espirituais do que os do corpo físico humano.
(Cf. Wikipédia)




segunda-feira, 17 de abril de 2023

UMA SALADA DAS NOSSAS

 Luís Santos

Salina da Fonte em Alhos Vedros

Aqui nesta região, distrito de setúbal, margem sul do Tejo, a exploração do sal é atividade que se perde em tempos atrás dos tempos, idade da pedra. Os processos de produção foram-se alterando, mas o sal foi (e ainda é) um elemento fundamental na alimentação e na preservação dos alimentos, mas não só. O seu uso mais que terapêutico está bem explícito numa das boas aventuranças cristãs: “sois o sal da terra”.

Por exemplo, nos vedros onde se cristalizaram marinhas, ou nos vestígios de antigas cetárias, relembram-se sinais da ocupação romana do lugar que nos trazem à memória Equabona, ou Aquabona, nome romano de Coina antiga, posteriormente moura, lugar de elogiadas medicinais, ou no lugar que costumamos designar por “Alius Vetus” (nem que o topónimo tenha sido inventado em tempo posterior), entre outros lugares do distrito, a produção de sal e a salga do “garum”, pasta de peixe que se produzia e circulava por todos os cantos do vasto império que circundava o “mare nostrum”, era coisa sagrada.

Sal que por aqui tinha elevada qualidade, branquíssimo, puríssimo, que valia o seu peso em ouro, facilitador de fortunas imensas que não para os marnotos. De resto, sal donde provém a palavra salário... um tipo de moeda corrente a um tempo com que se "pagavam os salários", mas também absolutamente precioso, para preservar peixe e carne, com que se enchia a barriguinha e dava força extra aos infindáveis exércitos e aos divinais bacanais dos democratas cidadãos de Atenas ... até que chegaram os frigoríficos.

Além da importância do sal e das boas águas de prata que brotavam das fontes, em nascentes que por debaixo da terra vão descendo desde a Arrábida e se estendem pelo vale do Tejo, existe uma famosa planta de folhas verdes, alimento de utilizações várias que vão desde os embalsamamentos e mumificações, até ao uso na cura de várias doenças. A salicórnia, de seu nome científico, mas também conhecida popularmente por espargos do mar, ou cristo marino, ou alhos verdes… Diz no portal “Horta dos Peixinhos”, uma das empresas que promove a sua cultura, um alimento extremamente versátil que cresce ao longo das salinas costeiras do mediterrâneo, podendo ser consumida crua ou cozinhada, numa grande diversidade de pratos, planta diurética e medicinal, rica em vitaminas e sais minerais que possui características imuno-estimulantes, antioxidantes, anti-inflamatórias, anti-tumorais e antidiabéticas, contribuindo para a prevenção de problemas de hipertensão artéria. E, certamente, um dos ingredientes da poção mágica dos gauleses, Astérix e Obélix, acrescentamos nós.

Eis o resumo perfeito para um texto que se quer curto: os alhos verdes, mais os seus sais e o sal, e as águas de prata, pretensa salada do rejuvenescimento, elixir da longa vida e da imortalidade, qual pedra filosofal. 

E, agora, que nos ajudem os fitoterapeutas.


quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

Introdução a Seminário IPS/UNESCO


O EcoCampus do Instituto Politécnico de Setúbal e a Rede de Escolas Associadas da UNESCO

Muitos dos fenómenos meteorológicos que se têm feito sentir um pouco por todo o mundo, como é o caso da intensa chuva que tem caído nos últimos dias no nosso país, têm sido frequentemente associados às alterações climáticas que, por sua vez, surgem interligadas às múltiplas causas da excessiva poluição do planeta como é o caso do uso excessivo dos combustíveis fósseis (petróleo e carvão) que têm sido largamente usados no funcionamento das indústrias, dos transportes, dos consumos energéticos das nossas casas.

Esta excessiva poluição que se faz sentir de forma muito significativa nos ares, nas águas dos rios e dos mares, entre outros efeitos muito nefastos, tem provocado o aumento da subida das temperaturas médias do planeta que neste momento se cifra nos 1.2ºC, o que em si é já um valor muito elevado, mas que continuará a subir se, a nível mundial, não forem tomado um conjunto de medidas que tendam a alterar alguns dos comportamentos humanos que estão por detrás destes fenómenos, a fim de que se possam evitar mudanças climáticas irreversíveis, cujas consequências podem aumentar ainda mais os níveis de pobreza, fome, doença e, no limite, pôr mesmo em risco as possibilidades de sobrevivência, pelo menos, de grande parte da espécie humana no planeta.

Neste sentido, aos frequentes alertas que têm sido proferidos pelo Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, a Organização das Nações Unidas, depois de outras, promoveu no mês passado mais uma Conferência Mundial que decorreu no Cairo, capital do Egipto, onde se tentaram encontrar compromissos concretos por parte de todas as nações do mundo que se traduzam numa alteração desses nefastos comportamentos que, por exemplo, levem ao degelo das calotes polares e o consequente aumento das catástrofes naturais que lhes surgem associadas.

Assim, desde 2015 que os 193 países que constituem as Nações Unidas (ONU), chegaram aquela que se designa atualmente como a “Agenda 2030”, constituída pelos 17 objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS), e pela sua aplicação até final da década, que consigam inverter, ou pelo menos, estancar, para o bem comum, as múltiplas causas que têm conduzido à excessiva poluição do planeta e às alterações climáticas.

Entre os 17 ODS, a necessidade de promover uma “Educação de Qualidade” e, neste sentido, também de estabelecer um conjunto de parcerias com instituições afins, tem levado o nosso Instituto (IPS) a desenvolver um conjunto de ações como resposta aos compromissos assumidos por Portugal no âmbito das Nações Unidas. Por outro lado, a Comissão Nacional da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Ciência, Educação e Cultura que tem como objetivo primordial contribuir para a paz e segurança no mundo) tem vindo a participar no incremento de uma série de iniciativas como é o exemplo daquela que se designa como a “rede de escolas associadas da UNESCO”. E é justamente na tentativa de iniciar uma parceria que se quer duradoura entre o Instituto Politécnico de Setúbal e a Comissão Nacional da UNESCO que hoje temos connosco o Professor Carlos Mata, Vice-Presidente do IPS, e a responsável pelo setor da educação da CNU, Dra. Fátima Claudino, que, respetivamente, no âmbito dos princípios do desenvolvimento sustentável, nos irão dizer, porque é que o IPS é um EcoCampus e o que se pretende com essa “rede de escolas associadas da unesco”.

Luís Santos

19.12.2022

quarta-feira, 28 de setembro de 2022

A ILHA

Luís Santos


Neste nobre estremenho lugar

                   Onde vêm as águas do Tejo

                   Trazidas pelo vaivém do mar

                   Existe uma pequena vila

                   Em si, tão só e tranquila 

                   Dando forma aos pensamentos

                   Desde o princípio dos tempos

 

                   Ao largo desta vila há uma ilha

                   Que a voz mansa dessas águas

                   Chama de eterna maravilha,

                   Num momento mais insensato

                   Chamaram-lhe "Ilha do Rato"

                   Mas nós, nos nossos sonhos a cores

                   Chamamos de "Ilha dos Amores"

 

                   Foi ela que em tempos de outrora

                   Sussurrou aos ouvidos do rei

                   Que se tinha chegado a Hora,

                   Sentira curiosidade ao pensar

                   Em quais os caminhos do mar,

                   E o Mestre de Avis, por causa de Dinis

                   Lá foi fazer o que ela quis

 

                   E à nossa ilha em homenagem

                   Camões escreveu um canto

                   Deixou Pessoa uma mensagem,

                   E um dia através dela, por certo,

                   Se há-de revelar o Encoberto

                   Como nos contou com carinho

                   O bom amigo Agostinho

 

                   Esta ilha tem uma vila

                   E esta vila tem um grupo

                   Que vai em direção ao Absoluto,

                   Ela em si lá vai estando

                   Os amigos a vão rendilhando       

                   E quem distraído passa

                   Nem vê que ela está cheia de graça


domingo, 17 de julho de 2022

O Valor da Liberdade

 por Luís Santos

Eu não quero ter poder, mas apenas liberdade, de falar aos do poder do que entenda ser verdade. (Agostinho da Silva)

e estávamos nós a pensar que,

não ter partido político não é o mesmo que dizer que não se exerce ação política, nem que não se saiba do materialismo histórico, ou da ética protestante e do espírito capitalista;
não ter pertença a determinada religião, não significa a inexistência de espiritualidade, ecumenismo, sem que se seja proselitista, nem que não se saiba da importància do sofrimento, ou daquele "nada que é tudo";
poder falar como os ingleses, não quer dizer que se seja inglês, não gostar destes russos ainda que se possa admirar a intercontinental Rússia, ou poder ir à Índia sem abandonar Portugal e a Língua Portuguesa, todas as línguas.
A Paz É o Caminho.




sexta-feira, 21 de maio de 2021

PENSAR COM AGOSTINHO DA SILVA


Conferência no 35º aniversário do Círculo de Animação Cultural de Alhos Vedros, em 9 de maio de 2021. 

(Ver Conferência no Zoom aqui:  https://www.facebook.com/CACAV.AlhosVedros/videos/944267693003703/ )

Luís Santos

O título desta comunicação “Pensar com Agostinho da Silva” deve-se à colaboração que temos vindo a manter em página do “Facebook” com o mesmo nome e que tem administração de Paulo Borges. Aproveitando algumas dessas recentes publicações, partilharemos aqui convosco três ideias particularmente interessantes de Agostinho: a primeira, sobre “uma nova teoria do nascer”; a segunda, um poema para não se morrer; a terceira, uma carta sobre a “missão de Portugal”. 

Assim, em primeiro lugar, digamos, antes de mais, que essa “nova teoria do nascer” foi publicada em livro intitulado “Caderno de Lembranças”, a partir de um manuscrito do Professor Agostinho, datado de 1986, livro que foi organizado por Amon Pinho Davi e Romana Valente Pinho. E já que estamos a comemorar aniversário, refira-se que foi, justamente, nesse mesmo ano que o Círculo de Animação Cultural de Alhos Vedros nasceu. 

Em síntese, nessa tal “teoria do nascer”, Agostinho da Silva, sobre o seu próprio nascimento, diz assim:

 1) "Lá por 1905, (e chama-se à atenção que Agostinho nasceu a 13 de fevereiro de 1906) mas nada há mais difícil do que relacionar tempo e eternidade, ou fixar-se simultâneo nos dois planos (…), comecei a tomar atenção no belo globo que rolava diante de nós, e a tentar descobrir lugar aonde me agradasse descer para principiar minha vida. A meu lado, outros faziam o mesmo, e até discutíamos os méritos de um e outro ponto, mas sem voz, tanto quanto me lembro, porque o nascer tira muito a memória como, depois, o vim a reconhecer, concluiu Platão (…) Quando, voluntária ou involuntariamente, quem o sabe, gostei de, a cada volta do globo, ver surgir de novo nossa península ibérica, deu-se o que se veio a chamar zoom: (…) Fixava-me, de facto, no que aprendi a chamar Portugal." (Agostinho da Silva, Caderno de Lembranças, Zéfiro, pp.15-16)

Eis, então, essa pergunta mágica tão significativa e indissociável da vida de todos, mas que tão pouco entra nas agendas políticas. Esse lugar, ou dimensão, donde se vem para nascer, onde tempo e eternidade se interligam e que, afinal, nos permitem perguntar o que é o presente, o que é o futuro. Entre-tanto, enquanto o globo terrestre diante de si girava, em conversa sem palavras com Platão, entre outros, Agostinho decidiu que o sítio que mais lhe convinha para nascer, aprendeu depois, chamava-se Portugal. E aqui, sem que nós saibamos se será mais correto dizer nascer ou renascer, pois que o nascer tira muito memória. Citando o Professor, “Nascer não é uma fatalidade, mas uma escolha pré-consciente, daquela consciência que se perde quando se voa do céu para a Terra, como dizia Platão.” (Agostinho da Silva, Vida Conversável, Assírio e Alvim, p.14) 2) 

Em segundo lugar, gostaríamos de chamar a vossa atenção para “um poema ressurecto” do Professor, composto por três quadras, sem título, do seu livro “uns poemas de agostinho”. Ora vejamos:

Se eu chegar a ser dum Outro 
mas de mim não me perdendo 
e esse Outro todos os outros 
que comigo estão vivendo 

não só homens mas também 
os animais e as plantas 
e os minerais ou os ares 
e as estrelas tais e tantas 

terei decerto cumprido 
meu destino e com que sorte 
para gozar de uma vida 
já ressurecta da morte

(Agostinho da Silva, uns poemas de agostinho, Ulmeiro, p.107) 

Sintetizando, diz Agostinho que “se chegar a ser dum Outro”, um “Outro” que aparece grafado com letra maiúscula e que integra tudo o que existe –homens, animais, plantas, minerais e estrelas, tais e tantas, conseguirá aceder a uma libertação plena. Então, com alguma legitimidade poderá perguntar-se quem é esse “Outro”, e se Agostinho terá conseguido lá chegar? Se acedermos positivamente às respostas, certamente que ganharemos aí uma extraordinária fonte de inspiração para o caminho. 3)

 Para terminar, partilho convosco uma Carta de um conjunto de doze que Agostinho da Silva enviou para um grupo de amigos com quem estava em contacto, entre eles, a Cooperativa de Animação Cultural de Alhos Vedros, como então se designava, cartas essas que, de resto, foram aqui publicadas com o título de “As Últimas Cartas do Agostinho”. 

 Desse conjunto de Cartas, a primeira foi enviada no mês de dezembro de 1992 e a última em setembro de 1993, o que significa dizer que estas cartas foram escritas, praticamente, ao longo do último ano da vida do Professor, pois que em meados de outubro, mês seguinte ao da última destas cartas, um súbito problema de saúde haveria de o guindar ao seu desaparecimento físico que, como sabemos, ocorreu no dia 3 de abril de 1994, num triste mas revelador Domingo de Páscoa. 

E é, justamente, a primeira dessas cartas que aqui partilho: 

“Resumo da ideologia do Povo Português nos séculos XIII e XIV, transmitida ao Brasil por seus adeptos que ali se foram acolher, passada ao futuro e, por ele, à criativa Eternidade para os que emigrem para o mais íntimo de si próprios e aí se firmem para sempre. 

Missão de Portugal: Sacralizar o Universo, tornando Divina a Vida e Deus real. 

Meios: Desenvolvimento dos Povos pela inteira aplicação da Ciência e da Técnica, inclusive nos sectores da Economia, da Política, da Administração Pública e da Filosofia. Conversão da pessoa à adoração da Vida. 

Características do que houver no Sagrado: Criança como a melhor manifestação da poesia pura e como inspiradora e suporte, e incitadora a ser criança de todos os que existam. O gratuito da vida. A plena liberdade de todo o ser.” 

(Luís Santos (org.), As Últimas Cartas do Agostinho, Cooperativa de Animação Cultural de Alhos Vedros, p.1)

Certamente que, quando Agostinho da Silva se refere aos séculos XIII e XIV está a pensar, desde logo, no reinado de D. Dinis e de Isabel de Aragão, um período áureo da História de Portugal cujas raízes se estendem, de alguma forma, até à atualidade. “Ora vejam só, um rei poeta e uma rainha santa”, dizia o Professor. 

D. Dinis, o plantador das naus a haver, como diz Fernando Pessoa na “Mensagem”. Na história de Portugal diz-se dele que foi o fundador da marinha, da primeira Universidade com o seu “Estudo Geral”, de quem protegeu os Templários e criou a Ordem de Cristo e que, entre outras medidas de significativa importância para a afirmação do jovem país, desenha definitivamente as suas fronteiras e institui a Língua Portuguesa que é hoje a quarta língua mais falada do mundo. Por fim, é também durante o seu reinado que, por ação da Rainha Isabel, se iniciam as festas do culto popular do Espírito Santo e que, embora não tenhamos tempo para desenvolver aqui, são para Agostinho da Silva um dos acontecimentos matriciais a partir do qual se desenvolvem os poemas da “Ilha dos Amores”, de Camões, ou das propostas de “Quinto Império” do Padre António Vieira e de Fernando Pessoa. De resto, tem sido tal a longevidade do referido culto que setecentos anos depois, ainda se comemora na atualidade em muitíssimos lugares da Língua Portuguesa, como acontece nos Açores, no Brasil, nalgumas comunidades de emigrantes dos EUA, mas também em Portugal continental como são, por exemplo, os casos de Setúbal e Alenquer, com Festa marcada este ano já no próximo dia 23 de maio.

 Bem hajam. 

Luís Santos 
Professor Adjunto Departamento de Ciências Sociais e Pedagogia 
Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal

Referências Bibliográficas 

SANTOS, Luís, Agostinho da Silva: Filosofia e Espiritualidade, Educação e Pedagogia, Euedito, 2015

 SILVA, Agostinho da, Caderno de Lembranças, Zéfiro, 2006 (fixação do texto e notas de Amon Pinho Davi e Romana Valente Pinho) 

Idem, Vida Conversável, Assírio e Alvim, 1994 (organização de Henryk Siewierski) 

Idem, uns poemas de agostinho, Ulmeiro, 1990, 2ª edição