terça-feira, 28 de abril de 2020

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Não há dia algum que a guerra no Iraque não traga notícias dos ataques sobre as forças aliadas e as unidades de segurança do novo poder iraquiano.

É evidente que ali lutam aqueles que perderam privilégios com a queda do regime de Saddam Hussein.
Mas o grosso do alarido é conseguido pelos fanáticos militantes da Al-Qaeda que bem compreenderam que ali levam a cabo um dos episódios mais sangrentos e decisivos da guerra que declararam ao mundo livre que, para eles, é superiormente representado pelos Estados Unidos da América.


Temo que estejamos a perder estas batalhas e com elas e pôr em jogo o equilíbrio mundial tal como o conhecemos.


Nem mesmo perante os raptos de civis pacíficos e inocentes usados como arma de chantagem sobre os poderes políticos do Ocidente, se consegue fazer acordar as opiniões públicas para os perigos apocalípticos que espreitam o nosso modo de vida.


Chegámos ao ponto em que ficamos desarmados perante o cinismo mais ignóbil de discursos radicais que deixámos afirmarem-se como representativos de populações muçulmanas sobre as quais os seus protagonistas interpretam verdadeiras tiranias dentro das nossas próprias leis e sistemas jurídicos. (1)


Virá um dia em que nos arrependeremos da falta de estatura política e moral daqueles que escolhemos para nossos líderes.



América, américa
tenho em a janela sempre aberta
de um porto seguro para as minhas filhas.



Uau!
Chegou o leitor de cd(s) que eu adquiri com o cartão do cliente da gasolina da BP.


Melhoria significativa da minha autonomia musical.



A Matilde tem aproveitado as férias da melhor maneira, com dias inteiros de brincadeira.

Hoje passou a tarde com a amiga Beatriz que neste momento dorme em nossa casa.

E agora que já sabe ler, é engraçado como ela passou a brincar com base nesse pressuposto.



A Margarida telefonou à mãe.
Está satisfeita mas cheia de saudades.


O resto da família também.


 Alhos Vedros
  09/09/2004


NOTA 

(1) Brezé, Thami, SE A INJUSTIÇA CONTINUAR, NÃO SEI ATÉ QUANDO PODEREMOS CONTROLAR AS PESSOAS, pp. 3 e ss 


CITAÇÃO BIBLIOGRÁFICA 

Brezé, Thami, SE A INJUSTIÇA CONTINUAR, NÃO SEI ATÉ QUANDO PODEREMOS CONTROLAR AS PESSOAS, Texto da Entrevista elaborado por Paulo Moura, Pública nº. 48, de 05/09/2004, In “Público”, nº. 5279, de 05/09/2004

segunda-feira, 27 de abril de 2020


A Liberdade Guiando o Povo, Eugène Delacroix, 1830
Óleo sobre tela, 260  × 325 cm 


Ferdinand Victor Eugène Delacroix, nasceu em Saint-Maurice, 26 de Abril de 1798 e faleceu em Paris a 13 de Agosto de 1863.

Delacroix é considerado o mais importante representante do romantismo francês. Na sua obra convergem a voluptuosidade de Rubens, o refinamento de Veronese, a expressividade cromática de William Turner e o sentimento patético de seu grande amigo Géricault.

O pintor, que como poucos soube sublimar os sentimentos por meio da cor, escreveu: "…nem sempre a pintura precisa de um tema". E isso seria de vital importância para a pintura das primeiras vanguardas.

in Wikipedia

Selecção de António Tapadinhas

domingo, 26 de abril de 2020

Manuel (D'Angola) de Sousa


“Cumpro Cabalmente Regras Certas E Dúbias Em Auto-Cópia 3D E/Ou À Mão” 

Cumpro com as regras desregradas e anómalas
Copio-me a mim mesmo pacientemente à mão
Pincelo e cinzelo as minhas curvas e dúbia silhueta

Agarro a pena com a mão esquerda e a tinta com a direita
Vôo com asas emprestadas duma borboleta acima da realidade
Encolho a ambição e poiso algures na pradaria

Misturo o vinho com água numa água-pé perfeita
A ferro e fogo extraio um alfinete entalado na garganta
Engulo em seco e a espinha atravessada no pescoço

Rebusco debaixo da pele indícios de tatuagens de há milénios
Sacudo as moscas e os moscardos dos ombros encolhidos
Abro o peito com uma chave-de-grifos francesa

Amarro-me sozinho ao poste dos sacríficos absurdos
Avanço para a berma dum vulcão activo sem intenções
Subo nas calmas os degraus de pedra da ingreme pirâmide

Ascendo ao cume pontiagudo para cúmulo do bom senso
Inalo os gases matinais da mais critica ascensão crística
Cristalizo-me misticamente em uma mistura de açúcares ancestrais…

Transformo-me em três ou mais ocasiões na cabalística árvore da vida…

Escrito em Luanda, Angola, por Manuel (D’Angola) de Sousa, a 25 de Abril de 2020, em Homenagem aos Autores Activos do 25 de Abril, dia da Revolução dos Cravos em Portugal, dia da queda do famigerado regime ditactorial fascista e colonialista de Salazar e da instauração da Democracia Portuguesa e que, culminou nas justas e reconhecidas Independências das ex-Colónias Portuguesas e de seus Povos respectivos, em todo o Mundo…

“Viva o 25 de Abril de 1974, dia da libertação do pensamento e da liberdade de falar e opinar, em Portugal…”

quarta-feira, 22 de abril de 2020

Silêncio



Fotografia de Lucas Rosa


terça-feira, 21 de abril de 2020

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Portugal lá continua na mesma, como a lesma, mal em quase tudo, até no futuro. 


Do PS surgem debates no âmbito da corrida eleitoral para o cargo de secretário-geral. 

Apesar da prosápia ou atendendo a ela, Sócrates representa a continuidade do que de mais esconso teve o consulado de Guterres e não me parece que João Soares tenha força e vontade para cortar com aquela lógica de aparelho que rapidamente o manietaria em caso de vitória. 
Manuel Alegre é um avozinho simpático e ainda cheio de vigor físico. É verdade que ninguém lhe pode negar a coragem e a verticalidade de um caminho de quem, em hora incerta e aziaga, lutou pela liberdade. Mas por isso mesmo ele é um símbolo, uma referência, em termos práticos, uma referência moral e ética. Tenho muitas dúvidas que seja o homem com o sentido prático e a energia suficientes para levar a cabo as reformas que há para fazer no sistema político e até no interior do próprio partido e, a partir daí, tudo o que há para reformar na sociedade portuguesa em termos da educação, da saúde e da justiça. E também não me parece que, apesar dessa condição pessoal, ele consiga rodear-se de pessoas capazes de o secundar em tais desideratos. 

A verdade é que desde o distante PREC e o desenho vitorioso do vinte e cinco de Novembro, o Partido Socialista ficou refém de lógicas de interesses estranhos à ideia democrática e à democracia, enquanto organização social, com o que perdeu toda a margem de manobra para que ali se tivesse feito frente à vaga de promiscuidade entre poderes autárquicos e interesses particulares e, já com o guterrismo e os guterrões, tenha acabado por beijar o anel de verdadeiras lógicas mafiosas. 


E a nossa tragédia é que o PSD não consegue uma história muito diferente e também nele mergulham os tentáculos do polvo que se alapou no erário público e atrofia o nosso tecido social, impedindo-lhe o desenvolvimento. 


E agora toda a gente grita contra o processo de colocação de professores que se arrisca a deixar que se repita mais um começo de ano lectivo sem que os docentes estejam a tempo nas escolas com a agravante de, em face da extinção das diversas fases em que decorreram as colocações nos anos anteriores, desta vez, estarem no activo, nos estabelecimentos de ensino, apenas os professores que pertencem aos respectivos quadros que, infelizmente, estão muito longe de serem a larga maioria. 
Quer dizer, estamos em riscos de termos mais de metade daqueles profissionais a disporem de uma mão cheia de dias para prepararem as suas vidas e planearem as matérias e actividades curriculares. 


Alguém disse que estávamos no Burkina Faso? 


E os media batendo na interrupção voluntária da gravidez e no barco holandês que a oposição visitou e a marinha vigiou. 


Estamos na eminência de originarmos o paraíso criminal. 



Noite agradável de varanda e cigarro de pernas esticadas. 



Salzburgo tem um inesperado jardim zoológico em que muitos dos animais andam à vontade, sem quaisquer barreiras relativamente aos visitantes. 



“-Já lavaste os dentes, pardalito?” 
“-É evidente. A mãe está a dar-me o fluor, não está?” 


E eu sigo todo feliz, directamente para a estante onde os livros de histórias já se alongam por mais de três metros. 


Que rico quarto lhes construímos. 


Alhos Vedros 
  08/09/2004

segunda-feira, 20 de abril de 2020

REAL... IRREAL... SURREAL... (392)


Carnaval de Arlequim. Joan Miró. 1924-25
Óleo sobre tela, 66 x 90 cm

Nasceu a 20 de abril de 1893 em Barcelona.
Faleceu a 25 de dezembro de 1983 em Palma de Maiorca.

Quando jovem frequentou a Reial Academia Catalana de Belles Arts de Sant Jordi da Barcelona e a Academia de Gali. Em 1919, depois de completar os seus estudos, esteve em Paris, onde conheceu Pablo Picasso e entrou em contato com as tendências modernistas como o fauvismo e o dadaísmo.
No início da década de 1920, conheceu o fundador do movimento surrealista André Breton entre outros artistas. A pintura O Carnaval de Arlequim, 1924-25, e Maternidade, 1924, inauguraram uma linguagem cujos símbolos remetem a uma fantasia, sem as profundezas das questões psicanalistas surrealistas. Participou na primeira exposição surrealista em 1925.
Em 1928, viajou para Holanda, tendo pintado as duas obras Interiores holandeses I e Interiores holandeses II. Em 1937, trabalhou em pinturas-mural e, anos depois, em 1941, concebeu a sua mais conhecida e radiante obra: Números e constelações em amor com uma mulher. Mais tarde, em 1944, iniciou-se em cerâmica e escultura. Em suas obras, principalmente nas esculturas, utiliza materiais surpreendentes, como a sucata.
Vários anos depois, rumou pela primeira vez aos Estados Unidos e nos anos seguintes; durante um período muito produtivo, trabalhou entre Paris e Barcelona.
No fim da sua vida reduziu os elementos de sua linguagem artística a pontos, linhas, alguns símbolos e reduziu a cor, passando a usar basicamente o branco e o preto.
Algumas obras revelam grande espontaneidade, enquanto em outras se percebe a técnica feita com muito cuidado, e esse contraste também aparece em suas esculturas. Miró tornou-se mundialmente famoso e expôs seus trabalhos, inclusive ilustrações feitas para livros, em vários países.
Em 1954, ganhou o prêmio de gravura da Bienal de Veneza e, quatro anos mais tarde, o mural que realizou para o edifício da UNESCO em Paris[1] ganhou o Prêmio Internacional da Fundação Guggenheim. Em 1963, o Museu Nacional de Arte Moderna de Paris realizou uma exposição de toda a sua obra.
Em 1978 recebeu a Medalha de Ouro da Generalidade da Catalunha e o Prêmio Antonio Feltrinelli.

in Wikipedia

Selecção de António Tapadinhas

sábado, 18 de abril de 2020

FESTIVAL AMAZONIAS


 Para seguir o endereço do Programa clique na imagem
Para ver Programa clique em cima do cartaz

FESTIVAL AMAZONIAS, 17,18 e 19 de abril (dia do índio)

Acontece entre os dias 17 e 19 de abril e será transmitido pelo Twitter do Greenpeace Brasil, ou pelo Instagram do Festival. A proposta é trazer reflexões sobre possibilidades de resistência e de vida nestes tempos de pandemia. Concebido como uma forma de ligar a floresta e as cidades, o evento, que seria realizado presencialmente em São Paulo, se adaptou para entrar nas redes. Haverá conversas, performances, música e filmes, com transmissão ao vivo pelas redes sociais.

Na sexta-feira, às 22 horas, a cantora indígena Djuena Tikuna abre o festival. Em parceria com a Greve Mundial pelo Clima. Gilberto Gil, Céu, Tropkillaz, Chico César e Felipe Cordeiro são alguns dos convidados. Mesmo separados fisicamente, devido às medidas de segurança em relação à Covid-19, eles se unirão em defesa dos direitos indígenas e da proteção dos territórios tradicionais.

O Festival Demarcação Já Remix é um novo desdobramento da campanha iniciada em 2017 pela demarcação das terras indígenas que mobilizou 25 artistas da MPB, como Elza Soares, Ney Matogrosso, Zeca Pagodinho, Maria Bethânia, José Celso Martinez Corrêa e Criolo, dentre outros. A canção-manifesto, composta por Carlos Rennó e Chico César, rodou o mundo e foi uma importante ferramenta na defesa dos territórios tradicionais e de seus povos. Assista o videoclipe:

Deixamos também a música "Viagem pelo Amazonas", no cd "Índio" de Fernando Girão, que faz história:

Índio, Fernando Girão

Ver as crianças brincando
nas margens do rio
pintando de luz e alegria
as águas do rio
consegue me enganar
e até me faz pensar
que o mundo vive em paz

dar aos meus olhos prazer
ao ver tanta beleza
sentindo o índio em harmonia
com a natureza

me diz o coração
que é nessa direção
que eu devo caminhar
me diz o coração
que o rio é uma lição
que a gente tem de estudar

e navegar, e aprender
tudo o que nasce tem direito a viver
e todo o homem
leva um rio dentro sem saber

quarta-feira, 15 de abril de 2020

Graffitar a Literatura (XXVIII)


"Sinais da decadência - PVG"



«A nossa natureza reside no movimento; a calma absoluta é a morte.»
Blaise Pascal (1623-1662), Pensées, obra póstuma 
  
Estes são uns inusitados tempos em que a terrível pandemia é ampliada pela «virulência do jornalismo dos últimos dias (…) na informação poluente que as televisões nos fornecem» (António Guerreiro, Ípsilon 10/04/20, p.30). Parece estarmos a viver num contexto de «fim do mundo», déjà lu na ficção científica, só que, agora, transformaram-nos em actores de uma dessas narrativas distópicas.
Não é por acaso que, desta vez, vos trago dois murais do Bairro do Fim do Mundo, em São João do Estoril (Cascais), um escritor falecido em Abril (dia 30, de há quatro anos) – Paulo Varela Gomes (1952-2016) –, e o seu livro póstumo – A Guerra de Samuel e outros contos – editado, também num mês Abril.
1. O Bairro do Fim do Mundo é uma urbanização que tem a sua génese nos anos 70 do século passado. Ali se construíram 141 barracas que chegaram alojar 278 famílias. No início do PER, em 1993, o bairro albergava 619 pessoas (principalmente ciganos e africanos dos PALOP). As últimas 20 barracas viriam a ser demolidas em 09/06/09. Hoje, é um agradável e animado bairro social recheado de graffitis e murais! Escolhi dois para ilustrar este texto: o primeiro é uma marca identitária do bairro a que se pertence com orgulho. O segundo, o planeta Terra com a morte nas suas entranhas, é uma metáfora do tempo presente, e ilustrativa dessa decadência que o autor, que este mês aqui vos trago, defende no seu derradeiro livro.
2. Paulo Varela Gomes (PVG) foi professor de História no ensino secundário e professor associado na FCT da Universidade de Coimbra. Doutorou-se em Arquitectura e os seus trabalhos, como académico e crítico, centraram-se na história da arquitectura e da arte. Foi delegado da Fundação Oriente em Goa (1996-98 e 2007-09). Quando se aposentou, em 2012, dedicou-se, por inteiro, à literatura, tendo nesses quatro anos de vida, escrito seis livros (apesar de já minado por um cancro): livro de crónicas (escreveu regularmente no PúblicoJLExpressoBlitzOuro e Cinza (2014), e os romances O Verão de 2012Hotel (2014), Era Uma Vez Em Goa (2015), Passos Perdidos (2016), todos editados pela Tinta-da-china. Recebeu o Prémio PEN Narrativa e o Grande Prémio do Romance e Novela da APE 2015.
Mas a sua vida literária não começou nessa finitude da vida, como me deu conta num e-mail enviado, em resposta a um convite que lhe endereçara para participar no ciclo de Encontros sobre “Literatura & Educação ” que co-organizei com o autor deste blogue (LCS):
«Quanto ao romance Encontro à beira do Arno (Hiena Ed., 1999) está esgotadíssimo e assim espero que permaneça. Já não me reconheço nesses e em outros livritos que escrevi há trinta anos, excepto uma coisa chamada Peep Show (Black Sun Editores, 1987). Não é mau, experimental qb e “literatura maldita” mais que qbE assinada Heliogábalo, saiu nos Quatro Elementos Editores» [grupo editorial a que pertenceu juntamente com escritor Mário de Carvalho].
Foi também autor de documentários televisivos, designadamente “O Mundo de Cá” (1995), sobre a presença portuguesa no Oriente (cf. entrevista aos autores desta série
– PVG e Camilo Azevedo, Público Magazine, 15/10/95, pp. 19-24).
Para o conhecimento mais aprofundado de PVG, sugiro igualmente a leitura da entrevista concedida a António Guerreiro (“Retrato do escritor enquanto reaccionário e comunista utópico”, Ípsilon, 01/03/13, pp. 22-4).
O lisboeta, urbano e cosmopolita, Paulo Varela Gomes recolheu-se ao mundo rural onde veio a falecer na sua casa de Podentes, em Penela, a 30 km de Coimbra.
3. A Guerra de Samuel e outros contos (2017) «tem, tanto no tema como no tom, o aspecto de um texto testamentário: é uma visão decadentista do mundo e da civilização, e uma concepção da história que exige uma posição política face a ela» (“Histórias deste mundo e do outro”, António Guerreiro, Ípsilon, 09/06/17, pp. 28-9).
«Capítulo 4 - Nota sobre o tema “sinais da decadência”:
A decadência manifesta-se nas comunidades a que pertencemos por sete sinais que são as sete velas apagadas que nos vêm do futuro e os sete anjos com trombetas que não conseguimos ouvir. São estes sinais: o desfazimento da unidade, a in-diferença entre comunidades, a indistinção entre o bem e o mal, a ignorância da História, o desamor à terra, o abandono da criatividade.» (p. 33)
O autor desenvolve, depois, cada um destes sete sinais. Destaco aqui apenas um:
«O terceiro sinal da decadência – e o mais grave, porque é intercomunitário – é a indistinção entre o bem e o mal.
Muitos se têm espantado com o extraordinário retrocesso civilizacional ocorridos nas últimas décadas, no Ocidente, em relação às promessas do iluminismo e, mais tarde, do socialismo: o cinismo da acção política, a impunidade dos grandes grupos económicos, o terrorismo do estado, a indiferença de massas cada vez maiores de cidadãos perante toda e qualquer causa que não possa ter solução a curto prazo, a violência como modo de resolver conflitos e de exprimir o desequilíbrio e a raiva individuais ou de pequenos grupos. Na vitória da amoralidade que hoje campeia, teve peso determinante a actividade da mais poderosa máquina de produção e reprodução ideológica que a humanidade conheceu: a indústria visual norte-americana.» (pp. 35-6)
«Os julgamentos de Nuremberga, um dos acontecimentos mais importantes da história ideológica da humanidade, e um momento em que a decadência do Ocidente foi detida, vieram apor ao primórdio da lei o selo da legitimidade, declarando que massacrar é sempre um crime e quem o comete deve ser sempre condenado.» (p. 38)
«Olhando para o que sucede hoje em dia no coração das sociedades ocidentais, verificamos que, nos últimos trinta ou quarenta anos, a ideologia triunfante fez caducar tanto a Declaração Universal dos Direitos Humanos como as decisões de Nuremberga e promoveu a indiferença perante a desonestidade política, legitimou o assassinato e a tortura, fez passar por normal uma desigualdade socioeconómica como a história nunca conheceu.» (p. 39)

A personagem Samuel «tem traços de profeta bíblico» e o seu «pequeno ensaio» sobre a decadência «é como que uma aula somada a um sermão, constitui uma perturbadora experiência ao mesmo tempo filosófica e paranormal» (p. 32).
Talvez por tudo isto, o crítico literário António Guerreiro, na sua coluna de opinião no Ípsilon, 21/11/14, p. 33, tenha colocado o seu amigo Paulo Varela Gomes na categoria de «reaccionário letrado».

Luís Souta (texto e fotos)

terça-feira, 14 de abril de 2020

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

E pronto, este que foi um diário anunciado está a chegar ao fim. Ainda não sabemos quando será o início do novo ano lectivo mas, seguramente, tal sucederá na próxima ou na semana seguinte, pelo que estas páginas estarão em vésperas de encerramento e com elas me despedirei desta minha experiência por este género. Como não conto vir a ter um terceiro filho, condição em que só por razões de força maior não repetiria a gracinha, dificilmente encontrarei motivo para voltar a escrever qualquer trabalho neste domínio. Será pois este um volume de adeus, com o qual porei um ponto final neste capítulo da minha obra literária. 
Com os quatro livros e oito volumes que produzi tendo como objecto estruturante as vidas das minhas filhas, considero que elaborei um conjunto coerente e harmonioso que, para além da originalidade que, por si, justifica literariamente a sua existência, tem ainda o interesse adicional de registar os tempos que passam num quarteto de ocasiões que se intercalam por um período total de dez anos e meio. 
Assim, creio sem qualquer constrangimento que posso tomar esta tetralogia como uma peça suficiente para representar um projecto completo no âmbito da diarística. Em conformidade, em tal quadrante, a mais não me sinto obrigado. 
Igualmente concluo as “Histórias da Terra Encantada” que se repetiram pelas seis parcelas dos livros relativos ao princípio da escolaridade e que mais não são que uma pequena colectânea que marca a minha passagem pela divulgação científica para os mais novinhos, à qual, naturalmente, não voltarei. Sem embargo, no contexto destes diários e como sua parte integrante e estruturante, são aquelas o complemento pela minha deambulação pela chamada literatura infantil, cuja primeira vertente agrupou os contos a que chamei da Lua encantada, âmbito sobre o qual já não posso dizer que não volte. 
Por ora fica a certeza de ter ultrapassado mais uma etapa da minha vida de escritor que não deixará saudades nem me merecerá qualquer destaque especial, mas que sempre permanecerá como uma grata recordação. 
Resta o desejo que as leituras tenham sido agradáveis e em elas, aqueles que tenham a bondade de me ler, possam encontrar algo que lhes prazenteie os momentos em que tenham partilhado a companhia. 
Um grande saravá para todos vós.

segunda-feira, 13 de abril de 2020

REAL... IRREAL... SURREAL.... (391)

A Entrada de Cristo em Bruxelas, James Ensor, 1888
Óleo sobre Tela, 252,7 x 430,5 cm

James Ensor nasceu em 13 de Abril de 1860, em Ostende, Bélgica e faleceu a 19 de Novembro de 1949.
James Ensor foi um pintor expressionista belga do final do século XIX e início do XX.
Pelo seu estilo inovador e polémico, influenciou vários pintores expressionistas e surrealistas do seu período e dos posteriores.
Interessado em artes desde a adolescência, Ensor estudou na Academia Real de Belas Artes de Bruxelas dos 17 aos 20 anos de idade.
Fez sua primeira exposição aos 21 anos de idade.
Entre 1880 e 1917, teve seu atelier artístico no sótão da casa de seus pais, em Bruxelas.
Fez viagens para França, Holanda e Inglaterra, entre os anos de 1880 e 1892.
Entre 1883 e 1893, fez parte do grupo, de pintores e escultores belgas, conhecido como “Os Vinte”.
Em 1888, fez e apresentou sua pintura mais polémica: A entrada de Cristo em Bruxelas.

in guiadasartes

Selecção de António Tapadinhas

sábado, 11 de abril de 2020

Dar Voz ao Silêncio


VII. Da Ressurreição - Cântico dos Cânticos

Descansam os ventos, suspendem as chuvas
e sossegam ás águas dos mares, deslizam
os anjos vão acima, vão abaixo
e ladeiam um canal de luz, mais que luz
iridescente,
harpas e tamborins, uma flauta de pan
aproveita-se toda a claridade do luar
e, por detrás, um cântico dos cânticos

Um mel etéreo que escorre do céu,
devagar,
uma vibração que nem voz, um ânimo
um aconchego, um calor no peito
e por esse canal que nem luz
lá vai Jesus, quarenta e sete dias
depois do Carnaval,
primeiro domingo depois
da lua cheia equinocial, um dia
especial o primeiro de abril

Lembramos um Professor que também
partiu num domingo de Páscoa,
não se percebeu se foi ele que escolheu
ou se decidiram por si,
sabemos que segundo diz
nasceu onde quis
e fez do seu berço Portugal,
a Língua Portuguesa e a Ibéria,
tudo junto, e adiante
um pensamento ecuménico

Na cruz floresce uma rosa
de dentro do meio da dor,
o amor
uma flor na primavera,
ou muitas cores, muitas flores
porque se é feio também
há-de ser bonito, e se tem mal
bem também tem, o meu bem
ou nem isso, tudo é Um só
tudo junto, é a suprema beleza
da natureza, tão rija e forte
mas é doce e é bela, é Ela
uma mulher, Maria
Trindade, tudo no mundo

Pelo tal canal sobe uma luz
uma energia subtil, cor de rosa
e azul, um brilho azulado, uma taça
e uma chama. És tu!
É uma roda viva de vidas infinitas
raras e preciosas, o tal vitral
um cristal, uma ponte, uma passagem
uma miragem no deserto
uma fonte de água cristalina
um riacho, uma lagoa
uma flor de lótus

É o fim da dor
Deus dos ateus até
e tu vais, ou não vais, vais
ter de escolher, ou de reconhecer
o que é igual, a paz do lugar enfim,
e a música é o cântico dos cânticos
o bater das asas dos anjos
uma pomba branca refeita
e a pauta são os fios de luz
onde pousam as andorinhas

O céu é azul, os campos são verdes
e castanhos correm os rios
a caminho da foz.
Tudo é aqui e agora.
É esta a hora.

sexta-feira, 10 de abril de 2020

VI. Da Crucifixação da Primavera (3)


3º andamento – canto à capela

Erguem-se as vozes no altíssimo tom
línguas de fogo entre o céu e a terra
preces que evitem a vil desmesura
do sacrifício nos pedidos de perdão
que trazem a natureza em agonia

adensam-se medonhas tempestades
encolhem-se ainda mais os corpos
rubros os olhos de sangue as lágrimas
os gritos e gemidos aflitos e infinitos
os coros de vestes pretas das velhas

mas o temporal vai ter de passar
levantem-se todas as ondas do mar
e o velho monstro hediondas trevas
do fundo dos abismos trespassado
no catavento de uma vela triangular

quinta-feira, 9 de abril de 2020

VI. Da Crucifixação da Primavera (cont.)


2º andamento - uma valsa redonda

Contam-se por poucos dedos da mão
os ténues momentos em que os pés
se aqueceram quando o céu se abriu
em tempo a valer que Deu para ver
paraíso de budas, quinta dos Lóridos

logo a seguir outra vez o breu que deu
das lembranças de um céu que pesa
sobre as cabeças do ignorado amor
da dor, do sofrimento que se paga
do regresso da dívida da má ação

da roda da vida infinita que não pára
do paraíso dos maus sinais habituais
na rede social da impura banalidade
e da perca da sacralidade dos tempos
de uma áurea idade que tão tarda

quarta-feira, 8 de abril de 2020

Dar Voz ao Silêncio

VI. Da crucifixação da Primavera

1º andamento – uma marcha silenciosa e triste

Toda a natureza se trás contrariada
contraída e dobrada sob si própria
cinzentas as horas dos quarenta dias
porta de entrada de semana santa
que insiste e persiste no mau tempo

o frio que se estende nas flores
do vento que não cessa nas dores
das costas que rangem a humidade
das chuvas inesperadas pelas horas
de secas infinitas do mau augúrio

ainda se ouvem o arrastar das cruzes
da crucificação dos justos abandonados
à sua sorte deixadas as gentes, inocentes
os abraços da fé na universal proclamação
da divina igualdade sob o brilho do sol


Luís Santos

terça-feira, 7 de abril de 2020

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

OREMOS POR BESLAN!


Viagem pela região dos lagos, o Tirol austríaco, verde e encavalitado em cumes mais ou menos jovens que no Inverno embranquecem, salpicado com espelhos de água pintados de nuvens, fazendo-nos pensar constantemente em vistas de postal. 


Dificilmente conseguiremos ver no mundo uma região mais arrumada e limpa. No chão das ruas e das bermas das estradas, só mesmo as folhas das árvores. O ordenamento do território é à prova de qualquer reparo e as aldeias fazem-se com essas casas alpinas que as cores e os frescos das fachadas fazem transbordar de encanto. 


Aqui, uma bomba atómica seria um autarca português. 


E o cuidado que as famílias colocam na decoração que os vasos floridos fazem nas suas janelas, só pode indiciar uma mentalidade que o povo teima em preservar; quem não saiba cuidar da sua casa… 


Se nós não poderíamos viver num país assim. 



E em Beslan aconteceu a tragédia. 

Não sei muito bem como tudo terá começado, mas o assalto à escola aconteceu e os terroristas cumpriram a palavra ainda que uns quantos tenham conseguido fugir e, neste momento, estejam a monte. 
Fala-se em mais de três centenas de mortes, um terço das quais crianças. 


O indizível aconteceu. 


E Putin vem dizer que as forças da ordem, na Rússia, estão a ser muito brandas com o terrorismo. 

Brevemente reforçará os seus poderes sobre a imensa federação. 
O homem tem perfil e expressão de Czar e vê-se como o eleito para refazer a grandeza que a União Soviética teve na segunda metade do século passado. 



Ai mundo tão lindo, tão fantástica aventura, sobre a qual pairam as trevas do indizível. 



Salvam-se as leituras de Llosa, desta vez com a magnífica narrativa das alterações que uma casa de prazer provocou na vida de uma comunidade. 

Uma bela alegoria sobre o progresso na Humanidade. 


 Salzburgo 
05/09/2004 


CITAÇÃO BIBLIOGRÁFICA 


Vargas Llosa, Mário, A CASA VERDE, tradução de Alice Nicolau, Publicações Dom Quixote (2ª. Edição), Lisboa, 2002

segunda-feira, 6 de abril de 2020

REAL... IRREAL... SURREAL... (390)


Retrato de Amedeo Modigliani, Jeanne Hébuterne, 1919
Óleo sobre Tela 52,4 x 80,0 cm 

Nascimento: 6 de Abril de 1898, Meaux, França
Falecimento: 26 de Janeiro de 1920, Paris, França

Foi na “Académie Colarossi” que Jeanne Hébuterne conheceu Amedeo Modigliani.
Pouco se sabia da sua biografia. São apenas conhecidas algumas das obras que a família autorizou a expor pela primeira vez em Veneza, em Outubro de 2000, na Fondazione Giorgio Cini.
Jeanne Hébuterne foi modelo dos artistas que chegavam a Paris e animavam a cidade na segunda década do século XX. Entrou no mundo cosmopolita de Montparnasse com a ajuda do seu irmão quatro anos mais velho, André Hébuterne.
Foi aí que conheceu e cedeu ao fascínio de Amedeo Modigliani, como modelo e musa do pintor com quem casou.
Amedeo Modigliani morreu no dia 24 de Janeiro de 1920.
Grávida de nove meses do segundo filho de ambos, Jeanne Hébuterne, suicidou-se na manhã do dia seguinte, lançando-se de uma das janelas do 5º piso do apartamento de seus pais.
Tinha apenas 21 anos de idade.

Selecção de António Tapadinhas

sábado, 4 de abril de 2020

Ontem,


3 de abril, fez anos que o Professor Agostinho da Silva nos deixou. Corria o domingo de Páscoa de 1994. Confesso que não tenho pressa, nem para mim, nem para todos, mas haverá lá melhor dia para partir... como ontem não nos foi possível, cá fica a lembrança hoje a partir do seu livro "Quadras inéditas", em jeito de conselho para os dias que correm:

Aperfeiçoa-te ao máximo
em tempo que nada valha
pondo toda a tua pressa
no que tempo é migalha

Deixa desfilar o mundo
quieto fica distante
não estar interessado
é que é o interessante

Nesta confusão navego
neste tumulto me entendo
não me importa o que sou eu
mas o que os outros vão sendo

Um dos pólos de viver
é para mim aventura
mas outro tão bem querido
o de claustro e de clausura

Tem paciência de frade
quando nada suceder
e paciência nenhuma
quando surja o que fazer

E não me chamem de mestre
sou apenas aprendiz
daquilo que me é o mundo
e do que sendo me diz

Naquela Ilha dos Amores
que Camões sonhou outrora
só entra e fica liberto
quem lá viva desde agora

Dará Portugal ao mundo
em céu de amor e de espanto
seu Império do Divino
Divino Espírito Santo

Posso dizer-lhes de Deus
quanto queiram mas calado
aprovarão se há silêncio
mas se me escutam cuidado

Se Ele é tudo o que tu dizes
Ele o Nada pode ser
e se é nada livre está
para ser o que quiser

Fotografia de Eduardo Martins. Ao que cremos, Agostinho da Silva discursando na Assembleia da República, em dia de homenagem.

quarta-feira, 1 de abril de 2020

Hoje



Luís Santos

Fotografia

Hoje,
Arco-íris em dias de corona vírus