sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

CARAVELA


A cada deleite na Esperança
surge um Deus amado,
fruto da imagem
que se quer perfeita

Não são os homens
que tornam vivos
um caminho que se quer imenso,
mas sim a tónica
duma vida imensa
em mares que tornam Realidade
os sonhos de uma criança

Óh Pai, óh Mãe
Ouçam o meu gritar
afoguem os meus lamentos
para que esta vida
não se torne um sofrimento

Quisera ser Paz,
quisera ser Amor
mergulhar em quimeras
que me tornem presente

Façam brandir espadas,
Em meu peito escudos surjam
Que das lutas que em mim trago
Surjam frutos, não sofrimentos

Quero deixar-te agora,
partir para longes paragens,
caminhar no interior
de uma muralha que se abre

Quem sois, que procurais,
vindos de uma vida amorfa
isolada em campos
que se tornam virgens
de almas de céus almejados

Óh harpas, óh sons
que se tornam distantes
ouçam os meus quereres
desçam e tornem-se presentes,
não permitam que minha vida
seja um cenário de ausentes

Que procurais, que afirmais,
que as pétalas surjam
no peito daqueles que se tornam
vorazes no agradecimento

Não procures saber quem sou,
de onde venho e para onde vou,
deixo-te apenas a minha pena

Que estas palavras sejam um marco
de um caminho que se pensa agreste
Em cada pedra pisada
há um grito audível
dos que ousaram partir
semeando novos mundos
que os teus olhos enxergarão
em cantatas de Amor e Paixão

(24/2/14)

antonio

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

D'ARTE - CONVERSAS NA GALERIA
 
3ª Série - 09
 
FOTOGRAFIA
 
José Augusto do Nascimento
 
 
Na esmagadora paisagem lapónica
a rena anuncia-se soberana
enfrentando ao longe o olhar do fotógrafo.
                       
                                                                                         (texto de Dores Nascimento)
 
 
JOSÉ AUGUSTO DO NASCIMENTO
Nasceu em Alhos Vedros, em 1954.
Em 1982 adquiriu a sua 1ª câmara fotográfica (Zenit).
Seguiu-se a aquisição de literatura, com a qual se familiarizou com os fundamentos da fotografia.
O gosto pela fotografia acompanha-o desde então, sempre aplicado de modo puramente amador.
Foi, no entanto, com a adesão à fotografia digital, em 2005, que se verificou um forte incremento da sua atividade fotográfica.
Ao longo destes anos tem participado em alguns concursos, a nível local, designadamente:
            - Na 2ª bienal de fotografia da Moita, com um portfólio de quatro trabalhos admitidos a exposição;
            - Nos jogos florais comemorativos do 475º aniversário do Foral de Alhos Vedros, organizados pela CACAV, onde obteve uma “Menção Honrosa” na modalidade de fotografia;
            - Em concurso organizado pela Junta de Freguesia da Baixa da Banheira, onde obteve o 1º prémio, ex aequo.
Em 2010 expôs 72 trabalhos em 3 ocasiões e locais diferentes:
            - Na Capela da Misericórdia, em exposição integrada na Feira do Livro de Alhos  
              Vedros;
            - No Moinho de Maré, em exposição integrada nas festas de Alhos Vedros;
            - No Grupo Recreativo Familiar (GRF), no Bairro Gouveia, em exposição integrada nas comemorações do aniversário da coletividade.
Em 2012 participou com 12 trabalhos numa exposição coletiva no Convento Madredeus da Verderena, Barreiro.
Actualmente está patente uma sua exposição, sobre Alhos Vedros, no Restaurante “Os Arcos” em Alhos Vedros.
 
 
 

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

De Alhos Vedros até à Índia


(a propósito das Comemorações de "Alhos Vedros, 500 anos de Foral")


por Luís Santos

Supostamente, podemos então imaginar D. João I no Palácio situado no Cais Velho da vila de Alhos Vedros, pertença de seu filho bastardo D. Afonso que o acompanhava, recebendo os infantes e conversando sobre a possibilidade de, para o bem e para o mal, se ir guerrear a Ceuta. Nas traseiras daquele que é hoje designado pelo Palacete dos Condes de Sampaio haveria um alpendre que protegia daquele intenso sol do mês de Julho e contíguo ao qual se estendia um belo jardim. Amante que o rei era dos cavalos, da caça, da música, da dança, das lutas corpo a corpo, do jogo da pela e do xadrez, apesar do luto, pode-se imaginar como se ia gastando o tempo ali naquele nobre lugar. Deixou-nos de sua autoria o “Livro de Montaria”.

 Embora documentalmente não se possa sustentar que a estadia de D. João I tenha ocorrido com certeza absoluta naquele lugar do Cais, em alternativa, aparece-nos o Palácio da Graça, situado perto daquele que hoje é chamado de Largo da Graça, mesmo ao lado da Quinta da Graça, e que em meados do século passado ainda estaria habitável, mas do qual, hoje, só existem ténues vestígios, o que o torna, desde logo, um sítio de grande valor arqueológico para a história local, pois que pode acrescentar algumas informações importantes aos conhecimentos que hoje temos sobre a região.

Este foi sem dúvida um período áureo da história de Alhos Vedros. Entre outros atributos, sabe-se que a dimensão do território era apreciável estendendo-se entre os limites da Aldeia Galega (Montijo), Palmela e Coina; o número de habitantes era muito significativo para a época, falando-se em “oitocentos e tantos moradores”(*), onde constavam alguns senhores da alta nobreza em suas casas apalaçadas; tinha direito de voto nos destinos do país quando se reuniam as “Cortes”; tinha duas Igrejas, várias ermidas e dois conventos; uma crescente atividade económica que se foi desenvolvendo desde os inícios da nação, onde, relembre-se, pontifica uma importante indústria naval, uma abundante produção agro-pecuária, muito sal, lenha e pedra da Arrábida, num período onde a navegabilidade do estuário do Tejo e a proximidade com Lisboa eram elementos cruciais de produção de riqueza.

E talvez tenha sido este também o seu período de maior apogeu, porque a epidemia da peste negra que grassou por todo o continente europeu, e que dizimou cerca de dois terços da sua população total, também atingiu o nosso país e a nossa vila. É sabido que trezentos anos depois Alhos Vedros contava só com aproximadamente um quarto da população que teve neste período. Com a peste, entre a gente mais ilustre, foi não só a Rainha Filipa de Lencastre, como parece que também havia de ir uns bons anos depois o seu filho D. Duarte.

Eis algumas curiosidades interessantes à época sobre os descendentes de D. João I e que, de alguma forma, também se ligam à história de Alhos Vedros:

- D. João I, morre em 1433, com 76 anos, um período razoavelmente longo de vida para a época.

- D. Duarte I, sucede ao pai como rei de Portugal e continua a expansão do território, por terra e por mar. No seu tempo conquistam-se várias cidades importantes no norte de África (Marrocos), tal como é no seu tempo que se dobra o Cabo Bojador (1434), na costa ocidental africana, lugar mítico de então que se abria para um mundo marítimo desconhecido.

- O Infante D. Henrique, nomeado Grão-Mestre da Ordem de Cristo em 1420, instala-se em Sagres onde cria uma Escola Náutica e passa a liderar o projeto da Expansão Ultramarina Portuguesa. A ele se atribui também uma cátedra de Astronomia na Universidade de Coimbra, fundada por D. Dinis. Para lá do Cabo Bojador chega-se ao Senegal, Cabo Verde, Guiné, ultrapassando os limites do deserto do Saara e abrindo portas para toda a África Meridional. “Em 1452 a chegada de ouro era em suficiente quantidade para que se cunhassem os primeiros cruzados nesse metal.”(**) Morre em 1460, deixando explorada a costa africana até à Serra Leoa.

- D. Afonso, Conde de Barcelos, embora filho ilegítimo de D. João I, torna-se o tio mais próximo de Afonso V quando este sucede a seu pai D. Duarte como rei de Portugal, que o nomeia Duque de Bragança, na altura uma das casas mais ricas de Portugal e da Europa.

- Por fim, D. João II, filho de Afonso V e bisneto de D. João I, continua o tremendo e arrojado projeto da exploração atlântica, dando prioridade à descoberta de um caminho marítimo para a Índia. Foi ele quem negociou com os reis católicos que criaram Espanha, o Tratado de Tordesilhas, em 1494, que dividia o mundo em dois hemisférios, separados justamente pelo meridiano de Tordesilhas, onde se acordou que as terras a ocidente desse meridiano seriam exploradas pelos espanhóis e a oriente pelos portugueses, as duas maiores potências náuticas da época. Morreu em 1495, sem deixar filhos legítimos.


(*)ALVES, P. Carlos Póvoa, Subsídios para a História de Alhos Vedros, ed. do autor, 1992 (1ª edição), p.18.
(**)Wikipédia Livre, Infante D. Henrique, 22/2/2014
Imagem: Cruz de Cristo, símbolo que identificou, dentre outros, as naus portuguesas durante os descobrimentos.


terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

A COMUNIDADE DO VALE DA ESPERANÇA - UMA CRÓNICA



Termina assim a publicação deste romance que nos acompanhou desde o princípio de Junho de dois mil e doze. É mais que merecido pois, o descanso que se lhe seguirá. A todos os que leram e comentaram ao longo destas duas dezenas de meses, aqui deixo os meus mais sentidos agradecimentos. 
“A Comunidade do Vale da Esperança – Uma Crónica” materializa a minha passagem pelo romance épico, algo que, atendendo às tradições literárias em que, a partir de Sebastião Sorumenho, tenho conduzido o principal da minha obra de ficção, eu teria sempre de vir a fazer. Nesse sentido, é pois a minha homenagem a todos os realismos que se desenvolveram ao longo do século vinte e que em denominador comum tiveram a reflexão sobre as contingências das vidas humanas tendo por pressupostos básicos as ideias da dignidade e da justiça. Antiga e volumosa é a continuidade de exemplares dessa espécie em que podemos agrupar obras intemporais como, por exemplo, “Por Quem Os Sinos Dobram”, de Hemingway ou, com outro timbre, “A Guerra dos Mundos”, de um Llosa. É então na sequência e dessa história cultural e literária que eu quis experimentar a pena em tal quadrante romanesco e com isso construir uma história em que o herói é a própria comunidade e aquilo que se conta é, fundamentalmente, a epopeia em que esta se edificou e solidificou e tantos frutos veio a dar. É assim o meu romance épico que hoje aqui encerra a sua primeira publicação neste formato da blogosfera e sempre neste simpático espaço de liberdade que escolhi para lhes apresentar uma amostra da obra que tenho vindo a lavrar neste universo maravilhoso da Literatura. 
 Possa ter sido a leitura agradável, é o meu maior desejo. Se em ela leram a alegoria que sobre o mundo contém, perante vós me curvo e apenas acrescentarei que terão sido atingidos todos os propósitos que tive em mente ao escrever esta peça que tanto divertimento e alegria me transmitiu, enquanto a elaborei. 
Resta-me desejar-lhes Paz e saúde e manifestar a gratidão pela paciência que possam manifestar para continuarem a ler-me, no futuro que não regressará antes da Primavera. Até lá, continuem com o Estudo Geral que, diariamente, continua merecedor de todo o vosso interesse.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

REAL... IRREAL... SURREAL... (68)



Biblioteca, António Tapadinhas, 2003
Acrílico sobre Tela, 50x60cm

Abrir uma página

Se a nossa vida é um livro, cada dia é um capítulo dessa obra interminável (quando somos jovens, somos imortais), que nós vamos escrevendo...

O problema é que não há borracha ou sistema que apague aquilo que escrevemos com erros...

Ficam sempre marcas no papel, ou cicatrizes no corpo.

Quanto menos folhas faltarem para o fim do livro mais calmamente devemos saborear, digerir cada palavra… Aí reside a sabedoria dos que aprendem com o que escrevem.

Quem gosta de se exibir com a sua cabeça cheia de nada é porque não tem o peso da sabedoria, que lhe dá a consciência do seu pouco saber...

Minha verdadeira natureza está por descobrir, mas desconfio de quem diz para desconfiar.

O sonho pode ser tão real,
como a realidade ser um sonho...


Não são incompatíveis! Nós, às vezes, esquecemos essa verdade e, o que é pior, não somos capazes de lutar por ela!

António Tapadinhas

domingo, 23 de fevereiro de 2014

 
TENTATIVA DE UMA CRÓNICA
 
 
 
 
                                                               
Fotos: Edgar Cantante
 

A corja montou o circo e organizou o espectáculo.
Convidou os, mais ou menos, correligionários e tentou cativar-nos para espectadores.
Os, mais ou menos, correligionários compareceram quase todos.
Por todo o país foi erguido um enorme palco para que ninguém fosse privado do deslumbramento.
Do espectáculo.
Para a sua cobertura foram mobilizados todos os meios.
As rádios e televisões, jornais e revistas, comentadores, fazedores de opinião…
Uns, mesmo ausentes foram apedrejados, já outros, também ausentes, foram aclamados.
Uns, ainda combalidos por alguns tropeços – qu’isto da sofreguidão às vezes pode embaçar – foram recuperados e, por entre o soar das trompas, anunciou-se o seu próximo regresso, agora que se aproxima nova época de caça e são reconhecidos os seus méritos de batedores.
O espectáculo apostou na cor e na música.
Na falta de bons solistas, privilegiou-se o coro que, apesar de não ser grande coisa, lá conseguiu atinar na toada.
Até o sol ainda apareceu curioso por tamanho frenesim mas acabou por se ir embora.
O tempo arrefeceu, ficou frio.
As nuvens carregaram-se e escureceram.
O pagode recolheu-se.
Indiferentes alguns, incrédulos outros, com a alma pesada outros ainda.
Assim nos vamos adiando no protelar do que, no fundo, talvez sejamos ou queiramos ser.
 

*
Mesmo se no fundo, onde tudo é ainda apenas e só magma indivisa, algo reivindica a tona.
Uma brisa agitando-se em luz remexe na profundidade pedindo garimpo para se depurar.
Garimpamos e tudo se agiganta pois que, se a luz de fora ilumina a de dentro apazigua e é então que amanhece.


M.J.Croca




sábado, 22 de fevereiro de 2014

Rábanos e Rabanetes


por Miguel Boieiro

Os compêndios consultados dizem que o rábano não se encontra espontâneo e tampouco se conseguiu determinar a sua região de origem, embora seja claramente oriundo dos climas temperados. O facto é que ele nasce espontaneamente no meu quintal. Não preciso de o semear porque, na altura própria, ou seja, quando aparecem as primeiras chuvas do outono, começo a ter fartura de nabiças. Com o decorrer do tempo, ganha uma raiz grossa e carnuda, floresce e dá sementes que se espalham pelo terreno. Depois, só é preciso efetuar desbastes e mondas, assentando nos princípios da chamada permacultura.

Este rábano de que vos falo, também conhecido por rabão, nabo-chinês ou nabo-japão, dá pelo nome científico de Raphanus sativus L. subsp. Longipinnatus. Vejamos: “raphanus” vem do grego e significa crescimento rápido, “sativus” provém do latim e significa que a espécie é cultivada e “longipinnatus” refere-se às folhas que são longas e recortadas. Outra espécie afim é o rabanete - Raphanus sativus L. var. radicula. São ambas plantas da utilíssima família das crucíferas com praticamente os mesmos constituintes químicos e semelhantes usos culinários e fitoterapêuticos. Ao efetuar consultas, quer pelos livros, quer pela internet, depara-se com alguma confusão porque há quem as considere o mesmíssimo vegetal. Todavia, quando adultos, apresentam-se fisicamente bem diferentes. Os rabanetes, embora “não indo à mesa do rei”, como se apregoa num fado popular, são bastante mais conhecidos. De ciclo anual, apresentam-se pequenos, redondinhos e vermelhinhos (espécies mais comuns) e entram na decoração de diversos pratos. Por sua vez, os rábanos são bienais, bem maiores, a pele da sua raiz é mais rosada e o sabor mais picante, já que possuem compostos sulfurados em maior quantidade. Podem alcançar quase meio metro de altura, têm raiz pivotante, folhas alternas e flores rosadas hermafroditas. As sementes, de cor castanha, ficam encerradas em silíquas aguçadas.

A textura da raiz é crocante e picante, cujo ardor se reforça com a falta de água.
Eis os principais constituintes do rábano: heterósidos sulfurados, óleo essencial, glúcidos, aminoácidos, antocianósidos, potássio, cálcio, fósforo, vitamina C, vitaminas do complexo B e diversas enzimas.
Propriedades: diurético, béquico, colagogo, dissolvente dos cálculos hepáticos e renais, anti escorbútico e aperitivo.

O rábano é benéfico no tratamento de inúmeras enfermidades, de que destacamos as seguintes:
- Asma, bronquite, catarro e outros transtornos do sistema respiratório. Coze-se 100 g da raiz num litro de água, adoça-se com mel e toma-se 3 ou 4 vezes por dia;
- Dispepsia, cálculos renais e problemas hepáticos. Deve-se consumir a raiz crua amiudadas vezes;
- Cálculos biliares. Comer a raiz cortada às rodelas embebida em sumo de limão;
- Urticária e acne. Esmagar rábanos adoçados com mel, coar e beber até meio litro por dia;
- Artrites. Aplicar cataplasmas de rábanos triturados nas zonas do corpo afetadas.
- Obesidade. Tomar em jejum uma papa preparada a partir de uma raiz de rábano esmagada (ou de três rabanetes) sem qualquer adoçante.

O Dr. Oliveira Feijão em “Medicina pelas Plantas”, prescreve o xarope confecionado com rodelas finas de rábano fervidas com açúcar para debelar a tosse convulsa.

Também o Dr. Samuel Maia no “Manual de Medicina Doméstica” apresenta receitas de xaropes e de vinho antiescorbútico, algo sofisticadas.

Na culinária é sobejamente conhecido o uso das folhas e das raízes dos rábanos em saborosos caldos e sopas alcalinizantes. As raízes cortadas às rodelas valorizam extraordinariamente as saladas crudívoras e aprimoram a guarnição de variadíssimos menus.

No Japão, a variedade designada por “daikon”, de raiz mais esbranquiçada, é um ingrediente importante da respetiva cozinha, proporcionando, inclusive, a elaboração de figuras esculpidas que beneficiam a apresentação dos pratos, uma vez que “os olhos também comem”. É igualmente determinante nas cozinhas coreana, chinesa, vietnamita e indiana.

Em França e nos países do norte da Europa gabam-se as virtudes do rábano negro - Raphanus sativus var. niger, cuja raiz possui uma tez escura. Muito utilizado na culinária, pois é de baixo valor calórico, estimula a secreção dos sucos digestivos com o seu típico sabor picante (Plantes Potagères - editora Gründ).


sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Livros d'África



ORLANDO DE ALBUQUERQUE  (1925, Maputo – 1997, Braga) 

A melhor maneira de falar deste escritor, médico de profissão, nascido em Moçambique mas vivendo grande parte da sua vida em Angola, depois de se ter casado em Portugal com a poetisa angolana Alda Lara, é deixar-vos uma pequena crónica de sua autoria, incluída em jeito de Prefácio no livro “A CASA DO TEMPO”, um escrito de 1964 e republicado em 1995 pela APPACDM de Braga para quem revertem todos os direitos e receitas das suas obras, o que ilustra bem sobre o seu espírito solidário e defensor de causas. Cá vai ela:


A CASA DO TEMPO

Perguntaram-me porque intitulei, genericamente, estas minhas crónicas “A Casa do Tempo”, sendo elas tão pouco temporais. Parecerá estranho, mas a razão é bem simples e não tem metafísica alguma.

Quando aqui cheguei (*), passei por um edifício de construção diferente, destoando de todos os prédios em redor. Interroguei o motorista que me conduzia e ele, pura e poeticamente, respondeu-me na sua simplicidade:
- É a Casa do Tempo!...

Vim depois a saber que se tratava de um observatório metereológico. Achei bela esta designação, duma beleza que os homens de gabinete não são capazes de descobrir e que só os poetas vêm nos olhos das crianças e na boca dos motoristas de camião. Que mundo de poesia e de simbolismo encerra esta designação!... Nem toda uma descrição minuciosa, com alfas e ómegas, seria capaz de nos dar o mistério imaterial da realidade desses objectos frios e mecânicos.

Os poetas modernos descobriram poesia na frieza das máquinas. Mas a sua poesia é uma poesia geométrica, na rigidez sincronizada do aço. Brilhante e fria.

O motorista mestiço, que de máquinas mal conhece o seu camião e de letras pouco vai além do mastigar do jornal, foi mais poeta do que todos os poetas… Há mais poesia na sua designação, que em todo um livro de poemas. Há poesia e há sonho. Há simbolismo e há realidade. Uma realidade que transcende a própria realidade do palpável, para se evolar no sonho da própria poesia, que é a vida.

Foi por isto que eu escolhi esta designação para as minhas despretensiosas crónicas. Não que pretenda para elas tudo aquilo que o sonho encerra, mas apenas uma homenagem à POESIA da VIDA.


(*) O autor refere-se ao Dundo, povoação capital da Diamang na Lunda Norte.


Tomás Lima Coelho


quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

D'ARTE - CONVERSAS NA GALERIA
 
3ª Série - 08
 
PINTURA
 
Fátima Romão






“Versus”

 
As obras apresentadas na sua globalidade assumem o título “Versus”, remetendo-nos a um universo dinâmico e contraditório em termos de formas, cor e nuances, explorados com base na reformulação de conceitos.
Procurando transportar o imaginário da artista ao subconsciente de quem as contempla, ambos são induzidos ao mesmo espaço onírico – versus quotidiano comum a todos os seres, camuflado por imposições socio-económicas que nos induzem a falsos valores e estereotipos.
Presentemente a “fantasia” confunde-se com a realidade, proliferando a irracionalidade de uma sociedade em que os sentimentos e eminentes acções são “versus” humanidade.
As obras, consequência de várias vivências em períodos distintos da vida da artista, iguais ou idênticas a muitos de vós, procuram provocar sensações aparentemente ilusórias e subjectivas,  em que os sentidos despertados (ou não) buscam no observador a sua verdadeira essência.
Versus realidade! Ou Versus objectividade imposta pela actual realidade?
A resposta está em si...
 
Mesmo que lhe sejam indiferentes, procure, explore o seu olhar, questione, liberte os sentimentos  e obterá o título das obras.
 
Texto do catálogo da Exposição Individual "Versus"/ Autora: Fatima Romão
 
 
 
Fatima Romão é natural de Lisboa (1963), viveu até aos 18 anos no Algarve.
Tendo sido criada junto ao mar e habituada a conviver directamente com a natureza, a luminosidade e volumetria da mesma está sempre patente nas suas obras em termos criativos, assim como a busca de novas sensações e espaços pictóricos, em complemento com a sua paixão pela música e pela dança.
 Licenciada em Design de Comunicação da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, leccionou (1987 – 1995) as disciplinas de Educação Visual / Desenho / Arte e Design no Ensino Secundário Oficial.
Sócia fundadora da Artesfera - Associação de Artistas Plásticos  do  Barreiro ,  participou como designer  em vários projectos de divulgação cultural e artística, nomeadamente no projecto “Criar a partir da Sucata” do Instituto de Reinserção Social / Projecto Vida (1995); Ciclo de Conferências sobre “Arte e Indústria” no Auditório da Bib. Munic. do Barreiro (1996); projecto de intercâmbio cultural entre Portugal e a Eslováquia - “Barreiro / Bratislava” (1998).
Autora de vários textos sobre arte para catálogos, imprensa regional e rádio, ilustrou o livro de poesia “Um Sonho chamado Liberdade” de Sousa Pereira (1991), realizando os projectos do Troféu da Comunicação Social - “Barrind89” (1989) e do Troféu “Solidariedade” da Santa Casa da Misericórdia do Barreiro (1996).
Formadora dos cursos de Desenho e Pintura das Oficinas de Arte da  CACAV,  em A. Vedros.
Prémios:
1991 – 1º Lugar / Prémio Logotipo “CUP”- Centro de Utilidade Pública e Ecológica do Barreiro
1995 – 1º Lugar / Prémio de Pintura “Artesfera” - III Exposição Anual da Artesfera  -  Bib. Munic. do Barreiro.
1996 - Menção Honrosa / Prémio de Desenho Américo Marinho - Galeria Munic. Barreiro
1997 - Seleccionada para a Exposição / Prémio Vespeira (C. M. Montijo).
 
 

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

CRIE-SE UM MINISTÉRIO DAS COMUNIDADES E DA LUSOFONIA!


Em prol de uma Lusofonia para além do Espaço do Sentimento de Pertença


António Justo


A Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, independentemente de algumas mais-valias pontuais que regista e do seu trabalho administrativo, revela-se, ao longo da sua vigência, ineficiente e desgastante, contribuindo até para adiar, ad eternum, uma possível política séria, com pés e cabeça para a emigração e para as comunidades lusófonas. A experiência da Secretaria de Estado constituiria um contributo importante à hora de ser definida uma reforma da política das Comunidades portuguesas e da lusofonia em termos de estratégia.

Só um ministério próprio estaria à altura de reparar os defeitos da política passada e seria capaz de desenvolver conceitos e estratégias de uma política abrangente e adequada aos novos tempos. Temos a área da cultura, da língua, da economia, da lusofonia à espera de concepção inclusiva, de projectos e aplicação numa política visível e eficiente que sirva e se aproveite dos recursos das potencialidades migrantes e dos países lusófonos (com eventuais parcerias).

Urge aproveitar com eficácia a rede da presença lusa e das suas economias de maneira mais satisfatória e proveitosa para os emigrantes, para Portugal e para os países lusófonos. As comunidades da diáspora lusófona poder-se-iam aproveitar e ser aproveitadas e reunidas em conveniências comuns de fomento (Bancos, Câmaras da Indústria e do comércio, representações diplomáticas, institutos culturais, etc.) numa estratégia de inclusão de interesses e políticas de perspectivas de futuro lusófono.

Só uma política, atenta aos sinais dos tempos e à realidade da perspectiva das economias emergentes lusófonas e do equacionamento de projectos em termos globais, poderá dar resposta adequada às novas possibilidades e ao enquadramento económico e estratégico do constante fenómeno de movimentação social. Só a criação de instituições inclusivas com grande peso a nível de governos e de sociedade darão resposta eficiente aos novos desafios.

A missão não pode estar subjugada nem amarrada à administração (burocracia) se não queremos dar continuidade à típica mentalidade orientada pelo hábito da apagada e vil tristeza de não vermos o que está para além das bordas do próprio prato.

Assim deveria ser criado um ministério das Comunidades muito ligado ao MNE, a repartições ministeriais de gestão, de economia, de finanças, de cultura, universidades, turismo e de investimento! (Isto são ideias que já defendia publicamente em “O Emigrante” dos anos 80 ao dar-me conta do desperdício de recursos e da falta de racionalização e eficiência administrativa na emigração! A mesma carência de visão constatei ultimamente na reacção do MNE e Secretaria das Comunidades à luta que encabecei pela subsistência consular de Frankfurt; a rotina, a perspectiva burocrática e a defesa de interesses de instalados têm determinado muitas das decisões políticas e deste modo atrasado o desenvolvimento de Portugal e dos portugueses.)

Continua a ser irresponsável e arcaica uma política abandonada à boa vontade de secretários de Estado das Comunidades que, além da falta de uma política forte que os apoie, têm de se acomodar aos maus hábitos da casa (burocracia) que dirigem!

Em todos os Secretários de Estado que pude observar constatei o seu estado carente de também eles serem migrantes na transitoriedade de uma vida política que os obriga a cobrir a irresponsabilidade política de um Estado/Governos que nunca se interessou por delinear uma política séria para uma vertente tão importante como a dos emigrantes e das suas economias.

Na minha observação do palco político e do agir das Secretarias de Estado, durante mais de 30 anos, constatei sempre o mesmo estado precário desta instituição que, além de boa vontade e iniciativas passageiras, não deixa nada de duradouro. Um mínimo de seriedade política conceptual e programática exigiria um certo interesse por se encarar o problema de fundo. Verifiquei nos anos oitenta, um pouco de interesse de curta duração que não passou de meras intensões de discussão burocrática! Uma política de carácter meramente indutiva sem um tecto dedutivo que lhe dê perspectiva alargada continuará a ser incómoda para secretários de Estado e prejudicial para a emigração ao desperdiçar levianamente os seus recursos e as potencialidades de Portugal. Temos universidades e pessoas de experiência que em conjunto poderiam elaborar cenários políticos. Os partidos portugueses deveriam abandonar o jogo da cabra cega e do pingue-pongue a que se têm dedicado em questões de política de língua e de emigração para se afirmarem como competentes e ser reconhecidos em serviço do povo.

Também a discussão da política dentro da comunidade portuguesa (falo da Alemanha que conheço melhor) tem sofrido do característico defeito português, de se reduzir a visões partidárias de perfilhação e fomento de perfil partidário nada isenta nem equacionada em termos de situação e de povo!

O novo ministério poderia criar condições para a canalização das remessas para o investimento produtivo em Portugal e contribuir para a inovação da mentalidade portuguesa no sentido de se fomentar uma cultura de trabalho frutuoso e responsável. A perspectiva dos países lusófonos, em que a Lusofonia se tornasse não só o espaço do sentimento de pertença mas também a nova força catalisadora das novas gerações, não deveria ser parte acidental da filosofia e práxis de um Ministério das Comunidades e da Lusofonia.


António da Cunha Duarte Justo



terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

A COMUNIDADE DO VALE DA ESPERANÇA - UMA CRÓNICA



Há muito que eu decidi que se vivesse até aqui seria este o dia em que daria estes cadernos por terminados. Ele anda ao rubro uma discussão, para mim de lana caprina, sobre se este é o primeiro dia do novo século ou apenas o do último ano da centúria de vinte. Como não percebo patavina destes assuntos e não sei avaliar o argumentário de um e do outro lado da polémica e como me sinto cansada e desiludida com um mundo que gira sem norte definido e ainda mais resignado ao que acontece ao sabor das circunstâncias, decidi que seja lá como for, pelo menos quanto a mim e para o caso a minha opinião é o que me basta, este é o primeiro dia do novo milénio e com ele encerro estas páginas a que dei início na sequência da excitação das primeiras noites em que aqui dormi ou da primeira noite em que aqui o fiz sob um tecto verdadeiro. Consola-me a luz de esperança que é ver os passos, aqui e ali titubeantes mas na generalidade consistentes e certeiros que esta nova geração está a dar na cooperativa e pelos quais já valeu a pena limpar a tabuleta que indica o Vale da Esperança e o jardim da praça central onde o monumento ao nosso sonho voltou a ter realce. E fico com a certeza, tal como canta o José Mário Branco e estou segura que ele não se incomodará por aqui o citar, um mundo melhor será possível quando toda a gente assim quiser. Agora sei que morrerei em paz por saber que esse ideal persiste algures, aqui, no Vale da Esperança. 


 Alhos Vedros, Porto, Portel, Mindelo, Bragança e Alhos Vedros, entre fins de Outubro de 2009 e 12 de Agosto de 2010

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

REAL... IRREAL... SURREAL... (67)


Amarras, António Tapadinhas, 1998
      Óleo sobre Tela, 100x60cm

Dedicatória de Ernesto Dias Jr.

Ao ler uma postagem do amigo António Tapadinhas - ilustrada com sua própria pintura que ora roubo - correu-me a poesia. Trouxe-me o tempo em que, abraçado ao brandal, de pé na proa, eu sabia todos os nomes. Ao amigo dedico, pois, o poema.

Ao cabo perguntava o seu pintor
O ganho que rendia à pensa corda
ser uma amarra triste e sem valor
quando sem barco nada mais que morta
Inveja sentiria dos estais
a balouçar nas ondas e no vento
assoviando versos às sereias
fazendo coro às vozes dos brandais
Não ter jamais na vida a alegria
de aguentar o pano a barlavento
ou revoluta como um lais de guia
fazer-se e desfazer-se em nós ao tempo
antes trabalha só quando sujeita
ao cais imundo irmãos de bom massame
acovardado os mares não enfrenta
sem pau, sem proa, é só e sem velame
Retruca o cabo ao moço em tom veraz
é fato que não sou um amantilho
nem um cabresto, nem um patarraz
nem em convés por certo me enrodilho
Nem silvo quando vem a tempestade
nem sei o gosto de à água um beijo
nem mesmo se me desse a liberdade
um marinheiro em bêbado desleixo
Escreve pois aí com teus pincéis
que meu labor ao fim se equilibra
É um dinheiro não medido em réis
que dá valor a cada minha fibra
nas mãos do estivador meu soldo
é marca que lhe deixam cabos
quando agradece ao fim de uma jornada
a honestidade impressa nos seus calos

Agradecimento:
Agarrado ao quê? Lá fui ver: Brandal - cada um dos cabos que aguentam os mastros no sentido transversal. Valeu que a partir de agora não me vou ofender se me chamarem de burro: Burro - cabo ou peça que impede a retranca de subir. 


 António Tapadinhas

domingo, 16 de fevereiro de 2014







(O Miguel Torgal tornou a não dar notícias. Enviou apenas uma mensagem. Diz que o trabalho com constantes deslocações lhe tem ocupado muito tempo e que anda cansado. Talvez na próxima semana...)


* * *


DERIVA
Por muitos caminhos andei
por projectos em construção
nos sonhos por viver.
Nuns reincidi, outros recusei
às vezes de alma crescendo na mão
noutras afundando-me até doer.
No que fui vendo, sentindo e percebendo, aceitei
que o coração se cumpre na busca da possível razão
por caminhos vários, catando nos tempos, em mim,
                               no outro e na construção do ser.
                                                                                                              Manuel João Croca
 
Foto: Joana Croca