ORLANDO DE
ALBUQUERQUE (1925, Maputo – 1997, Braga)
A melhor maneira de
falar deste escritor, médico de profissão, nascido em Moçambique mas vivendo grande
parte da sua vida em Angola, depois de se ter casado em Portugal com a poetisa angolana
Alda Lara, é deixar-vos uma pequena crónica de sua autoria, incluída em jeito
de Prefácio no livro “A CASA DO TEMPO”, um escrito de 1964 e republicado em
1995 pela APPACDM de Braga para quem revertem todos os direitos e receitas das
suas obras, o que ilustra bem sobre o seu espírito solidário e defensor de
causas. Cá vai ela:
A CASA DO TEMPO
Perguntaram-me porque
intitulei, genericamente, estas minhas crónicas “A Casa do Tempo”, sendo elas
tão pouco temporais. Parecerá estranho, mas a razão é bem simples e não tem
metafísica alguma.
Quando aqui cheguei
(*), passei por um edifício de construção diferente, destoando de todos os
prédios em redor. Interroguei o motorista que me conduzia e ele, pura e
poeticamente, respondeu-me na sua simplicidade:
- É a Casa do Tempo!...
Vim depois a saber que
se tratava de um observatório metereológico. Achei bela esta designação, duma
beleza que os homens de gabinete não são capazes de descobrir e que só os
poetas vêm nos olhos das crianças e na boca dos motoristas de camião. Que mundo
de poesia e de simbolismo encerra esta designação!... Nem toda uma descrição
minuciosa, com alfas e ómegas, seria capaz de nos dar o mistério imaterial da
realidade desses objectos frios e mecânicos.
Os poetas modernos
descobriram poesia na frieza das máquinas. Mas a sua poesia é uma poesia
geométrica, na rigidez sincronizada do aço. Brilhante e fria.
O motorista mestiço,
que de máquinas mal conhece o seu camião e de letras pouco vai além do mastigar
do jornal, foi mais poeta do que todos os poetas… Há mais poesia na sua
designação, que em todo um livro de poemas. Há poesia e há sonho. Há simbolismo
e há realidade. Uma realidade que transcende a própria realidade do palpável,
para se evolar no sonho da própria poesia, que é a vida.
Foi por isto que eu
escolhi esta designação para as minhas despretensiosas crónicas. Não que
pretenda para elas tudo aquilo que o sonho encerra, mas apenas uma homenagem à
POESIA da VIDA.
(*) O autor refere-se ao Dundo, povoação capital da Diamang na Lunda Norte.
Tomás Lima Coelho
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