segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

REAL... IRREAL... SURREAL... (67)


Amarras, António Tapadinhas, 1998
      Óleo sobre Tela, 100x60cm

Dedicatória de Ernesto Dias Jr.

Ao ler uma postagem do amigo António Tapadinhas - ilustrada com sua própria pintura que ora roubo - correu-me a poesia. Trouxe-me o tempo em que, abraçado ao brandal, de pé na proa, eu sabia todos os nomes. Ao amigo dedico, pois, o poema.

Ao cabo perguntava o seu pintor
O ganho que rendia à pensa corda
ser uma amarra triste e sem valor
quando sem barco nada mais que morta
Inveja sentiria dos estais
a balouçar nas ondas e no vento
assoviando versos às sereias
fazendo coro às vozes dos brandais
Não ter jamais na vida a alegria
de aguentar o pano a barlavento
ou revoluta como um lais de guia
fazer-se e desfazer-se em nós ao tempo
antes trabalha só quando sujeita
ao cais imundo irmãos de bom massame
acovardado os mares não enfrenta
sem pau, sem proa, é só e sem velame
Retruca o cabo ao moço em tom veraz
é fato que não sou um amantilho
nem um cabresto, nem um patarraz
nem em convés por certo me enrodilho
Nem silvo quando vem a tempestade
nem sei o gosto de à água um beijo
nem mesmo se me desse a liberdade
um marinheiro em bêbado desleixo
Escreve pois aí com teus pincéis
que meu labor ao fim se equilibra
É um dinheiro não medido em réis
que dá valor a cada minha fibra
nas mãos do estivador meu soldo
é marca que lhe deixam cabos
quando agradece ao fim de uma jornada
a honestidade impressa nos seus calos

Agradecimento:
Agarrado ao quê? Lá fui ver: Brandal - cada um dos cabos que aguentam os mastros no sentido transversal. Valeu que a partir de agora não me vou ofender se me chamarem de burro: Burro - cabo ou peça que impede a retranca de subir. 


 António Tapadinhas

2 comentários:

MJC disse...

A pintura é muito boa, o poema não fica atrás, o conjunto é soberbo.

Gostei. Mesmo.

Abraço.

Manuel João Croca

A.Tapadinhas disse...

MJC: Obrigado em meu nome e do meu amigo Ernesto Dias Jr.

Abraço,
António