No dia 13 de fevereiro assinalam-se os 117 anos de nascimento do Professor Agostinho da Silva
Naquela Ilha dos Amores
que sonhou Camões outrora
só entra e fica liberto
quem lá viva desde agora
(Agostinho da Silva, Quadras Inéditas, p.72)
Travessa do Abarracamento de Peniche, Nº7, onde Agostinho da Silva morou nos últimos anos de vida
Agostinho da Silva é um dos precursores da conceção de um Projeto
Lusófono que junte países e comunidades, ideia que, de alguma forma, acabou por
se materializar em 1996, com a criação da “Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa” (CPLP). O Professor, porém, não se fica exclusivamente pela língua
portuguesa, e como a considera irmã do castelhano, tal como das outras línguas
ibéricas, sugere que se parta para a construção de uma confederação ibérica que partilhe objetivos comuns dando, assim,
maiores possibilidades ao Projeto.
Para Agostinho, esse referido espírito peninsular medieval ter-se-á
reaberto de novo em Portugal no século XX, centrado em dois movimentos
simultaneamente complementares e opostos, como terão sido a “Renascença
Portuguesa” e a “Seara Nova”, nas suas palavras, “o primeiro, sobre o signo da
saudade, o segundo, sobre o signo da ação”.
Por outro lado,
segundo ele, a ideia de “sacralização” do mundo que se amplia a partir da
Península Ibérica com a Expansão Ultramarina, está bem marcada nalguns autores
portugueses, como são, particularmente, os casos de Luís de Camões nos
“Lusíadas” e do Padre António Vieira
com a sua ideia de “Quinto Império”, ideia esta que é retomada por Fernando Pessoa com renovados
contornos.
Como diz
Fernando Pessoa, um Império que será o “quinto”, porque fundirá os outros
quatro que anteriormente existiram (grego, romano, cristão e europeu), de
dimensão mundial e universal, com uma nova religião que sairá do cristianismo,
mas que o transcenderá, e que o poeta designa de “Paganismo Superior” ou, para
utilizar expressão de Agostinho, de “Politeísmo Supremo”.
Eis, então, a
proposta essencial a que Agostinho chega que vai defender e desenvolver vida
fora: O Império enaltecido na “Ilha dos Amores” dos Lusíadas, prosseguido por
Vieira e por Pessoa, será um império verdadeiramente “católico”, quer dizer, de
acordo com a etimologia da palavra, universal, e caracteriza-se pelo advento da
Idade do Espírito Santo, o consolador da esperança humana, tal como profetizara
o evangelista S. João e idealizou o abade italiano Joaquim di Fiore. Em
síntese, o “quinto império”, o império do Espírito Santo, um império de amor e
de serviço.
Este Deus
consolador que se refere é aquele que Cristo revela, a quem Agostinho reza na
igreja, mas que não é o Deus das igrejas, antes o Deus que as une e paira acima
de todas. É um Deus a que podemos chegar se atingida a verdade. Um Deus
íntegro, total, paradoxal, tudo e nada, imanência e transcendência, que junta
tempo e eternidade, sem separação de bem e mal, de homens e animais, de tudo o
que existe. Um Deus que é, antes de mais, inefável, e é silêncio, que é alogos e não logos, onde ciência e filosofia, “saudades disfarçadas em
raciocínio”, devem ajudar a atingir, mas não podem definir.
Numa fase de maior amadurecimento filosófico Agostinho da Silva, ao “catolicismo” de Vieira e ao “paganismo superior” de Pessoa, vai acrescentar uma dimensão orientalista a que se juntam, de maneira mais evidente, taoismo e budismo que passam a constituir os princípios filosóficos orientadores da desejável fusão ecuménica, sincrética, que dê, de novo, “novos mundos ao mundo”.
Em síntese, uma ideia de religião onde caibam
todas as religiões, mas também ateus e agnósticos, desde que à partida saibam
aceitar todos os outros como se de si próprios se tratasse; uma ideia de país e de mundo, onde
através da educação se possa propor e ajudar a construir na terra um “reino do
divino”, ou seja, uma organização social que se caracterize por uma dimensão de
serviço do bem comum, onde todos os homens possam velar por todos os homens e
não pelo desenrasca de só alguns; afinal, uma ecuménica fraternidade espiritual
em templo de paz global que é, ao mesmo tempo, um templo iluminado no interior
de cada um.
Luís Santos
(breve síntese do livro Agostinho da Silva: Filosofia e Espiritualidade, Educação e Pedagogia. V. N. de Gaia: Euedito, 2016)
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