quarta-feira, 31 de agosto de 2022

RETIRO

 Paulo Borges

Temos a alegria de vos propor este Retiro que dedicamos ao Amor e à experiência meditativa do elemento Fogo, no contexto da mandala das cinco energias seguindo a tradição budista tibetana.

O retiro decorrerá sob o signo da poderosa força inspiradora, motivadora e irradiante que é o amor, relacionada com o elemento Fogo, a cor vermelha e a sabedoria que reconhece, aprecia e ama todos os seres e fenómenos.

Abrir o coração e reconhecer todo o imenso potencial amoroso que há em nós é o desafio deste Retiro que decorrerá no Santuário Dewachen, rodeados de uma diversidade e abundância naturais, com uma alimentação consciente e nutridora, propiciando estados de consciência mais abertos e livres.

Tal como tudo o que aqui aspiramos fazer, trata-se de descobrir o ser real sob as máscaras do eu imaginário.

O retiro inspira-se na proposta do meu novo livro: Presença Plena https://www.penguinlivros.pt/.../farol/livro/presenca-plena/

domingo, 28 de agosto de 2022

O TRABALHO SOCIAL E A LIBERDADE

 Luís Santos

Imagem do google

Hoje, estive à conversa com um dos seniores da terra, amigo, oitenta e tal anos, pessoa de incrível jovialidade física e invejável lucidez. Escorreitamente dizia ele: "Em meados da década de 50 do século passado, com dezoito anos, trabalhava na CUF (Companhia União Fabril), e depois de alguns estudos e formação, fui aumentado para 4 escudos (2 cêntimos). Na altura, alguns tinham um dia de folga ao domingo. Depois, apareceu a semana inglesa, onde se começou a descansar também ao sábado à tarde...".

E dizemos nós, a folga ao domingo foi um luxo que as sociedades industriais pariram, porque no seu início a regra era os operários começarem a trabalhar aos 6,7,8 anos de idade, 12 horas por dia, muitas vezes sempre de pé, sem folgas, sem segurança social, apoio na saúde ou licença de maternidade…

Hoje, entre apoios sociais vários, vamos nas 35/40 horas de trabalho por semana e começamos a experimentar a semana de 4 dias, o que será uma realidade para breve e, certamente, que o tempo do “fim de semana” não vai parar de aumentar, mesmo que, neste processo de emancipação do trabalho, às vezes, seja preciso que a orquestra faça uma pausa para, depois, continuar a tocar. Por isso, fundamental mesmo, cada vez mais, é aprender a assobiar com as mãos nas algibeiras, porque, embora estejamos a meio do caminho, a libertação e a aproximação da humanidade de um mundo com cada vez menor dependência do trabalho está para continuar.

terça-feira, 23 de agosto de 2022

Literatura: o pão nosso de cada dia (VI)

 Luís Souta
(texto e foto)

À memória de Ana Luísa Amaral (1956-2022).
Que saudades já tenho do programa
“O Som Que os Versos Fazem ao Abrir”,
conversas semanais da poeta-professora com Luís Caetano, na Antena 2!


LITERATURA E COMPREENSÃO DA CONDIÇÃO SOCIAL E HUMANA 

«porque viver é decifrar o mundo» 
(“Largos os dias”, António Salvado)
 

«Escrevo para compreender» di-lo José Saramago1. O mesmo poderia dizer o investigador social. E aqui encontramos um ponto fundamental de intersecção entre estes dois grupos de intelectuais. Conhecer o mundo (o de hoje ou o do passado), compreender a riqueza e a complexidade do ser humano nesse devir histórico, nas suas múltiplas dimensões, nos seus variados contextos, são finalidades comuns que, afinal, ambos abraçam. De tal modo, que o escritor Alçada Baptista, quando lhe perguntaram o motivo por que escrevia, respondeu:

«A escrita é um meio de investigação»2.

Longe, portanto, de se oporem, os seus produtos – literários e científicos – devem antes interligar-se, complementar-se, ajudando-se mutuamente nessa tentativa, sempre inacabada, de reduzir as trevas e iluminar as sombras da vida das sociedades e dos homens. Mesmo quando não se quer ficar apenas pela “compreensão” dos fenómenos e se procura dar outra “utilidade” social àquilo que se produz, o debate interno dentro de cada um dos campos acaba por assumir contornos de alguma similitude: por exemplo, na literatura, o romance como forma de intervenção social e cultural (neo-realistas) vs a arte pela arte (presencistas); na ciência, os adeptos da investigação pura vs os defensores de uma investigação aplicada. Diferentes posicionamentos, que conduzem a clivagens dentro dos respectivos campos. Não é só a questão da autonomia do desenvolvimento das respectivas actividades, onde a liberdade é o valor supremo a preservar em ambas, que se coloca. É a dimensão política dessa mesma actividade que ganha relevo. E, como sabemos, a esfera do político é factor mais de divisão que de unidade.

Eduardo Prado Coelho, entre muitos outros críticos, escritores e pensadores, considera que

«o romance é, como todas as formas de arte, um meio de conhecimento do mundo»3.

José Saramago (1984:298) dirá, de «aqueles eternos insatisfeitos», os poetas, que essa sua “insatisfação” é já «um particular conhecimento do mundo» (1971:98). Desiderato intrínseco à poesia que Sophia de Mello Breyner Andresen via como a perseguição do real. Urbano Tavares Rodrigues cola-se nesta linha de pensamento e alarga essa finalidade (quantas vezes apenas implícita) à esfera do conhecimento do próprio escritor:

«a literatura, muito em especial, é uma forma, uma tentativa de chegar ao conhecimento e do enunciador se conhecer a si próprio, e de procurar a sua relação com o mundo e as coisas»4.

Edgar Morin corrobora e vai mais longe:

«A literatura, a poesia e a grande arte do nosso século, o cinema5, são escolas de vida, que nos mostram a complexidade dos seres humanos e das suas relações. São escolas onde aprendemos a conhecer o ser humano, não tanto do ângulo impessoal das ciências objectivas, mas como indivíduos que, enquanto sujeito, vive, sofre, ama e odeia, num turbilhão de relações humanas» (1998:4).

Mário Ventura, escritor e também muito ligado ao cinema (fundador do «Festroia» e seu director durante anos), reconhece, no entanto, o papel primordial da escrita:

«Para compreender [o mundo], a literatura continua a ser muito mais eficaz»6.

Compreensão em sentido amplo, mas partindo do particular, do caso concreto. Pois como nota Damon Galgut, vencedor do Man Booker Prize de 2012:

«Quanto mais confiamos no acto de ser local e específico mais universais nos tornamos.»7

A literatura opera mais na esfera do privado do que na esfera pública. Ela “entra” na vida íntima das famílias, descreve espaços e pormenores, revela sentimentos e desejos profundos de cada um dos seus membros, tira das memórias pessoais os registos que, tornados escrita, ficam e perduram. Assim, arrancando das “trevas” do anonimato, do esquecimento, do quotidiano, se recuperam modos de estar, fazer e sentir daqueles que não constam dos arquivos nem aparecem na História, mas têm história e que na escrita criativa do romancista (contista, poeta ou dramaturgo) se tornam “estórias”, que lemos, partilhamos e com as quais nos identificamos. Daí, Honoré de Balzac ter defendido, no prólogo de A Comédia Humana, que o romance é a história privada (secreta) das nações. É essa enorme diversidade de locais, pessoas, acontecimentos, pensamentos e acções, enredadas na técnica inconfundível da narrativa, que faz de um grande romance uma escrita sobre a vida, tal como o defendia o poeta francês Claude Roy. E faz da literatura uma fonte inesgotável de informação e conhecimento, e de uma enorme eficácia nos processos de aprendizagem.

Ora, se nos reportarmos ao mundo escolar, esta função da literatura ganha todo o sentido e amplia, a uma escala imensa, esse universo de descrição (quantas vezes etnográfica) da vida anónima de cada escola. Traz-nos a dimensão do particular, do individual, do concreto vivido e experienciado. Não na lógica de uma História da Educação, mais atraída pelos tombos, na expectativa de aí encontrar o (ainda) desconhecido “documento oficial”, mas de uma “história privada” das escolas, dos alunos, dos professores, das famílias… O acesso aos textos literários constitui, assim, uma ajuda fundamental para a compreensão do mundo académico e para um melhor entendimento da diversidade dos seus agentes. A literatura, na sua especificidade de contar e de nos oferecer saberes, permite uma outra leitura do real, sem deixar, no entanto, de evocar ideias, sensibilidades e particularismos de uma época, em concreto. Devemos ter presente, como nos relembra a escritora Teolinda Gersão, que

«a literatura está sempre marcada por uma determinada época e tem sempre algo de datado»8.

Fernando Dacosta chama a atenção para os condicionalismo existentes durante um período muito peculiar da nossa história – o Estado Novo, fortemente condicionado pela falta de liberdade de expressão, designadamente da imprensa, e como a literatura acaba por captar o real, desempenhando a função de “espelho” social. Os escritores funcionariam assim como uma espécie de “pintores” impiedosos da vida portuguesa:

«Amputados pela Censura Prévia, os jornais não exprimiam as realidades profundas das populações. Eram os romances que o faziam, com tiragens de dezenas de milhares de exemplares, levados, uns, pelas bibliotecas itinerantes da Gulbenkian, outros pelas estruturas clandestinas da oposição» (2001:186).

Para daí concluir que:

«A sina dos escritores é não calarem as bofetadas que vêem ser dadas à sua volta» (id.:348).

A literatura, apesar dos seus detractores econocratas, continua a ter um lugar insubstituível na sobremodernidade (Augé, 1992) e a ser um tesouro inesgotável de prazer, deleite e sabedoria. O escritor Olivier Rolin (1947-), autor de Porto-Sudão (Prémio Femina, 1994), considera que

«só a Literatura pode dar conta da complexidade humana, e não a História ou a Sociologia».

Também Stephan Ellenwood, presidente do departamento de Currículo e Ensino da Universidade de Boston, encara a literatura como uma verdadeira “escola” para o entendimento da condição humana e desde finais dos anos 80 tem vindo a desenvolver um «projecto de educação do carácter» tendo a literatura como instrumento básico; daí resultou a publicação, em 1993, da antologia The Art of Loving Well, um conjunto de textos clássicos e contemporâneos (mitologia, ficção e biografia), com intuitos interdisciplinares e que permite aos alunos a abordagem à complexidade humana, designadamente aos valores e à ética9.

 

Notas

1. Entrevista de José Saramago ao DN, 18/11/2000, p. 45.

2. Entrevista de António Alçada Baptista ao DNA, nº 144, 28/08/1999, p. 20.

3. Eduardo Prado Coelho, Público, 2001.

4. Entrevista de Urbano Tavares Rodrigues ao Ensino Magazine, nº 10, Dezembro 1998, p. 2.

5. Augusto Abelaira dizia que «o grande romance, hoje, é escrito pelos grandes cineastas» (intervenção no clube de leitura “Sei Apenas Soletrar”, 28/06/2003).

6. Entrevista de Mário Ventura ao DN, 19/08/2001, p. 38.

7. Entrevista de Damon Galgut ao Ípsilon, 07/01/2022, p. 5.

8. Entrevista de Teolinda Gersão ao Ensino Magazine, nº 14, Abril 1999, p. 15.

9. “The Art of Teaching”, Update: Boston University School of Education Newsletter, Fall, 2002, p. 3.

 

Referências

AUGÉ, Marc (1992) Não-lugares: Introdução a uma Antropologia da Sobremodernidade. Venda Nova: Bertrand Editora, 1994.

BALZAC, Honoré de (1829) A Comédia Humana. Porto Civilização, 1978.

DACOSTA, Fernando (2001) Nascido no Estado Novo. Lisboa: Editorial Notícias/ Obras de F.D.

MORIN, Edgar (1998) “Rumo a um novo contrato social?”. Fontes UNESCO, nº 106, Novembro.

SARAMAGO, José (1971) Deste Mundo e do Outro. Lisboa: Editorial Caminho/ O Campo da Palavra, 3ª edição, 1985.

SARAMAGO, José (1984) O Ano da Morte de Ricardo Reis. Lisboa: Editorial Caminho/ O Campo da Palavra, 4ª edição.

quinta-feira, 18 de agosto de 2022

Regina Correia lê «Desadormecer», de Paulo Landeck


Regina Correia lê "Desadormecer", de Paulo Landeck. Aventureiro de terra e mar, tendo viajado pelos oceanos e pelas sete partidas, estudando as aves e os macacos nus que, segundo Desmond Morris, nós somos, Paulo Landeck parece fazer jus ao nome, ou não lembrará terra aquele "Land..." e o convés de um navio aquele "...Deck"?

Há momentos de partir, há momentos de pensar em partir, há momentos de observar. Abre-se a janela do mundo para se ver o mundo numa rua. Mas está frio, e o coração arrefece, ali, no Everest glacial. Há tanto para fazer, tanto que desadormecer. Até o carro hesita em partir, engasgado, aquecendo com esforço para se fazer ao frio que lhe pede para ficar. Depois, finalmente, desaparece, e leva o mundo inteiro consigo, atirando no fumo do escape a pertinácia da solidão.

João Nuno Azambuja

Ver Aqui: https://fb.watch/e_4mFlGtMC/ (pode aceder na coluna direita do blogue)


terça-feira, 16 de agosto de 2022

À Janela

 


Simplesmente uma janela com paisagem a tremer de calor, mas o rigor da geometria geralmente causa-nos boa impressão.

Luís Santos