terça-feira, 18 de dezembro de 2018

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Fim de tarde amarelo, a luz amarelada que fez as andorinhas acoitarem-se nos ninhos e os sons dos trovões, ao longe, remetendo-nos para a tranquilidade do lar adornado pelas alegrias dos King Crimson na aparelhagem de som. 



A Matilde entrou definitivamente na fase da leitura. É vulgar vê-la soletrar palavras por tudo quanto é sítio, desde os rótulos a livros e jornais, com aquele seu ar sorridente mas concentrado, como se estivesse perante uma avaliação qualquer. 

“-Ba… lá… da. A balada. Dó. Do. Mar. Sal… gá… dó… Salgado. A balada do mar salgado..” –Deitada no chão da sala, olhos postos na capa do livro de Hugo Pratt. 

Eu que parara à entrada para gozar o momento, mal a leitura foi concluída, aplaudi e ajoelhei-me para a beijar nos cabelinhos, ao mesmo tempo que dizia, cheio de orgulho, é bom de ver: “-Palmas para a Matilde!” 
E acrescentei: 
“-Ena pá! Agora já toda a família sabe ler.” –Enquanto regressei à postura bípede. 
Boquinha rasgada, inclinou a cabeça e retorquiu de imediato. 
“-Ó pai, mas há uma que é só assim assim.” 

E eu ri-me de contentamento. O abraço que lhe dei fez-lhe ver que vai muito bem para o que está dando os primeiros passos. 



Fico siderado pelo elevado número de pessoas que não nutre qualquer respeito pela ideia democrática e a democracia enquanto sistema de organização política e social. 
Mas a verdade é que pelas reacções que vamos observando ao problema iraquiano e ao conflito israelo-palestiniano, damos conta que muito do anti-americanismo subjacente às críticas às operações militares dos aliados naquele país, tem como pano de fundo uma mundivisão que não se coaduna com os princípios das ideias e comportamentos democráticos, chegando em muitos casos à incompatibilidade com aqueles. 
Tal é patente, por exemplo, não só quando se aceita que o terrorismo tenha causa nos factores internos das sociedades abertas do ocidente, ou quando se igualiza este universo ao mundo totalitário de que aquele é oriundo e que pretende ordenar. 
No primeiro caso estamos a justificar a razoabilidade dos ataques que aquele faz às democracias ocidentais o que, se atendermos a que os objectivos propalados têm a finalidade última da destruição pura e simples daquelas, é escolher objectivamente o lado contrário e inimigo do nosso modo de vida. No segundo desqualificamos as nossas pretensões e consideramo-las ao nível daqueles para quem a vida humana nada mais vale que o sacrifício de um holocausto. 
Naturalmente, isto acaba por pôr em questão não só a intervenção militar, nem também apenas os Estados Unidos da América ou o Reino Unido, mas sobretudo e em primeiríssimo lugar a ideia de democracia em si. 

Como se chegou aqui não sei, é assunto que requer uma reflexão profunda que, no entanto, me parece necessária. 
Que estamos num caminho perigoso, não tenho a menor dúvida. 


Espanta-me, isso não sou capaz de evitar, como gente simples que vive do seu trabalho vai atrás destas lengalengas. Até parece que são aristocratas. Distraídos, no mínimo, é o que são, a não ser que tenham mesmo uma predilecção pelas ditaduras ou por qualquer forma de despotismo esclarecido. Talvez preferissem viver numa espécie de feudalismo, serem proibidos de caçarem lebres que seriam propriedade de um qualquer senhor, a quem teriam que pagar tributo e que, nos dias coevos, muito provavelmente teria o aspecto de um Al Capone com punhos de renda. 

Será que as pessoas não se dão conta que é esta a alternativa para a civilização democrática que se vive no Ocidente? Ou ainda restará dúvidas a alguém que mesmo uma qualquer solução de uma sociedade mais justa e socialista, jamais poderá deixar de se expressar na forma da democracia? Pelo menos por enquanto, não conhecemos uma forma melhor de controlar o exercício do poder em sociedade. E poderíamos desde já, assim de um momento para o outro, abdicar do poder de estado? Não me parece. 



Hoje, os alunos, para além das aulas de moral e de música, esta última em que aprenderam novas canções, fizeram exercício com números e a nova palavra dada. 



Começou o congresso do PSD. 
Já sabemos como vai acabar. Todos serão unânimes em aplaudir o líder e dirão que o governo está bem e a trabalhar melhor e que, por causa disso, o país vai no bom caminho, na demanda da retoma económica e da recuperação do atraso relativamente aos países mais ricos da União Europeia. 
Santana Lopes lá terá o protagonismo que a sua obra e capacidades não subscrevem e por fim todos irão contentes para casa, os instalados com a garantia de que as prebendas não secarão nos tempos mais próximos. 

Em Julho, provavelmente perderão as europeias mas todos já sabem que um partido que está no poder e vai a votos a meio do exercício do mandato, sempre tem muitas probabilidades de ver o desgaste governativo inflacionar-lhe significativamente o número de eleitores. 



Ainda não decidi a quem oferecer o meu voto nessas eleições, mas no bloco central não será, com toda a certeza. 

Querem ver que vou votar no PCP? 


 Alhos Vedros 
  21/05/2004

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