domingo, 27 de julho de 2014


27 / 2014


Foto: Edgar Cantante


O ESTADO DO TEMPO – III


O mar, o rebentar das ondas, a areia e o vento.
A presença dos amigos, física ou recordada e assim sentida, a fotografia na parede e a magnólia que se agita como se apenas estremecesse.
A magnólia não está sozinha.
Bem de perto um ácer observa-a atento e, de cima do pequeno montículo que mais parece um soluço da terra, uma oliva com vários ramos disso faz registo como que cronicando.
A música que incessantemente se compõe e as ideias que nos vão nascendo e que depois fazem o seu caminho. Naturalmente, construindo e habitando a calma que aqui mora.
Por vezes o registo agita-se porque as ideias andam soltas e em todas as direcções.


Foto: Edgar Cantante

Pois é.
É assim mesmo.
Como tornar a acalmia inexpugnável se…
Bem, já sabíamos do desemprego e do corte dos salários, dos ataques à saúde e escola públicas, do aviltar de quem trabalha, do contrato social violado e ultrajado a todos os níveis, das corrupções repetidas e continuadas de bancos e banqueiros.
Já sabíamos sim. Mesmo para os mais distraídos tanta reincidência acabou por os confrontar.
Retorna-se por vezes à calma mas, a agitação repete-se.
Aturdidos, estupefactos e indignados deparamo-nos com o genocídio de um Povo perante a complacência e o silêncio das instâncias internacionais de onde se esperavam atitudes firmes e eficazes para parar o massacre.
E a Justiça? A Justiça toma-se aqui por despropositada.
É um tempo da força pela força. Os mais “fortes” batem, os mais “fracos” são batidos.
Os David só batem os Golias por acidente ou excepção.
E o mundo continua a girar, sempre ou até algum dos poderosos o mandar parar ou implodir.
Entretanto, por cá, deparamo-nos com a criação de mais um D. Sebastião.
Muitos se afadigam, outros colaboram e, mesmo perante o alheamento ou indiferença duns outros, todos os dias se acrescentam mais uns detalhes à maquilhagem. Também há os que estão contra. Uns porque dizem que já chegaram à “Terra Prometida”, outros (poucos) porque dizem não acreditar em novos Sebastiões
A gente regista, tenta até alhear-se mas o lastro acumula-se. Condiciona e influi no movimento das ideias, no estado de espiríto, nas expectativas de futuro.

*

Os amigos chamam lá de fora. O Sol brilha.
Uma fala do neto recém-nascido e, naturalmente, manifesta felicidade. Outro partilha a mensagem da filha em viagem pelos Açores interrompendo o discorrer preocupado sobre a incerteza do salário no final do mês.
Lá está o fluxo a repetir-se.
Lá fora, o Sol brilha.
Cá dentro, ameaça de tempestade a todo o momento.


Foto: Joana Croca

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