sábado, 19 de agosto de 2017

Inula Marítima



Revestiu-se de grande sucesso o 1º Festisal, certame organizado pela Fundação das Salinas do Samouco no passado mês de julho. Participaram entusiasticamente cerca de seis centenas de pessoas de todas as idades. A iniciativa, plenamente integrada na filosofia eco ambiental, visou, entre outros objetivos, sensibilizar a população para o potencial educativo, científico e lúdico contido num espaço de quase 400 hectares que ficou denominado Salinas do Samouco, embora mais de 80% do território se situe na freguesia de Alcochete. A Festisal englobou um leque diversificado de atividades: rapação de sal, recriações históricas, artesanato, venda de produtos regionais, observação de aves, gastronomia, fornos solares, projeção de filmes, exposições, palestras temáticas, etc.
Neste âmbito, despertou enorme interesse o “showcooking” dirigido pelo “Chef” António Sequeira com demonstrações culinárias e respetivas degustações (talvez o mais cativante para quem busca experiências de novos sabores) efetuadas com plantas halófitas das salinas. A este escriba foi solicitado que, na véspera, colhesse folhas de salgadeiras, salicórnias, sarcocórnias, gramatas e inulas, o que foi efetuado com prazer para que tudo corresse a contento. Refira-se que as citadas plantas são todas elas edíveis, embora ainda não estejam integradas na gastronomia portuguesa tradicional. Apenas a salicórnia começa agora a ser popularizada como produto “gourmet” (Ver alusão no meu livro “Plantas para Curar e para Comer”).
Aproveitamos a ocasião para investigar sobre as propriedades gustativas da inula com que o “Chef” preparou um acepipe de camarinhas (pequenos camarões). A inula marítima, para além de ser uma planta salgada, tem sabor forte e característico o que confere identidade própria a qualquer prato.
Há várias plantas designadas por inula, mas falo-vos da Inula crithmoides, de seu nome científico, espécie da aristocrática família das compostas ou Asteraceae. Trata-se de uma planta perene, simples, glabra, ramosa e ascendente que pode atingir 8 dm de altura. As suas folhas são carnudas, estreitas, quase lineares, sésseis e alternas. Os caules são lenhosos e um pouco torcidos na base. As flores, agrupadas em capítulos, apresentam-se de amarelo dourado com pétalas estreitas e brácteas imbricadas em várias filas. São hermafroditas e surgem de maio a setembro. As sementes, de 2 a 3 mm, formam aquénios angulosos hirsutos e pubescentes.
A inula não suporta a sombra, adorando o calor. Prefere solos ligeiramente ácidos, formando tufos e pode ser encontrada em orlas de sapais, muros de salinas, esteiros e mesmo em esporões rochosos e arribas litorais, como recentemente vimos em Peniche, a caminho do Cabo Carvoeiro. 
Dos compêndios consultados apenas encontrámos menção da Inula crithmoides em “Elementos da Flora Aromática” de Aloísio Fernandes Costa, edição de 1975 da Junta de Investigações Científicas do Ultramar, referindo que “por destilação das folhas se separa uma essência da qual predominam, particularmente, hidrocarbonetos”. A mesma obra regista ainda outras duas inulas com essências, nomeadamente a viscosa e a graveolens.
No entanto, a inula mais consagrada como planta medicinal, descrita em variados livros de fitoterapia, é a Inula helenium de que se aproveita a raiz. Trata-se de uma erva de folha larga, bem mais alta do que a crithmoides e tem aplicações no tratamento de bronquites, tosses e problemas estomacais.
Quanto à nossa inula marítima há a destacar, para além das suas essências ainda não devidamente estudadas, o teor em cloreto de sódio e quiçá em cloreto de potássio, sendo portanto ideal para temperos em substituição do sal-das-cozinhas e, desta forma, aconselhada para quem sofre de hipertensão. As folhas jovens podem ser consumidas cruas, cozidas, em picles e como condimento.
Avançando nas minhas experimentações, procedi à secagem da planta em forno solar e pulverizei as respetivas folhas que casam bem com saladas e cozinhados. E eis assim como se pode aproveitar mais um recurso disponível e gratuito (por enquanto) no nosso País, cuja utilização enriquece os preparados culinários e beneficia a nossa saúde.

Miguel Boieiro

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