Capsella bursa-pastoris
Miguel Boieiro
Nunca será demais repetir que é
altamente inconveniente colher plantas selvagens junto das vias rodoviárias.
Está provado que as plantas assimilam e incorporam substâncias tóxicas
provenientes da combustão dos motores dos veículos. De resto, a constituição
química de qualquer vegetal depende muito das condições onde se desenvolve. Tem
a ver com a constituição química e o pH do solo, com o clima, sobretudo com a
insolação, a humidade, os ventos e a temperatura e ainda com a poluição
envolvente.
Outro dos perigos, infelizmente
hoje em dia muito comum, é apanhar plantas em áreas que foram tratados com herbicidas.
Isso acontece amiúde nos meios urbanos e suas periferias. Instalou-se a ideia
errada de que a existência de ervas é sinal de sujidade e de desleixo e então,
pulveriza-se, indiscriminadamente o solo com produtos venenosos, numa prática
rotineira de “aprendiz de feiticeiro”. É claro que não só se arruína a vida
vegetal, mas também se dissemina na atmosfera e nos terrenos, quantidades incontroladas
de tóxicos com nefastos efeitos duradouros em todos os seres vivos.
Vem esta conversa a propósito da
bolsa-de-pastor, erva comum que aparece junto de estradas, caminhos de pé
posto, baldios e mesmo nas calçadas e arruamentos das grandes cidades. Ela é
extraordinariamente prolífera – uma só planta pode produzir 75 mil sementes,
apesar de, pela sua fragilidade, não a considerarmos propriamente uma
infestante. O facto é que o ingrato bicho-homem procura destruir este ser vivo,
seu companheiro de jornada, como se de um inimigo se tratasse, através do uso e
abuso de pesticidas.
Ora a Capsella bursa-pastoris L. é uma pequena erva anual de que só se dá
conta quando brota o seu espigão floral. A raiz é cilíndrica e ligeiramente
lenhosa e as folhas radicais formam uma roseta basal, sendo normalmente
penatifendidas e pecioladas. O caule chega a medir 50 cm , tendo folhas mais
curtas (folhas caulinares) e no cimo cachos densos de pequenas flores brancas.
Cada flor é composta por quatro sépalas e quatro pétalas ovais. A sua forma, em
cruz, determinou a família botânica a que pertence a nossa planta. É uma crucífera, ou brassicácea, tal como a couve, o nabo ou a mostarda negra.
Mas é a forma dos frutos que ajuda
a identificar a erva e a torna inconfundível. Eles são cordiformes, isto é, têm
a forma de um pequeno coração, assemelhando-se às bolsas que os pastores
medievais traziam a tiracolo – daí o seu idêntico nome popular em, praticamente,
todas as línguas europeias.
Para que serve a bolsa-de-pastor?
Bom, as propriedades curativas desta planta são conhecidas desde remotas eras.
É fundamentalmente hemostática, estancando rapidamente as hemorragias, mas é
também adstringente, diurética e tónica. Contém tanino, potássio, ácido málico,
ácido acético, ácido fumárico e ácido cítrico, entre outros componentes.
Serve para as hemorragias
(nomeadamente as uterinas), as perturbações renais ou urinárias, as
desinterias, as inflamações da garganta e as feridas da pele.
A melhor forma de a consumir é
através da maceração a frio, na proporção de três colheres de chá da erva seca
para uma chávena de água. Deixa-se macerar durante oito horas, filtra-se e
toma-se duas chávenas, dia sim, dia não.
O Dr. Oliveira Feijão, na sua
“Medicina pelas Plantas”, aponta também o infuso, o suco da planta fresca, o
cozimento e o “vinho”. Este é produzido por 180 g da planta fresca migada,
macerada durante oito dias num litro de vinho branco. Filtra-se e toma-se uma
colher de sopa, de hora a hora.
Para terminar, refira-se que a
bolsa-de-pastor, tal como as suas irmãs crucíferas, é também comestível (tem um
sabor levemente salgado), mas apenas quando as folhas estão tenras e antes da
ramificação.
Adverte-se, contudo, para o facto
das doses elevadas serem susceptíveis de produzir efeitos tóxicos, devido à
existência, embora em pequena proporção, de um alcalóide específico denominado bursina.
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