quinta-feira, 21 de maio de 2015

Bolsa-de-pastor


Capsella bursa-pastoris

Miguel Boieiro

Nunca será demais repetir que é altamente inconveniente colher plantas selvagens junto das vias rodoviárias. Está provado que as plantas assimilam e incorporam substâncias tóxicas provenientes da combustão dos motores dos veículos. De resto, a constituição química de qualquer vegetal depende muito das condições onde se desenvolve. Tem a ver com a constituição química e o pH do solo, com o clima, sobretudo com a insolação, a humidade, os ventos e a temperatura e ainda com a poluição envolvente.
Outro dos perigos, infelizmente hoje em dia muito comum, é apanhar plantas em áreas que foram tratados com herbicidas. Isso acontece amiúde nos meios urbanos e suas periferias. Instalou-se a ideia errada de que a existência de ervas é sinal de sujidade e de desleixo e então, pulveriza-se, indiscriminadamente o solo com produtos venenosos, numa prática rotineira de “aprendiz de feiticeiro”. É claro que não só se arruína a vida vegetal, mas também se dissemina na atmosfera e nos terrenos, quantidades incontroladas de tóxicos com nefastos efeitos duradouros em todos os seres vivos.

Vem esta conversa a propósito da bolsa-de-pastor, erva comum que aparece junto de estradas, caminhos de pé posto, baldios e mesmo nas calçadas e arruamentos das grandes cidades. Ela é extraordinariamente prolífera – uma só planta pode produzir 75 mil sementes, apesar de, pela sua fragilidade, não a considerarmos propriamente uma infestante. O facto é que o ingrato bicho-homem procura destruir este ser vivo, seu companheiro de jornada, como se de um inimigo se tratasse, através do uso e abuso de pesticidas.

Ora a Capsella bursa-pastoris L. é uma pequena erva anual de que só se dá conta quando brota o seu espigão floral. A raiz é cilíndrica e ligeiramente lenhosa e as folhas radicais formam uma roseta basal, sendo normalmente penatifendidas e pecioladas. O caule chega a medir 50 cm, tendo folhas mais curtas (folhas caulinares) e no cimo cachos densos de pequenas flores brancas. Cada flor é composta por quatro sépalas e quatro pétalas ovais. A sua forma, em cruz, determinou a família botânica a que pertence a nossa planta. É uma crucífera, ou brassicácea, tal como a couve, o nabo ou a mostarda negra.
Mas é a forma dos frutos que ajuda a identificar a erva e a torna inconfundível. Eles são cordiformes, isto é, têm a forma de um pequeno coração, assemelhando-se às bolsas que os pastores medievais traziam a tiracolo – daí o seu idêntico nome popular em, praticamente, todas as línguas europeias.

Para que serve a bolsa-de-pastor? Bom, as propriedades curativas desta planta são conhecidas desde remotas eras. É fundamentalmente hemostática, estancando rapidamente as hemorragias, mas é também adstringente, diurética e tónica. Contém tanino, potássio, ácido málico, ácido acético, ácido fumárico e ácido cítrico, entre outros componentes.
Serve para as hemorragias (nomeadamente as uterinas), as perturbações renais ou urinárias, as desinterias, as inflamações da garganta e as feridas da pele.

A melhor forma de a consumir é através da maceração a frio, na proporção de três colheres de chá da erva seca para uma chávena de água. Deixa-se macerar durante oito horas, filtra-se e toma-se duas chávenas, dia sim, dia não.
O Dr. Oliveira Feijão, na sua “Medicina pelas Plantas”, aponta também o infuso, o suco da planta fresca, o cozimento e o “vinho”. Este é produzido por 180 g da planta fresca migada, macerada durante oito dias num litro de vinho branco. Filtra-se e toma-se uma colher de sopa, de hora a hora.
Para terminar, refira-se que a bolsa-de-pastor, tal como as suas irmãs crucíferas, é também comestível (tem um sabor levemente salgado), mas apenas quando as folhas estão tenras e antes da ramificação.

Adverte-se, contudo, para o facto das doses elevadas serem susceptíveis de produzir efeitos tóxicos, devido à existência, embora em pequena proporção, de um alcalóide específico denominado bursina.


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