Risoleta Pinto Pedro
Entre F(r)estas
Ainda agora se despediram os Reis Magos e já tenho saudades de quando aguardava a sua vinda. Nunca gostei de despedidas, por isso tardo em guardá-los na caixa onde vão dormir até Dezembro.
Há quem diga que não eram reis, mas magos, outros nem uma coisa nem outra, e há, até, quem negue a sua existência, o que é difícil de acreditar após um convívio de tantos anos. A questão não me tira o sono, conheço-os muito bem; não tenho propriamente crenças, mas ninguém me venha dizer que o Menino Jesus e os Reis Magos não existem. É algo que eu sei para além da ciência que não conheço, para além da crença que não tenho.
Ao Menino, continuo a vê-lo em cada criança que nasce, e todos sabemos como estes meninos trazem já uma “tecnologia” muito diferente das gerações anteriores, mais próxima do de Belém, nascido muito à frente, completamente anacrónico ao seu tempo (e ao nosso?). Quantos séculos tivemos (teremos?) de galgar para lhe chegarmos aos calcanhares…
Na antiga cozinha da menina, onde na noite de Natal mãe e pai confeccionavam as azevias, conviviam ecumenicamente: uma espécie de paganismo místico de rosto eventualmente cristão pelo ramo do meu pai, e um ateísmo social solidário pelo ramo da minha mãe, qual mais nobre e respeitável que o outro, deixando-me estas duas posições em liberdade para, sem saber sem ter sido ensinada, e sem saber que o fazia, adorar sozinha, frente à intimidade do presépio, enquanto as azevias se faziam, e para sempre, o Menino Po-ético Futuro e Universal.
(Pintura: "Adoração dos Magos", Sequeira; MNAA)
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