por Miguel Boieiro
Em cada estação do ano a vetusta Sociedade Portuguesa de
Naturalogia, considerada uma das mais antigas associações ambientais existentes
no nosso País, organiza um almoço de convívio para os seus sócios e amigos. Na
elaboração das ementas vegetarianas a SPN procura inovar e introduzir novidades
gastronómicas para atrair os comensais e divulgar bons princípios da
alimentação saudável. A bebida que acompanha as refeições é geralmente o suco
de cenoura que os participantes sedentos, sobretudo no almoço de verão, esgotam
num ápice. Para obviar aos inconvenientes, alguém teve a peregrina ideia de
servir antes do sumo da cenoura, água aromatizada com folhas de
hortelã-pimenta. A iniciativa foi excelente e resultou com agrado geral. Assim
nasceu mais uma útil aplicação para esta versátil erva aromática.
A Menta x piperita
é uma Lamiácea híbrida que resulta do
cruzamento entre a Menta aquatica
(hortelã-mourisca) e a Menta spicata
(hortelã-vulgar). Todavia, para complicar, alguns botânicos referem que a
hibridação é tripla, juntando-lhe também a Menta
suaveolens, conhecida popularmente como mentrasto ou hortelã-de-burro. De
resto, sublinhe-se que existem inúmeros cruzamentos entre as diferentes mentas,
o que dificulta a sua rigorosa identificação. O sinal de multiplicação “X” foi
a regra escolhida pelos cientistas da nomenclatura botânica para indicar que a planta
é híbrida e que, consequentemente, a sua reprodução não se efetua por semente
mas sim por via vegetativa (rebentos subterrâneos).
O que interessa verdadeiramente é que todas as subespécies de
hortelã-pimenta, das cerca de três dezenas que se encontram caracterizadas, têm
sensivelmente as mesmas propriedades aromáticas, medicinais, condimentares e
ornamentais.
Trata-se de uma herbácea perene com raízes subterrâneas
ramificadas. As folhas são opostas, peninérveas, lanceoladas ou ovadas,
pecioladas e ligeiramente dentadas. Os caules, de cor arroxeada, apresentam-se
canelados e podem atingir 60 cm de altura, culminando em flores violetas
agrupadas em espiga. Os frutos (tetraquénios), com sementes estéreis, raramente
aparecem.
A maior parte dos livros de fitoterapia mencionam a
hortelã-pimenta. Veja-se, por exemplo, o que diz o antigo Manual de Medicina
Doméstica do Dr. Samuel Maia que a designa de Mentha officinalis: “ dela se extrai o mentol, de largo uso e muito
apreciado como antisséptico do nariz, faringe, laringe, etc.. Internamente
usa-se como aperitivo. Aproveitam-se as sumidades floridas com as folhas
próximas que se cortam de agosto a setembro e a seguir se secam em tabuleiros
de asseio rigoroso”. Eis o infuso recomendado: “10 g de sumidades secas num
litro de água fervente. Infusa meia hora. Serve para gargarejos, inalações,
lavagens das fossas nasais, corisas, rinites, faringites, rouquidão, ozena,
sinusites”.
Análises químicas revelam que a hortelã-pimenta possui
taninos, flavonóides, algumas substâncias amargas e sobretudo muitos óleos
essências em que se sobrepõe o mentol.
Como propriedades medicinais são apontadas as seguintes:
digestiva, carminativa, colerética, antissética, afrodisíaca, tonificante,
analgésica, excitante, colagoga, estomáquica, vasodilatadora, descongestionadora
nasal, etc.
Com tantas propriedades não admira a sua recomendação para
múltiplos transtornos: falta de apetite, aerofagias, diarreias, cãibras,
cefaleias, catarros, infeções bocais, herpes, cólon irritável, refluxo gastro
esofágico, gastrite, vómitos, doença de crohn, pé-de-atleta, …
Pessoalmente, prefiro utilizar as folhas e as sumidades da
planta fresca porque tenho a possibilidades de as colher nos sítios e épocas
certas. Para quem não dispõe dessa possibilidade aconselha-se especiais
cuidados: colher as folhas que não tenham ferrugem e submetê-las a uma corrente
de ar quente e seco que não exceda a temperatura de 25 graus, guardando-as,
depois de secas, em frascos escuros ao abrigo do ar e da luz.
Há imensas preparações fitoterapêuticas. Citemos apenas
algumas:
- Infuso da planta fresca (30 g num litro de água – bebida
tónica e refrescante).
- Licor (macerar durante 2 semanas 30 g das folhas num litro
de álcool a 60º, coar, dissolver 250 g de açúcar de preferência mascavado).
- Pedilúvio (banho de pés em infusão da planta – muito
aconselhável para quem sofre de pé-de-atleta).
- “Chá” (deitar duas colherinhas da planta seca numa chávena
de água a ferver e deixar macerar durante 10 minutos).
- Álcool mentolado (dissolver a essência em álcool para
fricções – para aliviar nevralgias, dores musculares e reumáticas).
- Mastigação de folhas frescas para eliminar a halitose.
- Compressas a fim de aliviar as dores de cabeça e as
cãibras.
Para terminar, refira-se ainda que a hortelã-pimenta é também
utilizada no fabrico de detergentes, cosméticos e pastas dentífricas.
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