sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Livros d'África



JOAQUIM JOSÉ DURO

Quem, um dia, tenha pisado terra angolana fica preso. Não se sabe bem se por feitiço ou se por beber água do Bengo…
Foi o que aconteceu ao autor de “ANGOLA NO CORAÇÃO DE UM MINHOTO”, livro de memórias patrocinado e editado pela Câmara Municipal de Cerveira em 2004.
Joaquim José Duro nasceu em Vila Nova de Cerveira, Minho, em 1919 e, por dificuldades causadas pela morte do pai, partiu para Angola em 1937. À chegada a Luanda tinha um primo a recebe-lo: J. M. Cerqueira de Azevedo (autor do romance histórico “Jinga – Rainha de Matamba”).
Iniciou a vida profissional como aspirante do Governo Civil do Seles, foi depois funcionário do Banco de Angola em Silva Porto (Kuito, Bié) onde viria a casar e, mais tarde, foi Chefe de Posto em várias localidades: Ambuíva, Andulo, Cameia, Dala Cachibo, Calulo, Camabatela, Balombo, Benguela, Ambrizete (onde acompanhou os acontecimentos trágicos de 1961) e Baía Farta, para além de Luanda, onde exerceu diversos cargos, intermitentemente. Trabalhou também na Algodoeira Agrícola de Angola.

Com todo este corrupio, sempre “de casa às costas”, foi aprendendo a conhecer Angola, que amou (e ama) como uma segunda Pátria, espantando-se com as singularidades do povo e apercebendo-se aos poucos do enorme espaço e dos largos horizontes: “Curiosamente, o Carlos Mendes Martins foi colocado no Posto do Quissongo, também do meu Concelho; ficámos separados pela pequena distância de 120 Km, o que permitiu que nos visitássemos com frequência.”

A pequena distância de 120 Km!… 
Privou de perto com as mais variadas personagens, algumas das quais, anos mais tarde, se viriam a tornar sobejamente conhecidas.
Por exemplo, um poeta em Vila Nova de Seles: “Havia duas pessoas da cidade de Novo Redondo que nunca faltavam aos bailes de Vila Nova de Seles: o gerente do Banco de Angola, Edmundo Marques e o ajudante da farmácia dos serviços de saúde, Tomás Vieira da Cruz. (…) por brincadeira fazíamos poemas ao desafio. Mas, Vieira da Cruz, sempre nos surpreendia com a sua veia poética. (…) Num desses serões escreveu o belo soneto, que mais tarde em concurso realizado em Lisboa, o consagrou Príncipe dos poetas portugueses. Começava assim esse lindo soneto:
Batem palmas, as palmas das palmeiras…

Ou, noutra ocasião, um pintor na Quibala: “(…) Seguimos depois para o posto administrativo da Sanga, onde o Aníbal desejava ver umas lavras de algodão e acabámos por dormir na casa do Chefe do Posto, Neves e Sousa. (…) como não tinha visto ainda o filho do casal, perguntou por ele, e a mãe informou que devia estar a acabar o seu último desenho. Era um rapaz, talvez de uns oito anos. (…) sem dúvida um artista e de tal maneira que, passados alguns anos, deu lugar ao grande pintor angolano Neves e Sousa.”

Regressou a Portugal em 1974. Os filhos ficaram em Angola, por considerar como sua aquela terra, visto lá terem nascido. Mas, com o agravamento da situação, um a um, vieram juntar-se aos pais. O último, vítima de um tiro na barriga alegadamente acidental, desembarcou em Portugal com apenas 30 quilos de peso…
Fica aqui por descrever a imensa saudade do autor pelas gentes e terras angolanas, um sentimento comum a todos os que de lá partiram, daquela África “de onde nunca se regressa”...


Tomás Lima Coelho

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