quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

d´Arte – Conversas na Galeria XIX


Malangatana
Quando estava a preparar a minha exposição “d´arte”, tive notícia da morte de Malangatana. Não podia ficar indiferente. Admiro o pintor, tive o privilégio de o conhecer e ficar seu admirador e amigo.
Tenho para mim que a melhor maneira, talvez a única, de homenagear um artista é apreciar a sua obra. Por isso, aconselho vivamente quem me lê, a ver ou rever, algumas das suas pinturas ou esculturas. Malangatana era, é, um dos mais prestigiados pintores mundiais da actualidade, que com a sua morte deixou mais pobre o mundo lusófono. Na Casa da Cerca, em Almada, está patente uma exposição de obras do artista.
Muito novo, foi preso pela PIDE, juntamente com outros “perigosos” elementos, como, por exemplo, José Craveirinha, por pertencerem à “organização terrorista FRELIMO”. Saliento este facto da sua vida porque dentro da grandeza do seu coração não cabia o ressentimento e muito menos o ódio. Era Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, foi galardoado pela Unesco, pela Holanda, na confirmação do seu princípio que a cultura não tem fronteiras e deve ser encarada com dignidade por todas as raças.
Como ele dizia, a cultura é mulata.

2 comentários:

Luís F. de A. Gomes disse...

Certeiras palavras para homenagear um grande da arte mundial na medida em que na sua vastíssima obra -e que eu não desconheço seguramente na larguíssima maioria- foi uma das almas de uma pintura de raiz africana sem que por isso tenha deixado de lhe incorporar o legado de outras tradições culturais e, nessa medida, as linguagens descobertas e desenvolvidas por pintores de outras latitudes, mormente os deste lado ocidental do mundo.

Desconhecia esse dado que referiste da sua prisão pela PIDE de má memória, mas do que sabia dele era o bastante por o ter como um homem digno, antes de tudo, pois viveu a situação colonial em que se formou e fez artista plástico e tendo começado por ser reconhecido ainda durante esse tempo, sempre foi capaz de manter o primado do apelo pela arte sem se deixar enfeudar a poderes que o poderiam usar como bandeira e isto mesmo depois da independência daquele país do Índico e, não é menos importante de sublinhar, ao mesmo tempo sendo capaz de, pela obra que foi produzindo, fazer escutar a(s) voz(es) daqueles que as contingências foram relegando para os pisos mais baixos do(s) edifício(s) cultura(is)l com que a Humanidade tem feito o percurso neste nosso planeta tão bonito.
Malangatana era um darteador e tenho a certeza que um dia destes ainda dará por si a pensar a respeito deste espaço que animas, "-Olha como ali se darteia bem."
Também é no dartear que está o avanço da nossa humanidade.

Agora deveremos fazer sentir aos amigos moçambicanos que importa preservar e divulgar aquela magnífica obra, através de Museus, pois claro, mas sobretudo com estudos nas Academias e conversas inteligentes nos mais diversos locais em que este género de temáticas fica ao alcance das populações.
Contudo e sem com isto querer retirar qualquer dose de primado à sua terra natal, mas até por no seu íntima estar certamente uma parcelazita lusitana, pela grandeza do homem, pela importância do pintor, não nos ficaria mal se por cá houvesse algum núcleo da museugrafia que lhe é devida, especialmente por todos aqueles que acreditam que a cultura humana é, pela sua própria natureza, mestiça.

Junto-me a ti neste bem-haja ao pintor, por tudo o que nos deixou.

Aquele abraço, companheiro

Luís

A.Tapadinhas disse...

Luís: Admiro sinceramente quem sabe perdoar. Nelson Mandela, um dos maiores líderes da humanidade, foi libertado da Prisão de Victor Verster, onde ficou durante 27 anos, devido à sua ideologia contrária à política racista do apartheid; recentemente,
Cornelius Dupree Jr., de 51 anos, preso durante 30 anos viu a sua pena anulada, no Texas, depois de um teste de ADN confirmar que estava inocente da acusação de roubo e violação... Estes e outros que poderiam ser citados fizeram como Jesus, dizendo: Perdoai-lhes senhor... Não consigo imaginar-me numa situação destas!!!

Malangatana, não sofreu tanto, mas em contrapartida pintou mais...

Já somos dois a pensar que um museu mostrando a obra e o homem é o mínimo que poderia ser feito...

Aquele abraço,
António