quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

d´Arte - Conversas na Galeria XXV


A minha casa é um caleidoscópio Acrílico sobre tela 60x60cm

Esta obra, logo que a completei foi reservada pela minha filha Dulce para a sua colecção particular.
Foi concebida logo a seguir a um período de grande produtividade, devido a uma série de exposições muito próximas umas das outras a que me tinha comprometido.
Em cada exposição, faço questão de apresentar algumas peças feitas para o local e pessoas que o frequentam, o que me causou algum stress e resultou no compromisso comigo próprio de não deixar repetir a situação. Afinal, pintar é uma actividade que serve a beleza, e a beleza é um dos elementos necessários para tornar o mundo melhor. Também para mim...
Abro um parêntesis para uma explicação simplificada do significado de alguns termos que utilizarei na descrição da tela e que talvez sirvam para melhorar a sua compreensão. Desculpem-me os que já sabem estas coisas: são só meia dúzia de linhas...
Há três cores primárias: o azul, o magenta (vermelho) e o amarelo. São as que não se podem obter com a mistura de outras cores.
Combinando duas cores primárias, obtém-se uma cor secundária. Azul mais amarelo = verde, azul mais vermelho = violeta, amarelo mais vermelho = laranja.
Estas, por seu turno, são complementares da cor que não entra na sua composição. Assim, o laranja é complementar do azul, o verde é complementar do vermelho e o violeta complementar do amarelo. Conforme a lei do contraste, qualquer cor atinge a sua intensidade máxima quando está ao lado da sua complementar. Mas duas complementares misturadas, aniquilam-se: ficam cinzentas. Nas cores, como na vida, o céu e o inferno são vizinhos.
Nesta tela reduzi a paleta à expressão mais simples: vermelho, azul e amarelo, as cores primárias, mais branco e preto. Com estas cores, como já vimos, podem-se obter todas as outras. Nela é evidente a utilização da lei dos contrastes, para potenciar a intensidade das cores: ao lado dum azul lá está o laranja a espreitar, e o dinâmico vermelho não deixa o verde distanciar-se para longe...
Lembram-se que estava stressado e que queria limpar a cabeça de coisas complicadas, de problemas? Foi o exorcismo desses fantasmas que sempre habitam as casas, as ruas e vielas das cidades antigas, pintadas obsessivamente, que eu consegui com a pintura quase automática dos pequenos sinais que iam ficando gravados na minha mente e que eu plasmei na tela...

4 comentários:

luis santos disse...

Boa. Não nos devemos cansar de repetir que a vida é um caleidoscópio. A constância com que a multiplicação das cores se repete a cada momento e a infinita beleza que nos proporcionam é uma boa maneira de anular as partes mais cinzentas, mais tristes, das paisagens. E o cinzento também faz parte. É claro. Traz-me esta pintura ao pensamento o "Trem das Cores" do Caetano Veloso que podemos ouvir na sound box do Estudo Geral. Mas são tão bonitas as palavras que deixarei aqui de cor (e de cor) algumas delas:

A franja da encosta cor de laranja
capim rosa chá
o mel desses olhos luz mel de cor ímpar

o verde ainda não bem verde da serra
a prata do trém
a lua e a estrela
anel de turqueza
(...)

os átomos todos dançam, balançam,
reluz neblina
crianças cor de romã entram no vagão

e aquela de um quase azul inexistente, azul que não há
azul que é pura memória de algum lugar

teu cabelo preto
explícito objecto
castanhos lábios
ou para ser exacto lábios cor de (...)

e aqui trem das cores
sábios projectos
tocar no Central
e o ceu de uma zul celeste celestial

Luís F. de A. Gomes disse...

E assim lhes chamaria, luzes da cidade, ou o vitral que representa a cidade que foi o que me pareceu, mal olhei esta pintura que se me atirou como uma espécie de consagração da urbe, pela poesia da cor -e é disso que fala o comentário do Luís Carlos- que é um modo de acrescentar beleza ao quotidiano e assim acrescentar-lhe algo que o melhora, como dizes. E tenho para mim que perceber esta tua última ideia, é justamente um dos caminhos da liberdade dos homens pois a beleza não se conjuga com aquilo que possa contribuir para os diminuir, pelo contrário, apenas com que os possa elevar e com isso esta tua tela faz, para todos nós, uma cidade melhor, porque mais bonita.

Também é pois no dartear que está o ganho; de um mundo mais humano.

Aquele abraço, companheiro
Luís

A.Tapadinhas disse...

Luis Santos: Não me tinha apercebido da beleza do poema "Trem das Cores"...

A "culpa" posso endossá-la ao Caetano Veloso e ao balanço da sua música!

Eu vou apanhar esse trem!

Abraço,
António

A.Tapadinhas disse...

Luís Gomes: Acontece com muitos (alguns?) dos meus quadros, depois de os dar por concluidos, que fico a olhar para eles e vejo-os como uma tapeçaria, um painel de azulejos, ou um vitral...

...Para não falar dos outros que são o que são: uma pintura sobre tela, ponto final.

Este é realmente um vitral: a luminosidade das suas cores merecia ser afagada pelo sol...

Abraço,
António