quinta-feira, 7 de abril de 2011

d´Arte - Conversas na Galeria


Gonzos Autor António Tapadinhas
Óleo sobre Tela 100x100cm

Da viagem que descrevi ao cemitério, melhor, ao talho dos navios, porque lá se esquartejam os seus cadáveres, sobraram mais algumas fotografias que transformei em telas, sem grande êxito em termos de reconhecimento da sua qualidade artística ou outra, por exemplo, comercial: não vendi nenhuma! O interessante nesta, quando a estava a pintar, é que o sol entrou pela janela do meu estúdio, projectando a sombra dos caixilhos e fazendo clarões que me indignaram, ao princípio. Olhando melhor, gostei do que estava a ver e pintei os reflexos da minha janela nos pedaços de ferro corroído daquele navio. Não sei quem disse aquela coisa horrível de “se não puderes vencer os teus inimigos, junta-te a eles”, mas foi o que eu fiz! Só que, neste caso, o meu inimigo era o Sol!
Este inimigo, junto-o aos meus melhores amigos!

5 comentários:

Luís F. de A. Gomes disse...

É muito boa, esta tua série dedicada a pormenores em que o último repouso de barcos se oferece ao olhar. Insisto que faria uma exposição muitíssimo agradável e seguramente com interesse para quem gosta de se evadir pelas aventuras que as imagens podem deixar na mente.

Pessoalmente sempre gostei de barcos, sempre os vi enquanto sinónimo de liberdade, sempre lhes senti do passado o vento e por isso sempre os tomei como uma das melhores alegorias do mundo, quais casquinhas de noz no rebuliço tormentoso das paredes de água que abafam o céu e das montanhas encumeadas de espuma que sobem e descem, ameaçando abrirem-se a qualquer instante para engolirem essa fragilidade intrigante que é a vida que ao mesmo tempo é tão paradoxalmente resistente.

Justamente o fresco que mais me impressionou na literatura, a viagem do mais incrível herói de uma história, o Edmond Talbot, do Golding que entre Londres e Sidney, ao tempo em que Napoleão fugiu de Santa Helena e regressou ao trono e ao comando que haveria de perder em Waterloo, nos narra uma viagem que acaba por ser uma metáfora desta passagem que enquanto humanos fazemos neste planeta maravilhoso.

Pois é isso que estas tuas poesias, com os seus ângulos insuspeitados, nos convidam a fazer, a pensar na fragilidade do que parecia de uma robustez à prova de todo o infortúnio. Assim como Homem que tantas e tantas vezes se presume no topo de Babel, sem dar conta do quão insignificante é a invisiblidade da poeira em que se materializa no Cosmos.

Seria pois nestes barcos em que deveríamos voar neste ano de vinte e cinco primaveras da CACAV.

Aquele abraço, companheiro
Luís

A.Tapadinhas disse...

A alegoria que me ocorre depois de ler o final do teu texto é a da passarola do nosso padre voador e do seu retrato feito por Saramago no Memorial do Convento, que salienta a sua determinação em chegar onde só tinham subido Cristo, a Virgem e alguns santos eleitos.

Não me quero incluir, e suponho que tu também não, em tão ilustre companhia! Mas...

Para os sonhos se concretizarem muito pouco é preciso - e é tanto!

Para isso, é necessário transformar os pobres, para alguns, ricos para outros, pormenores dos barcos da minha tela, em barcarolas voadoras, onde todos os sonhos são possíveis, porque realizáveis...

E assim reescreveríamos (?) a história: no passado os barcos levavam os nossos sonhos, hoje, teremos de ser nós, com os nossos sonhos, a transportarmos os barcos... tendo presente que os sonhos até podem levar uma jangada de pedra...

Abraço,
António

luis santos disse...

Na ausência da esfera armilar fiquei com a sensação que a foto da Catarina se enquadrava bem no centro da pintura.

A.Tapadinhas disse...

Estiveste muito próximo de decifrar o segredo, a alegoria!

A esfera armmilar está lá: é o Sol!

Os gonzos servem para segurar o país, mantê-lo unido!

Os buracos que se vêem são o resultado das dentadas dos cães, lobos, ursos, vampiros e tubarões que, a pouco e pouco, nos vão deixando mais pobres...

Guardemos a Catarina para voos mais altos.

Abraço,
António

MJC disse...

O verde é escuro e carregado e a hipótese de saída, de ampliar o espaço que uma janela sempre possibilita, situa-se sobre o vermelho.
Sem querer obviar, parece-me contudo ...

Para além de tudo o mais que se possa entender acho-o um belo quadro. Quer dizer, eu gosto dele.

abraço,

mj