sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Livros d'África














RYSZARD KAPUSCINSKY  (1932, Pinsk – 2007, Varsóvia)

Nas últimas semanas que antecederam o 11 de Novembro de 1975, data da independência de Angola, este polaco era o único jornalista estrangeiro presente naquele futuro país. Acompanhou e registou a partida dos portugueses, o quotidiano de Luanda com a batalha de Kifangondo, ali tão perto, a progressão do exército sul-africano até Benguela, a resistência das mal armadas mas motivadas FAPLA, a chegada dos militares cubanos e, finalmente, a proclamação de independência pelo presidente Agostinho Neto.
A este registo, que é dos melhores que li até hoje sobre os últimos dias da descolonização, chamou “MAIS UM DIA DE VIDA – ANGOLA 1975” e foi publicado pela Editora Campo das Letras em 1997. Salman Rushdie disse sobre esta obra: “através da sua mistura extraordinária de reportagem e arte, chegamos tão perto quanto é possível, através da leitura, do que ele chama a imagem incomunicável da guerra.”

Quando pegamos neste livro só o largamos depois de lido. A sua escrita é quase cinematográfica e essa é uma das particularidades que nos prende. A descrição da “cidade de madeira”, como ele chama a Luanda por altura do frenesim do encaixotamento dos bens dos colonos, é notável.Alguns caixotes eram tão grandes como casas de férias, porque se tinha estabelecido, de um momento para o outro, uma escala social de caixotes. (…) As pessoas deixaram de pensar em termos de casas e apartamentos e falavam somente de caixotes. Em vez de dizerem: - Tenho que ir ver o que tenho em casa – diziam: - Tenho que ir passar revista ao meu caixote.”. Essa cidade, um dia, fez-se ao largo e só descansou na Europa…
Luanda ficou vazia. “Os cães estavam vivos. Viam-se cães de todas as raças, (…) abandonados, perdidos, percorriam a cidade em grandes matilhas, à procura de comida.”. Essas matilhas persistiram enquanto a tropa portuguesa as alimentou com rações da NATO. “Um dia desapareceram. Acho que seguiram o exemplo humano e deixaram Luanda, já que nunca deparei com um cão morto. (…) Depois do êxodo dos cães, a cidade caiu em rigor mortis. Por isso, decidi ir para a linha da frente.”.

Esta é uma obra (ainda) de urgente leitura.


Tomás Lima Coelho

2 comentários:

Luís F. de A. Gomes disse...

E estas tuas crónicas de leitura obrigatória, Tomás. Tens feito um trabalho notável e este livro que eu não conheço, fica referenciado a partir desta data. Vou procura-lo e lê-lo, tal não foi o apetite que abriste para o mesmo.

Aquele abraço, companheiro
Luís

Tomás disse...

Obrigado, Luís Gomes. Não exagero no meu comentário a este livro: é mesmo de urgente leitura! Sei que vais gostar. Abraço!