RYSZARD KAPUSCINSKY (1932, Pinsk – 2007, Varsóvia)
Nas últimas semanas que
antecederam o 11 de Novembro de 1975, data da independência de Angola, este
polaco era o único jornalista estrangeiro presente naquele futuro país.
Acompanhou e registou a partida dos portugueses, o quotidiano de Luanda com a batalha
de Kifangondo, ali tão perto, a progressão do exército sul-africano até
Benguela, a resistência das mal armadas mas motivadas FAPLA, a chegada dos
militares cubanos e, finalmente, a proclamação de independência pelo presidente
Agostinho Neto.
A este registo, que é dos
melhores que li até hoje sobre os últimos dias da descolonização, chamou “MAIS
UM DIA DE VIDA – ANGOLA 1975” e foi publicado pela Editora Campo das Letras em 1997.
Salman Rushdie disse sobre esta obra: “através da sua
mistura extraordinária de reportagem e arte, chegamos tão perto quanto é
possível, através da leitura, do que ele chama a imagem incomunicável da
guerra.”
Quando pegamos neste
livro só o largamos depois de lido. A sua escrita é quase cinematográfica e essa
é uma das particularidades que nos prende. A descrição da “cidade de madeira”, como ele chama a Luanda por altura
do frenesim do encaixotamento dos bens dos colonos, é notável. “Alguns
caixotes eram tão grandes como casas de férias, porque se tinha estabelecido,
de um momento para o outro, uma escala social de caixotes. (…) As pessoas
deixaram de pensar em termos de casas e apartamentos e falavam somente de
caixotes. Em vez de dizerem: - Tenho que ir ver o que tenho em casa – diziam: -
Tenho que ir passar revista ao meu caixote.”. Essa cidade, um dia, fez-se ao largo e só descansou na Europa…
Luanda ficou vazia. “Os
cães estavam vivos. Viam-se cães de todas as raças, (…) abandonados, perdidos,
percorriam a cidade em grandes matilhas, à procura de comida.”. Essas matilhas persistiram enquanto a tropa
portuguesa as alimentou com rações da NATO. “Um dia desapareceram. Acho que seguiram o exemplo humano e deixaram
Luanda, já que nunca deparei com um cão morto. (…) Depois do êxodo dos cães, a
cidade caiu em rigor mortis. Por
isso, decidi ir para a linha da frente.”.
Esta é uma obra (ainda)
de urgente leitura.
Tomás Lima Coelho
2 comentários:
E estas tuas crónicas de leitura obrigatória, Tomás. Tens feito um trabalho notável e este livro que eu não conheço, fica referenciado a partir desta data. Vou procura-lo e lê-lo, tal não foi o apetite que abriste para o mesmo.
Aquele abraço, companheiro
Luís
Obrigado, Luís Gomes. Não exagero no meu comentário a este livro: é mesmo de urgente leitura! Sei que vais gostar. Abraço!
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