quarta-feira, 30 de março de 2016

Confúcio – Mestre Kong-Kong-fuzi - 孔子


por Francisco Gomes Amorim
( http://www.fgamorim.blogspot.pt/ )

Nasceu há mais de 2.500 anos. Foi Grande Mestre, teve inúmeros seguidores que o veneravam e obedeciam, e cuidadosamente transmitiram seus ensinamentos, quase considerado um santo, foi perseguido, escreverem-se livros atacando o seu pensamento, dois mil anos mais tarde renegado, um “quase inimigo” do povo, novamente reabilitado, enfim um Grande Mestre cuja filosofia de vida até hoje se discute, mas a quem jamais se pode chamar de fraco ou “inimigo” a não ser da mentira.
Renegado e amaldiçoado pelos que não conseguem ou querem ser “homens”!
A base dos seus ensinamentos estava alicerçada no “homem de bem”, na “humanidade” que em chinês se expressa por ren.


Curioso, eu, como tudo que envolve a escrita chinesa, é um ideograma que transmite a ideia de ren, composto de dois elementos: homem ou pessoa  e três  ,  .
Não significa uma ideia abstrata, mas o bem que um homem pode fazer a quem está à sua volta. Virtude de humanidade tão rara que Confúcio chega a pensar que ninguém é digno de tal classificação, exceto em lendas.
E disto tira algumas lições: “O que queres que te façam, não faças aos outros”, o mesmo princípio do Antigo Testamento. Em outras das suas abordagens: “Praticar o ren é começar por si mesmo: querer elevar os outros tanto quanto queremos nos elevar a nós próprios, e desejar o seu êxito, quanto desejamos o nosso. Acolhe em ti o que podes fazer pelos outros, eis o que te porá no caminho do ren!” Ou ainda quando lhe perguntaram o que era o ren ele responde secamente: “É amar os homens!”
Nas virtudes de ren entram igualmente duas virtudes de honestidade, zhong : composta de coração, e de meio ,que são a lealdade para consigo próprio e em particular pelo seu soberano; e xin, composto de homem  e palavra ; a fidelidade à palavra dada, que torna um homem digno de confiança. A antiga garantia da palavra que era dada por um fio da barba.
Mas não se fica por aí. O homem de bem deve possuir duas qualidades sem as quais não poderá assumir responsabilidades políticas: discernimento  zhi, e coragem  yong. Sem discernimento ele não pode tomar decisões judiciosas, nem sondar o caráter dos homens para escolher os seus auxiliares. Quanto à coragem, uma arma de dois gumes que ainda que necessária, deve ser temperada com outras virtudes.
Muitas mais citações, ou lições, ou conselhos do Grande Mestre poderiam continuar neste pequeno texto. Mas tudo isto vem a propósito dos gravíssimos momentos que estamos a atravessar, com particular incidência sobre a autêntica “esculhambação” política que o Brasil está a exibir perante si próprio e o mundo.
Pior é que está a destruir o pouco de orgulho que muitos brasileiros ainda tinham, e alguns têm, pelo seu país, pela bandeira verde/amarela, envergonhando-os face aos acontecimentos dos últimos tempos.
Finalmente a justiça brasileira sai da covardia e do buraco em viveu tanto tempo escondida e amedrontada, e assume a sua postura de independência, com alguns juízes e promotores a fazerem o seu trabalho sem se preocuparem com quem está no banco dos réus. Regressa o orgulho de ser brasileiro.
Isso é o que está a animar o povo: FINALMENTE, os “colarinhos brancos”, os corruptos e corruptores vão acabar na cadeia, sejam eles quem forem.
Os bandidos – lula, sovietes, baderneiros e comprados – como foi na ocasião noticiado, ameaçaram até com guerra. Mas o Comando Militar fez um sóbrio e claro aviso: “Os Serviços de Inteligência Militar, mesmo depois que acabou a ditadura, nunca foram desmontados, e continuam a funcionar perfeitamente. As Forças Armadas não vão interferir nos processos políticos. A sua missão, além da defesa do país contra eventuais inimigos é garantir a Constituição, e se necessário, a ordem interna. Se uma ou outra estiverem ameaçadas... nós continuamos de prontidão.”
Foi claro o recado! Os famosos 250.000 homens que o soviete que preside o MST diz que pode pôr armados em pé de guerra em 24 horas, se o “cara” se armar em che guevarinha, vai apanhar na cabeça, ou, o que é mais provável, fugir, rapidinho, talvez para Pyongyang junto do king kong III e seu cabelinho de ***. Cuba começa a entrar em nova fase!
Imaginemos o que seria se fossem dizer ao Mestre Confúcio aquilo que se passa no Brasil, em Portugal, Espanha, Síria, Iraque, Estados Unidos, etc. A única coisa que ele poderia dizer seria, ao comentar o que lhe contassem, que não fossem mentirosos!
Tais desgovernos não são coisa de homens, jamais de homens de bem. Diria a esses mensageiros:
“Ver e ouvir os maus é já um começar de maldades.
Uma grande pobreza de ações encontra-se muitas vezes na opulência das palavras.
Os homens sem virtude somente encontram nas riquezas meios para satisfazer seus vícios.”
Perguntaram-lhe: “Mestre! O que é um homem de bem? Responde: “É aquele que não aconselha o que se deve fazer enquanto não fez aquilo que prega.”
Em muitos milhares de anos tantos Mestres nos mostraram o Caminho, o certo, e o homem, besta-fera, teima em seguir os caminhos errados.
“O homem de bem acarinha a virtude, o homem medíocre os bens materiais. O homem de bem tem em si o sentido da lei, o homem medíocre só pensa em privilégios. ”
Quanta gente, em altos postos, se encaixa na mediocridade?
Quando o Sol começar a arrefecer... daqui a mais uns bilhões de anos, pode ser que melhore!
Entretanto o valor do homem Confúcio... é imortal.

19/02/2016

terça-feira, 29 de março de 2016

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Esta manhã, a Serra da Estrela acordou cheia de neve. 



Eu é que tive um dia cansativo, cheio de relatórios de pagamentos para conferir e assinar, com a pressão suplementar de ter que dar por findo um estudo para a melhor segurança daquilo que dentro de um ou dois anos virá a ser um novo híper no domínio dos materiais de construção, tarefa para a qual contei com a tarde de ontem e a presente jornada. 

Mas o futebol é sempre um tónico para o alívio do espírito e, para tanto, bastou esticar as pernas durante a primeira parte do jogo para que os enleios dos números e da rentabilidade se dispersassem e a alma, de novo, se abrisse aos desejos da pena. 

E o encanto que é as gatinhas brincando, no chão da sala, com jogos de letras. 
É que a Matilde já vai incorporando a escrita nas suas fantasias. 
“-Professora, esse é um P?” 
“-Sim, é o que a menina tem que fazer.” –Ordenava, doutoral, a mais velha. 



Múltiplas vozes se têm manifestado favoravelmente à privatização do ensino. Uns por convicção quanto à melhor forma de organizar a economia e a sociedade, outros por critérios de racionalização dos recursos, todos considerando que as escolas privadas, a todos os níveis, são capazes de prestar um serviço melhor e mais barato que as congéneres públicas, por essa via se perfilando em condições mais favoráveis para atingirem objectivos nacionais. 
Desconheço qualquer sustentação empírica para estas ideias. É verdade que a argumentação seguinte vai no sentido de destacar a bondade do mercado – que ninguém tem que pôr em dúvida – que agiria como potenciador de excelência uma vez que para obterem resultados positivos, tanto financeiros como socias, as unidades escolares ver-se-iam constrangidas a procurarem os melhores profissionais possíveis e, com eles, a definirem e demandarem as metas que possibilitem a formação continuada da população estudantil. Mas o facto é que estamos perante argumentos que, em Portugal, ainda não têm possibilidade de confrontação prática; por exemplo, no plano universitário, a experiência dos privados é demasiado curta e restrita para permitir comparações de âmbito global com as universidades públicas e quanto aos degraus inferiores, com excepção da primeira infância e tendo em conta uma certa complementaridade ao longo do Estado Novo, em que a iniciativa privada serviu geografias arredadas das escolas estatais, apesar disso, dizíamos, nunca o primeiro daqueles domínios se colocou como uma alternativa ao segundo. Enfim, não há meio para comparar nem há suficientes dados e estudos disponíveis que o tenham feito ou a tanto deem agora viabilidade. Com efeito, é a própria realidade que não o consente. 
Resta-nos pois a crença de que o mercado e a livre iniciativa são os melhores mecanismos para se conseguirem os propósitos mais interessantes no âmbito do ensino. Ora aí vemo-nos forçados a considerar outros cambiantes que, ao estabelecerem um problema mais complexo, rejeitam automaticamente qualquer simplismo que tão só se alicerce numa profissão de fé. E acabamos por entender que a dualidade entre o público e o privado é não só redutora, como ainda nos impede de escolhermos a via mais profícua para começarmos a responder ao beco sem saída para que o nosso sistema de ensino parece estar caminhando. Por outras palavras, nós não temos que ser favoráveis ou não ao mercado e à livre iniciativa. Não é isso que está em causa sempre que se pretenda discutir a melhoria das nossas performances no universo de que estamos a falar. 
Desde logo gnosiologicamente, parece-me assim abusivo falarmos dos estabelecimentos privados e da concorrência entre escolas diversas como o vértice central de quaisquer políticas educativas entre nós. Não será por aí que chegaremos às perguntas certas e mais pertinentes. 



Na aula de hoje continuaram os exercícios em torno das palavras menina e menino, com jogos com as sílabas componentes e respectivas cópias. 
Foi o tema do trabalho e casa. 



Eleições do Benfica que só num país como o nosso conseguem ter honras de tratamento especial ao longo de todo o dia mediático. 
Tudo indica que o vencedor será o senhor Luís Fílipe Vieira, actual Presidente da SAD encarnada.
Parece-me que o lugar está bem entregue. Pelo trabalho desempenhado e a obra realizada até ao momento, espero que o Glorioso volte à ribalta desportiva nos próximos anos. 



No Iraque continuam os atentados que visam impedir a normalização da vida naquele país. 

E no Ocidente continua o autismo que impede a compreensão do quanto é importante um Iraque livre de radicalismos e aberto à democracia e à paz, em particular àquela que se ambiciona entre israelitas e palestinianos. 



Ena pá! Os miúdos de uma escola minhota ganharam o prémio de puderem fazer perguntas aos astronautas residentes na Estação Espacial Internacional. 

Bem que se poderia dar mais ênfase a coisas destas. 


 Alhos Vedros 
  31/10/2003

segunda-feira, 28 de março de 2016

REAL... IRREAL... SURREAL... (176)




Eça de Queirós (caricatura) "Honny soit qui mal y pense"
 in Álbum das Glórias BN Res.

Como a Europa Vê Portugal
O juízo que de Badajoz para cá se faz de Portugal não nos é favorável... Não falo aqui de Portugal, como estado político. Sob esse aspecto, gozamos uma razoável veneração. Com efeito nós não trazemos à Europa complicações importunas; mantemos dentro da fronteira uma ordem suficiente; a nossa administração é correctamente liberal; satisfazemos com honra os nossos compromissos financeiros. Somos o que se pode dizer um «povo de bem»... A Europa reconhece isto; e todavia olha para nós com um desdém manifesto. Porquê? Porque nos considera uma nação de medíocres, digamos francamente a dura palavra, porque nos considera uma «nação de estúpidos». 

Eça de Queirós, in 'Notas Contemporâneas' (Escrito fora de Portugal) 

Selecção de António Tapadinhas


sábado, 26 de março de 2016

flores eróticas e cactos e figos do Chile e Cascais


a Valparaiso e Vña del Mar a arder nestes dias

a minha esposa  linda e quase chilena como Pablo Neruda,poeta do amor,
 “
Não estejas longe de mim um dia que seja, porque,
porque, não sei dizê-lo, é longo o dia,”

Pablo Neruda


vejo chegar a fruta exótica de verão no Chile, Janeiro na tua boca, os lábios, 

como muito melão contigo no colo longo e longitudinal, nós no inverno aqui em
 Benfica e Santiago na cale do Mercado Central de peixe e tasquinhas
é a época do melão verde de casca dura e fino amarelo de casca mais suave
como-o fresco e espero o lugar em que se lê um livro a sesta, um dos grandes
romances do Chile E que poetas frutificam em Santiago? Procuro nomes
gostaria de viajar já com alguns livros recolhidos , estamos tão longe e tão perto
 
amo-te na poesia da humanidade em Cascais poemas de areia e mar, os poemas
do Surf, do Guincho como aguarelas e esta noite a festa das luzes na rua direita
na rua walbom, na baía , trazem-me figos de cacto madurinhos para varrer
os picos e comer de mão, beijo-te com flores eróticas palavras passadas sempre
 
José Gil

quinta-feira, 24 de março de 2016

Lugares de Portugal - Estremoz


O castelo de Estremoz data do séc. XIII. Foi mandado construir por D. Afonso III para defender Portugal dos ataques de Castela. No seu interior D. Dinis mandou construir um palácio para oferecer à Rainha Santa Isabel, sua mulher, e foi neste lugar que ela se encomendou aos céus.

Fotografias de 
Lucas Rosa


















quarta-feira, 23 de março de 2016

Etnografar a Arte de Rua (XIX)


Graffitar a Literatura


Graffitis fotografados por Luís Souta, 2015.
Cascais, Rua Afonso Sanches, nº 60 / Travessa Visconde da Luz

«Sorte e vidro estilhaçam-se depressa.»

O setubalense João Samina é o autor desta obra, a de maior impacto gráfico de algumas que nos legou no Muraliza 2015. Numa bonita e sóbria vivenda de 3 pisos, infelizmente, a degradar-se, Samina, usando a técnica do stencil, fez um graffiti que se desdobra entre a fachada (na Rua Afonso Sanches), metade de um rosto humano, a preto e branco, e a parede lateral (na Travessa Visconde da Luz), aí recorrendo a um cubismo cromático, em torno da janela do 2º andar, com o predominância do vermelho, preto e cinzento.

Vejo neste homem barbudo, de rugas bem vincadas e olhar grave, um pescador marcado pelo mar e pelas agruras da vida. Quando o vi, logo o associei a algumas personagens literárias de John Steinbeck (1902-1968). Para esse escritor americano, premiado com o Pulitzer (1940) e o Nobel da Literatura (1962), «os tópicos que escolheu eram sérios e denunciadores». A prová-lo, aí estão as suas grandes obras: A um Deus Desconhecido (1933), As Vinhas da Ira (1939), A Leste do Paraíso (1952). O jornal Público, na sua colecção de 12 livros “Quem Vê Capas Vê Corações”, editará, no próximo sábado (a um preço acessível, 5,95€), Noite sem Lua (1942), com capa do artista Querulin e 19 ilustrações de Costa Pinheiro.

Mas o rosto que o graffiter Samina pintou conduziu-me a outra obra de Steinbeck, escrita em 1947, A Pérola (Livros do Brasil/ colecção Dois Mundos, nº 228, 1996) um pequeno livro (162 páginas repartidas por 6 capítulos) adaptado, nesse mesmo ano, ao cinema pelo realizador Emílio Fernández. A história, baseada num conto popular mexicano, centra-se numa pobre comunidade piscatória:
«Enquanto caminhavam, os dois irmãos apertavam os olhos, como eles e os seus avós e os seus bisavós tinham feito durante quatrocentos anos, desde que os estrangeiros tinham chegado com as suas razões e a sua autoridade e pólvora a apoiá-las. E, durante esses quatrocentos anos, o povo de Kino só tinha aprendido uma defesa – um leve aperto dos olhos e um leve comprimir dos lábios, um fechar-se dentro de si próprios. Nada podia quebrar essa muralha, e eles encerravam-se incólumes dentro dela.» (p. 80)

Kino, o pescador, personagem central da história, ao apanhar uma enorme pérola parecia ter encontrado a solução para os vários problemas da sua família (Juana, a mulher, e Coyotito, o filho):
«Kino olhou para os vizinhos, orgulhosamente:
– O meu filho há-de ir à escola (…) há-de ler e abrir os livros, e o meu filho há-de escrever e conhecer a escrita. E o meu filho há-de fazer números, e essas coisas hão-de libertar-nos, porque ele há-de saber, há-de saber e nós havemos de saber através dele. (…)
– É isso que a pérola há-de fazer – disse Kino.» (p. 47)

Mas, ao contrário do expectável, a pérola só trouxe agravos e dissabores. E Kino acabou por a devolver às águas do mar. Esta parábola (assim a categoriza Steinbeck logo na abertura) contem uma moral: “o dinheiro não traz felicidade” (para manter o status quo, ricos e poderosos sempre a cultivaram). Hoje, na nossa sociedade, a “pérola” procura-se no quiosque do bairro: de forma obstinada, os portugueses tentam a sorte na “raspadinha” ou no “euromilhões”. Todos aprendemos que pelo trabalho não se enriquece. E essa crença faz de nós inveterados jogadores.

Luís Souta

terça-feira, 22 de março de 2016

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

RISOS E ENIGMAS
Chuva e vento, 
as arestas assobiam 
e no horizonte, as luzes 
parecem embaciadas. 

É hora de interiores. 



Os jantares costumam ser um espaço de comunhão na família, só muito raramente ocupados com assuntos sérios que, normalmente, são resolvidos quer naquela hora que antecede a refeição, quer na que se lhe segue e a separa do encontro com o João Pestana. Vulgar é que as conversas girem em torno do dia a dia de cada um ou que os pais aproveitem para comentar um qualquer assunto, no que as miúdas já vão dando opinião ou então que sejam estas a fazê-lo, como seria de esperar, relativamente a temas do seu interesse. Monotonia é que não há, de modo algum. 

Pois hoje a Margarida veio com enigmas, isto para usar as suas palavras. 

“-De que cor é o cavalo branco de Napoleão?” –Perguntou, repentinamente, à mãe, ao que a Matilde logo se antecipou, rindo com a resposta. 
“-Eu nem sei quem é o Napoleão, como é que queres que eu saiba? Mas é branco, se tu estás a dizer que é branco é porque é.” 

E depois do elogio, a risada continuou. 



Hoje foi dia de bater com o nariz na porta. 
Não houve aula de ginástica e depois do jantar, foi em vão que saí para a reunião da associação de pais. Troquei a noite do encontro. 



Ontem acabei de ler o relato de uma secretária de Adolf Hitler a respeito do que foi o seu desempenho laboral nos dois anos e meio em que o serviu e lhe fez companhia e que, por sinal, foram os do desfecho fatal do Reich dos mil anos. (1) 

Parece-me ser uma narrativa sincera, pois a Autora não a usa para se justificar ou se arrepender do que quer que tenha feito nesse tempo, antes se limita a descrever o que da sua irrelevância lhe foi dado ver. E, pelas suas palavras, percebe-se que se esse foi um período de enganos, então terá sido equivalente a um delírio doce. Afinal ela estava na corte que descreve com tanta inocência que chega a parecer infantil. No mundo real praticava-se com o maior zelo a Solução Final e, nas frentes de batalha, os homens sabiam que só a morte poria termo à fúria das armas. 
O cesarismo que o ditador via na sua própria pessoa, segundo o olhar da subalterna, talvez seja esse um dos álibis com que, posteriormente, se possam ter desculpado muitas cumplicidades. 
Mas é precisamente por isto que este livro nos convida a pensar no quanto as tiranias também têm muito de consentido. 
E não me refiro ao aspecto dos totalitarismos levarem as suas vítimas a pensarem no que possam ter feito para merecer o castigo. Estou antes a pensar no deslumbramento que o povo sente perante o Faraó, isto é, à semelhança de Goldhagen, relativamente ao anti-semitismo, (2) os antecedentes culturais que viabilizaram a afirmação do César, a anuência, o consentimento que a população dá ao seu mando providencial. 

É importante reflectir sobre isto. 
Será possível uma vacina cultural para este género de tragédias? 



Continuaram os exercícios em torno das palavras menino e menina, primeiro com colagens referentes ao começo do Estudo do Meio com a caracterização da identidade e depois através de jogos com sílabas. 
Por fim houveram desenhos alusivos. 



A construção de edifícios com cento e cinco andares viola o plano director municipal da cidade de Lisboa. 
Ainda assim, uma empresa propõe-se construir três dessas torres em Alcântara e esta tarde apresentou publicamente o projecto que tem a assinatura de Sousa Vieira. 

Chegámos a isto. 
Já não há barreiras para o egoísmo e o despudor. 


Então o Dr. Jorge Coelho não vem reclamar pelas reformas inadiáveis? 



As nuvens teclam os ferros da varanda. 


 Alhos Vedros 
  30/10/2003 


 NOTAS 

(1) Junge, Traudl, ATÉ AO FIM 
(2) Goldhagen, Daniel Jonah, OS CARRASCOS VOLUNTÁRIOS DE HITLER 


 CITAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS 

Goldhagen, Daniel Jonah, OS CARRASCOS VOLUNTÁRIOS DE HITLER, Não refere a tradução, Editorial Notícias (1ª. Edição), Lisboa, 1999 
Junge, Traudl, ATÉ AO FIM, Prefácio da Autora, Tradução de Cláudia Porto, Dinalivro (1ª. Edição), Lisboa, 2003

segunda-feira, 21 de março de 2016

REAL... IRREAL... SURREAL... (175)




Sobreiro, Autor: António Tapadinhas 

 Árvores do Alentejo
Horas mortas... Curvada aos pés do Monte 
A planície é um brasido... e, torturadas, 
As árvores sangrentas, revoltadas, 
Gritam a Deus a bênção duma fonte! 

E quando, manhã alta, o sol posponte 
A oiro a giesta, a arder, pelas estradas, 
Esfíngicas, recortam desgrenhadas 
Os trágicos perfis no horizonte! 

Árvores! Corações, almas que choram, 
Almas iguais à minha, almas que imploram 
Em vão remédio para tanta mágoa! 

Árvores! Não choreis! Olhai e vede: 
- Também ando a gritar, morta de sede, 
Pedindo a Deus a minha gota de água! 

Florbela Espanca, in "Charneca em Flor" 


Selecção de António Tapadinhas

domingo, 20 de março de 2016

Nosso idioma : dúvidas sobre palavras com o mesmo significado


Diferenças entre as palavras Concelho e Município (sinônimas no latim)

No Brasil, para se designar a subdivisão administrativa de cunho municipal e local, se diz apenas município; já em Portugal, usa-se sobretudo concelho, mas município também encontra uso.

As duas palavras, na sua origem, ou seja da língua-mãe que é o latim, significavam a mesma coisa: uma divisão territorial e administrativa de um país. Esta divisão nasce no antigo Império Romano.

Quer isto dizer que se dividem grandes territórios – os países – em vários – os concelhos – para melhor poderem ser governados e aplicar as leis mais facilmente. Criam-se também leis próprias para estes Municípios ou Concelhos – leis locais, como ainda hoje se chamam. Nem todos os países adotaram esta estrutura, mas Portugal, sim. 

Na prática, em Portugal, pode não haver grande diferença entre concelhomunicípio e municipalidade: digamos que o primeiro termo designa o território administrado por um município; o segundo, a própria estrutura autárquica ou a população que é abrangida por ela; e o terceiro, as pessoas eleitas e os funcionários que trabalham numa câmara municipal.
Mesmo assim, tendo em conta apenas os dicionários gerais, pode afirmar-se que, historicamente, os termos não são exatamente sinónimos. O dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (ACL) define as palavras em questão do seguinte modo:

município
1. Hist. Cidade conquistada, no tempo dos romanos, com direito a administrar-se pelas suas próprias leis e cujos habitantes gozavam dos direitos civis da cidadania romana. 2. Circunscrição territorial administrada por uma vereação, por uma câmara municipal, superintendida por um um presidente. CONCELHO. 3. População que habita num concelho, congregada por interesses comuns. Salientam-se algumas das medidas que vieram beneficiar todo o município: a abertura de novas estradas, a criação do parque de campismo e do museu etnográfico. 4. Bras. Circunscrição administrativa autónoma do estado, governada por um prefeito e uma câmara de vereadores.»(1)

concelho
«Divisão administrativa de categoria inferior à de distrito. MUNICÍPIO. Almada é um dos concelhos do distrito de Setúbal. O concelho divide-se em freguesias. «Quando vagou um 1.º andar sobre o armazém de vinhos, então, os meus antepassados atravessaram o Tejo e botaram raízes no concelho de Almada» (R. CORREIA, Tristão, p. 27).

Observe-se, no entanto, que, ainda em Portugal, o termo município é o que é usado na Constituição da República :
«Artigo 236.º
Categorias de autarquias locais e divisão administrativa
 1. No continente, as autarquias locais são as freguesias, os municípios e as regiões administrativas.»

Quanto a municipalidade, é um termo que pode ser sinónimo de município e concelho ou de «câmara municipal». O dicionário da ACL define-o assim:
«1. Conjunto de pessoas eleitas pelo povo de um município, para administrar os seus interesses. VEREAÇÃO. 
2. Conjunto dos funcionários de uma câmara municipal. 
3. Edifício onde funcionam os órgãos da administração municipal. CÂMARA MUNICIPAL. 
4. Circunscrição territorial em que uma vereação exerce a sua jurisdição. CONCELHO, MUNICÍPIO.»(2)

Portanto, as duas palavras tomaram um rumo diferente. Muito embora algumas pessoas se refiram ao concelho como município, esta palavra refere-se geralmente à Câmara Municipal. Câmaras Municipais são os chamados órgãos executivos, eleitos pelos cidadãos (que no caso do concelho se chamam munícipes) para, como a palavra já deixa adivinhar: executar leis e, assim, governar um concelho. Assim, quando dizemos, por exemplo: "O Município de Sintra" estamos a referir-nos à Câmara Municipal de Sintra. E existe ainda a Assembleia Municipal, composta por deputados eleitos e pelos presidentes das Juntas de Freguesia (ver mais adiante); às assembleias municipais chamam-se órgãos legislativo porque fazem e aprovam leis.
Por exemplo, o regulamento de Recolha de Resíduos Orgânicos do Concelho foi votado em Assembleia Municipal. Mas quem decide, com base neste regulamento, como fazer a recolha é a Câmara Municipal.

Já as palavras cidade/vila  não tem o mesmo significado de município. 
Por exemplo, cidade/vila, entende-se como espaço urbano de um município delimitado por um perímetro urbano. Para ser considerada cidade/vila, é preciso ter um número mínimo de habitantes e uma infraestrutura que atenda minimamente as condições dessa população, mesmo que essa cidade seja dependente de outras que se localizem próximas a ela. E acrescento, que no Brasil, não é adotada a palavra vila. 
E a subdivisão administrativa : município, possui a sua zona rural e a zona urbanizada.

Quanto aos outros países da lusofonia, a terminologia para a área administrativa dos territórios, é outra. Não tem a origem romana. Vamos ter que aprender!

(1) O símbolo significa «sinônimo».
(2) «[Vereação] conjunto dos vereadores, das pessoas eleitas pelos cidadãos eleitores de um município para, sob a égide de um presidente, o candidato mais votado, administrar os serviços do concelho [...].»

Fontes:
__._,_.___

Enviado por: Margarida Castro <margaridadsc@yahoo.com>


quinta-feira, 17 de março de 2016

SINTONIAS
por
Abdul Cadre


GLOSAS ÁS QUADRAS INÉDITAS DO
PROFESSOR AGOSTINHO DA SILVA


Homenagem a Agostinho da Silva
Grande Mestre do Sonho
e da Utopia.




Note Bem:
As quadras (ou trovas, como se diz no Brasil) epigrafadas entre comas e em caracteres menores são da autoria do saudoso Professor Agostinho da Silva.

     Estas Sintonias foram produzidas em jeito de glosas às «QUADRAS INÉDITAS» do Professor Agostinho da Silva, que a ULMEIRO (Lisboa) deu ao público em 1ª edição em 1990.

     Foram oferecidas pelo autor à GRANDE ALMA PORTUGUESA em 15 de Agosto de 1992



«Se estas quadrinhas não prestam
com certeza as compus eu
mas se boas foi poeta
além de mim que mas deu.
»


Por faltar-me a qualidade
em quantidade se avia
estas quadras prá idade
que o vento já anuncia.

Versos meus e de quem faz
por mim que dou o recado
dedicados a quem traz
o futuro bem estudado.

Ao sábio que diz não ser
e sempre dá um gostinho
de futuro por haver
e usa o nome de Agostinho.

Bº 91.12.19


Pode baixar o livro clicando AQUI


quarta-feira, 16 de março de 2016

Antero de Quental. Hino à Razão. Soneto.


Pedro Teixeira da Mota

Os Sonetos completos de Antero de Quental, prefaciados por Oliveira Martins, sairam em terceira edição no ano de 1918, no Porto, na Companhia Portuguesa Editora, e tendo há poucas horas adquirido um exemplar na livraria alfarrabista do Bernardo Trindade, à rua do Alecrim, partilho o exemplar pois não é vulgar nesta edição encadernada em "pano de chita", que não  vem dos místicos e corajosos Shias ou Shitas da Pérsia e do Iraque (sobretudo) mas do sânscrito chitra, tecido de algodão, e que em Portugal foi bastante estampado na zona de Alcobaça, não por acaso a terra natal do pai Trindade, Tarcísio, poeta e sábio bibliófilo, para além de municipe ilustre e filantropo de Alcobaça que, embora já nos mundo subtis, tem no seu filho Bernardo um digno continuador e com os irmãos e primos todos dedicados às artes, antiguidades e livros.
Este exemplar tem ainda a particularidade de apresentar várias assinaturas, carimbos e ex-libris de posse de antigos usufrutuários que se abeiraram do Logos servido por Antero neste belo cálice, que ostenta agora também, embora a lápis, a pertença desta Hora: "Antero de Quental, escritor." 
Ora o ex-libris,  criado para o último dono Carlos J. Vieira, é bastante simbólico, e nele mencionarei apenas o oceano, a montanha que se ergue para o Sol e, no mais alto, a vieira ou concha das bênçãos divinas para os peregrinos da Verdade, certamente bem apropriado também para um livro de Antero.
Aníbal Antunes Graça terá sido o seu 2º possuidor, o que fez a encadernação que ostenta ainda o seu carimbo, tendo o senão de ter riscado no frontispício o nome do anterior possuidor, que fica assim privado da imortalização internética...
Apresentamos, depois destes pormenores bibliófilos, um soneto, dos mais belos e luminosos, um daqueles em que Antero aspira mais ao alto, à luz da Razão e confia nela, o Hino à Razão.
Posto como sendo o último da série de 1864 a 1874 deveremos destacar e invocar em nós o que Antero conjura ou apura em si: alma livre e a nada submissa senão à Razão, certamente um ideal pelo qual devemos lutar, pois ora pelos instintos, emoções ou pensamentos incorrectos afastamo-nos do que seria o Verdadeiro, o Logos, e utilizamos estas palavras para não usarmos Racional ou Lógico, hoje no séc. XXI bastante mais contextualizadas e diminuídas das suas posições de dominação na psique humana, que é bem mais vista como unificadora dos contrários ou supra racional e supramental. Aliás com isto está intimamente ligado o que entendeu por Razão Antero,  e o que nós hoje poderemos compreender melhor, nomeadamente as formas de sinonimizar e analogizar.
Para tal tarefa de construção já Antero carreou duas  colunas suas irmãs, o Amor e a Justiça.
Esta Razão é então uma com o Amor e a Justiça, é Divina, e é para ela que Antero ergue a voz do coração, ou seja a sua prece, mostrando-nos assim que a oração deve brotar do íntimo do peito, do coração, da nossa essência amorosa, consciencial, espiritual...
O que faz o coração e que o tinge e caracteriza? Deseja, apetece, aspira, ama, sonha, quer?
Antero fez a sua escolha, por rima ou por opção consciente não sabemos.
Intui ou acredita sim que a Razão Universal tudo penetra, qual Logos Divino omnipresente e é mãe dos que robustamente lutam por ela...
Oiçamos então Antero, fortificando-nos na nossa consagração ao Logos, à Verdade, isto é, à palavra, pensamento, sentimento e acto justo, harmonioso e que segundo Antero originam ou fazem que a virtude prevaleça e o heroísmo floresça...

Pano ou chitra que também podia ser do Japão, Sakura, Sakuraicho go ichi e.... e onde cabe ou palpita nossa comunhão com Antero e a  Divindade tanto em nosso coração e prece quão mnipresente e nos robustecendo no florescer em Amor, Justiça e Verdade...

terça-feira, 15 de março de 2016

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

UM SIMPÁTICO REGRESSO

Em Israel, o exército, pelo porta-voz do estado maior, vem lembrar que a continuação das operações militares na Cisjordânia pode ter efeitos devastadores para o almejado processo de paz. 

E nós sabemos como o entendimento e a coexistência pacífica entre israelitas e palestinianos são importantes para o futuro da nossa espécie. 

Ali reside a última fronteira da vitória sobre o fanatismo e é de lamentar que os democratas de todo o mundo e do Ocidente, em particular, não sejam capazes de afirmar claramente uma plataforma de apoio a todos aqueles que, no seio daqueles povos, querem ver ali dois países independentes e de preferência prósperos, empenhados na paz e na convivência que são o limiar da cooperação. 
Na verdade, quando apenas reconhecemos o direito de uma das partes, tão só conseguimos reforçar os pontos de vista e as posições das facções mais fundamentalistas uma vez que são essas que propõem as soluções mais desvantajosas para a outra parte. 
E com isso é a situação de guerra que permanece; nem o estado de Israel pode aceitar uma posição de vulnerabilidade, nem as forças terroristas podem ser contidas e suprimidas por meios estritamente militares. 

Do lado de Telaviv são conhecidas as vozes que falam do calar das armas e de concessões tão impensáveis como o regresso às fronteiras de sessenta e sete. 
Infelizmente não há correspondência das autoridades palestinianas e a tirania que exercem sobre o seu povo não permite que a opinião democrática cresça, se afirme e venha a preponderar sobre as forças que fazem da violência e da morte os melhores dos seus argumentos. 

Nestes tempos de horizonte obscurecido, faltam os homens que acreditam serem preferíveis as dores da liberdade à quietude das sociedades tuteladas. 



Livros Escolares da Margarida, I 

“Queremos Ser Livres”, 4º. Ano, sob coordenação do Secretariado Nacional da Educação Cristã; trata-se da décima terceira edição, deste ano e é publicado por aquele secretariado, para a educação moral e religiosa católica do primeiro ciclo do ensino básico. 



Este ano regressou a educação moral e religiosa no conteúdo do tempo escolar normal. Uma hora de quinze em quinze dias não me parece que possa pôr em causa o bom decurso das matérias e parece-me suficiente para transmitir os princípios de uma certa maneira de ver o mundo. 



Mas a Matilde é cá uma raposa. 
Ainda há pouco estávamos os dois na varanda e como eu fui o primeiro a voltar para dentro pedi-lhe que fechasse a porta. Pois não é que ela retorquiu de imediato: 
“-O primeiro a entrar é que fecha a porta.” –E continuou sem se voltar em conformidade com a pose de uma última palavra sobre um qualquer assunto. 



Hoje os alunos continuaram os exercícios em torno da palavra menina e menino se bem que, desta vez, esse fosse, igualmente, o ponto de partida para o Estudo do Meio em que as crianças começaram a caracterizar as respectivas identidades. 



Afinal não vão haver mexidas no domínio das áreas protegidas. 
O ministro do ambiente teve nota positiva quando se mostrou veementemente contra a hipotética mudança. 
Da parte do governo veio o comentário que nada disso esteve em causa. 
Ainda bem que o bom senso prevaleceu. 

Portugal continua a singrar o trilho do paraíso para o mundo do crime. 
Esperemos não vir a ser um destino para férias sexuais na Europa. 


 Alhos Vedros 
   29/10/2003

segunda-feira, 14 de março de 2016

REAL... IRREAL... SURREAL... (174)

Painel do Infante, Nuno Gonçalves, 1470 a 1480
Óleo e Têmpera sobre madeira, 207x128 cm


O Quinto Império

Triste de quem vive em casa,
Contente com o seu lar,
Sem que um sonho, no erguer de asa,
Faça até mais rubra a brasa
Da lareira a abandonar!

Triste de quem é feliz!
Vive porque a vida dura.
Nada na alma lhe diz
Mais que a lição da raiz-
Ter por vida a sepultura.

Eras sobre eras se somem
No tempo que em eras vem.
Ser descontente é ser homem.
Que as forças cegas se domem
Pela visão que a alma tem!

E assim, passados os quatro
Tempos do ser que sonhou,
A terra será teatro
Do dia claro, que no atro
Da erma noite começou.

Grécia, Roma, Cristandade,
Europa – os quatro se vão
Para onde vai toda idade.
Quem vem viver a verdade
Que morreu D. Sebastião?


Fernando Pessoa, in Mensagem


Selecção de António Tapadinhas