Uma Revista que se pretende livre, tendo até a liberdade de o não ser. Livre na divisa, imprevisível na senha. Este "Estudo Geral", também virado à participação local, lembra a fundação do "Estudo Geral" em Portugal, lá longe no ido século XIII, por D. Dinis, "o plantador das naus a haver", como lhe chama Fernando Pessoa em "Mensagem". Coordenação de Edição: Luís Santos.
quarta-feira, 19 de maio de 2010
Aceitando a Felicidade
A maior parte de nós, devido a uma (des)cultura e (des)educação que se instalou lenta e progressivamente ao longo das últimas décadas (ou mais, talvez), tem grande dificuldade em aceitar a Felicidade. Da mesma forma, dificuldade em aceitar elogios, ou outra demonstração qualquer que implique amor, simpatia, generosidade.
Todos ambicionamos a ela, Felicidade, esse estado de bem-aventurança que nos faz sentir leves e mais perto da essência do Ser.
Mas, quelque part, instalou-se no nosso subconsciente um medo ou vergonha ou, pior ainda, sentimento de culpa em sermos felizes, em nos atrevermos a correr o risco de ser felizes. A juntar a isso, vem, frequentemente, a vergonha de exteriorizar os nossos sentimentos, sobretudo se forem positivos e saudáveis. Às vezes, parece que ninguém tem vergonha de mostrar as misérias, as desgraças e há pessoas mesmo que são peritas nas "choraminguices" e outras que se deleitam com a desgraça alheia; para provar tal, basta ver quantas pessoas se juntam, de imediato, ao redor de um acidente, mesmo que o espectáculo seja horrendo, ou como as pessoas adoram comentar as fragilidades dos outros: "coitado, está tão aflito, precisa tanto disto ou daquilo", etc..., e passam palavra, aumentam as histórias, alimentando-se dessa energia sofredora, como que para "lamberem as suas próprias feridas à custa das feridas dos outros"... usamos e abusamos da palavra "coitado" e alimentamo-nos do "sangue" da tragédia, da negatividade que nos rodeia. Basta ver o índice de audiência dos noticiários que, em mais de 90%, só divulgam desgraças e horrores....
Pelo contrário, se uma pessoa andar alegre e bem disposta, der um grito de felicidade, ou gritar aos quatro ventos "estou feliz!", provavelmente a maioria julgará de imediato "parece maluco"...., "ah! é um extrovertido exagerado!", ou ainda "que horror, mostrar aos outros o que se passa na sua vida privada", ou ainda (o que é quase hilariante!) "é um convencido, quem é que ele julga que é para estar assim quando andamos todos mal???" ....!!!!
Enfim, julgar é aquilo que nós mais gostamos de fazer.... esquecendo-nos sempre que, cada vez que apontamos um dedo para fora, temos quatro dedos apontados para nós próprios.
Ao longo da vida, todos nós estamos sujeitos a problemas, desgraças, imprevistos, perdas, contratempos, desgostos. O sofrimento é inerente à condição de estar vivo, encarnado nesta existência. Por vezes chego a pensar que o "inferno" é aqui e não "lá"! Todas essas fases da vida devem ser vivenciadas para que a dor, aceitada, possa ser transformada em apaziguamento, antes de mais, e posteriormente em alegria. Alegria de estar vivo, aconteça o que acontecer. O que se passa é que, na incapacidade de gerir os nossos próprios sentimentos, não sabendo transformar a negatividade em positividade, temos uma dificuldade enorme em aceitar que os outros estejam bem, saudáveis e felizes.
Lembro-me, desde miúda, de ouvir o meu pai dizer-me constantemente "não tenhas medo de dizer o que pensas, mostra o que sentes, não te importes nunca com o que os outros poderão pensar; ninguém pode controlar o que os outros pensam, mas tu podes e deves exteriorizar tudo aquilo que sentes, nunca tenhas vergonha da Verdade e de seres como és". Em adolescente, arquivei em mim uma frase atribuída a Anatole France (nascido a 16 de Abril de 1805) e que nunca mais esqueci: "Se exagerássemos as nossas razões de felicidade como exageramos os nossos cuidados, estes deixariam de ter qualquer importância".
Por isso, aceitar elogios, prendas, sorrisos e os momentos de felicidade com que a vida nos vai brindando de tempos a tempos, é saber aproveitar cada momento da existência tal como ela se nos apresenta (*). E ao sermos capazes de fazer isso, seremos automaticamente capazes de nos regozijar com a felicidade alheia. E ao regozijarmo-nos com a felicidade alheia, autêntica e singelamente de coração inteiro, estaremos a abrir caminho para que a Vida nos brinde com mais alegria e bem-aventurança.
Insistir, ficar preso na negatividade, invejarmos o que de bom acontece aos outros, é obstruir o processo criativo e o fluxo vital que pode transformar a nossa existência. Depende apenas de nós que a nossa vida seja "um muro de lamentações" ou um quadro vivo em que todas as estações do ano se vão desenrolando sucessivamente e enriquecendo as nossas almas. Para além disso, a minha alegria será a alegria do mundo e vice-versa, tudo está interligado e a influência de um átomo faz-se sentir em todos os outros.
Portanto, faça um favor a si próprio: seja feliz, por si e pelos outros, e seja sempre grato por tudo isso!
Que bom que era se o mundo todo amasse, sorrisse e cantasse! A guerra acabaria, com certeza.... tal era a energia que se implantava sobre o planeta!
(*) a propósito disto, aproveite para ver o último filme do Woody Allen, em exibição, "Whatever works" ("Tudo Pode Dar Certo"), genial e hilariante!
Paula Soveral, Lisboa, 25/2/2010
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2 comentários:
Ser feliz por nada. Só porque sim.
Assim, tal e qual e nada mais podemos que expressar o agradecimento pela partilha destes pensamentos.
Haja então paz e saúde para si,
Luís F. de A. Gomes
PS
Já quanto à guerra há uma pequena observação que não poderemos deixar de destacar; enquanto houver produção de armas não poderá(ão) deixar de haver guerra(s).
Ora daí perguntar: porque se produz (tanto) armamento?
Iríamos bem longe a partir deste ponto de referência e seguramente reflectiríamos sobre o que de mais profundo tem a natureza humana e a organização das relações que estabelecemos neste mundo que é o nosso.
Poderá a espécie humana aspirar a viver num mundo harmonioso? E o que seria um mundo harmonioso?
São questões a que não sei responder.
Renovo os votos de paz,
Luís F. de A. Gomes
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