Uma Revista que se pretende livre, tendo até a liberdade de o não ser. Livre na divisa, imprevisível na senha. Este "Estudo Geral", também virado à participação local, lembra a fundação do "Estudo Geral" em Portugal, lá longe no ido século XIII, por D. Dinis, "o plantador das naus a haver", como lhe chama Fernando Pessoa em "Mensagem". Coordenação de Edição: Luís Santos.
quinta-feira, 9 de setembro de 2010
d´Arte - Conversas na Galeria II
A Grande Caminhada – Acrílico sobre Tela 60x60cm
Autor: António Tapadinhas
Esta obra ganhou vida por ela própria. A ideia inicial era, numa tela já pintada com cores ocre, texturada, com incisões horizontais espaçadas e verticais mais próximas, pintar séries de cores frias e quentes, no plano horizontal. Queria incutir no espectador uma sensação de grupos heterogéneos a caminhar, determinados, na obtenção de um objectivo misterioso. Este estudo serviria para preparar uma tela mais ambiciosa para uma bienal de prestígio – Prémio Vespeira. O problema foi que gostei tanto deste estudo que não me quis copiar. Na versão final, mais elaborada e de maiores dimensões, nem o título mantive. Esta tela continua comigo e não é mais um estudo – tem um lugar de destaque entre as obras que criei.
Esta pode representar a Grande Caminhada do Homem na descoberta do seu ADN…
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6 comentários:
Tal e qual, é a primeira sugestão que recebemos ao olhar a pintura, as sequências de A, T, C, G que compõem o alfabeto que os genes usam para passar a mensagem da Vida, com o que nos ofecere a oportunidade de recebermos uma lição que deveríamos reter -mas... Somos tão teimosos....- a respeito de como é possível tanto criar a partir de tão pouco. Mas enfim, isso decorrências éticas e morais que aqui não vêm ao caso.
Seja como for, ainda antes de ler o texto com que acompanhas a pintura, depois daquele primeiro olhar pensei que isso seria redutor, por se tratar da evidência.
E foi aí que decidi perceber que a evidência era a capa atrás da qual se escondia a mensagem mais profunda, a das combinações que nos remete para a conversa e o arranjo, os meandros da partilha, em função das quais foi possível ao Homem acrescentar tanta e tanta tralha ao planeta, mas, também com, tanta outra coisa que nos eleva e faz de nós mais humanos hoje do que o fomos ontem.
É a leitura poética das reuniões da adenina e da timnina e ainda da citosina e da guanina -que nomes tão deprimentes para os tijolinhos básicos desta estrutura de Vida que conhecemos na Terra- que nos dá o olhar esperançoso sobre esta tua tela.
Como eu sempre tenho para mim, o que faz falta é dartear a malta, pois a arte sempre esteve de mãos dadas com o que nos leva do simples animal homem à complexidade do ser humano que assim não nasce mas em tal se forma.
Aqui voltaremos para a próxima semana.
Aquele abraço
Luís
Luís: Sempre fico espantado quando faço uma exposição: o que eu aprendo! Interpretam de maneiras diferentes as obras, o que eu pretendia dizer ou, até, chegam a descobrir-lhes novos e estimulantes sentidos.
Este título - A Grande Caminhada - servia para, mais do que esclarecer, colocar o manto diáfano da fantasia sobre a interpretação da obra, por a considerar demasiado elaborada, rebuscada, erudita, eu sei lá!
Receios infundados: na primeira exposição da peça, quem a apreciava, identificava-a de imediato, com a estrutura do ADN!
Já devia saber mais! Nunca devemos menosprezar a sabedoria de vida ou académica do nosso semelhante: é a nossa ferramenta mais útil, embora não traga livro de instruções, como bem lembraste nos "pintassilgos"...
Abraço,
António
Então, aqui vai um novo sentido para esta tua obra. Penso que já tive oportunidade de vê-la mais que uma vez. Quanto à estrutura do ADN a que imediatamente somos remetidos é, para quem já as viu desenhadas, quase inevitável de tão parecidas que são. Depois, estrutura de ADN e Grande Caminhada jogam bem, pois que já muito longa é a estrada. Mas para o que eu sou igualmente remetido quando a olho é para tendas e grupos de índios. Acampamentos de índios daqueles que nós muito víamos nos filmes do Oeste Americano. E penso que não é pelo título a "Grande Caminhada" que até tem uma estética próxima de designações índias, como "Grande Chefe", "Estrela do Luar", "Águia Forte", "Rio que Dança", etc., mas antes pela cor e pelo sentimento de solidariedade orgânica que em nós se gera. Bem, de facto, a interpretação possível de se fazer de uma obra de arte é tal e qual a vida: um meio de infinitas possibilidades.
Abraço.
Luis Carlos: A tua interpretação é um achado. A cor dominante do quadro está de acordo com ela. E as tuas belas palavras, lembram-me uma Prece Saudação do índio norte-americano, que diz assim:
Ó Grande Espírito, cuja voz ouço nos ventos, cujo sopro anima o mundo, ouça-me.
Sou pequeno e fraco, preciso de sua força e sabedoria.
Permita que eu caminhe na Beleza, e faça que meus olhos contemplem para sempre o vermelho e a púrpura do sol poente.
...
Acho que serve para todos os deuses...
Deus simplesmente É, logo, entende todas as línguas. Como os amigos.
Abraço,
António
António:
Carta do Chefe Seattle em 1854 ao Grande Chefe Branco de Washington:
"(...)As flores perfumadas são nossas irmãs, o veado, o cavalo, a grande águia são nossos irmãos;as rochas escarpadas, os húmidos prados, o calor do corpo do cavalo e do homem, todos pertencemos à mesma família (...) A água cristalina que corre nos rios e ribeiros não é somente água: representa também o sangue dos nossos antepassados (...) O murmúrio da água é a voz do pai do meu pai.
(...)
Sabemos que o homem branco não compreende o nosso modo de vida (...) Trata a sua Mãe, a Terra, e o seu irmão, o Firmamento, como objectos que se compram, se exploram e se vendem como ovelhas ou contas coloridas. O seu apetite devorará a terra deixando atrás de si só o deserto.(...) Não sei, mas a nossa maneira de viver é diferente da vossa. (...) Nós preferimos o suave sussurrar do vento sobre a superfície dum charco, assim como o cheiro desse mesmo vento purificado pela chuva do meio-dia ou perfumado com o aroma dos pinheiros. (...) Isto sabemos: a terra não pertence ao homem; o homem pertence à terra. Isto sabemos. Tudo está ligado, como o sangue que une uma família. Tudo está ligado.(...) Onde se encontra já o matagal? Destruído! Onde está a águia? Desapareceu! Termina a Vida e começa a sobrevivência."
"...Por fim talvez sejamos irmãos!"
Um forte Abraço à maneira dos Índios.
Essa carta só poderia ser escrita por um louco, uma criança ou um sábio. Um homem, como nós somos, como são os que ascendem ao poder, nunca a escreveria, com medo de ser escarnecido.
O medo do ridículo é castrador: mata o melhor que há em cada um de nós!
Abraço grande, porque meu e do Rafael,
António
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