terça-feira, 23 de dezembro de 2014

FANTASIANA E OUTROS LUGARES

E se...

Por vezes, dou comigo a pensar no que seriam os meus pais, se fossem jovens nos dias de hoje. 
Pelas suas motivações, pelas suas vivências e pelas suas práticas ao longo destes anos, acho que as suas profissões estariam ligadas à Arte. 
Começando pelo meu pai, penso que poderia ter ido por duas vias. Uma, ligada aos estudos históricos e linguísticos: sempre o vi ler muito (o primeiro livro que abri em casa, teria eu quatro ou cinco anos, era um romance histórico - vim a saber mais tarde, claro – principalmente obras com um forte cunho histórico ou biográfico). Aprendeu praticamente sozinho, com ajuda de um primo, creio que o Aníbal Paula ou o irmão, a escrever e, depois, a falar Francês (ainda tentou o Alemão). Tal facto veio a ajudá-lo quando foi para França e, depois, facilitou-me a integração na escola francesa. Por outro lado, demonstrou e demonstra curiosidade em conhecer a origem das palavras e a estabelecer relações entre as diferentes línguas, principalmente as românicas. 
A outra hipótese, mais ligada à sua profissão de carpinteiro / marceneiro, passaria pelas Belas Artes. Desenhava primorosamente. O meu primeiro livro de imagens foi um pequeno caderno com utensílios de cozinha desenhados e coloridos por ele, quando ainda 10 ou 12 anos. Era lindo. Hoje, o caderno materialmente não existe, contudo continua vivo e colorido na minha mente. Outro caderno, este com desenhos de ferramentas, mostra bem a precisão do seu traço. 
De início referi que este lado estava ligado à sua profissão, uma vez que era um artista a fazer móveis, a decorá-los com flores esculpidas, entalhes e requebes nas formas. Cheguei a ter um quarto com móveis criados e feitos por ele. Tinham formas direitas, de duas cores (azul e vermelho – os tons não eram vivos) com o bege por base e foram inspirados numa revista alemã dos anos 50. 
Agora a minha mãe. Acho que daria uma óptima economista. Sempre soube governar muito bem a casa com o pouco que ganhavam. De um escudo, bem gostaria de fazer dez! 
Mas aquela área que é o seu rosto, é sem dúvida o Estilismo. Era uma artista na confecção de todo o tipo de modelos, alguns criados por ela própria, tirando uma ideia aqui outra ali. Com diferentes tipos de tecidos dava vida a vestidos alegres, de cerimónia, para criança. Ensinou a costura, ainda com os seus 16 anos, a mais de dez raparigas que iam lá para casa aprender. 
Quando era para fazer as contas, ela tinha tudo anotado: o feitio, os avios (molas, botões, fechos...). Tudo contabilizado (lado economicista). Quem sabe se não teria sido uma empresária de sucesso na Alta Costura! 
O mais engraçado é que, realmente, eles se completam e a prova disso foi um vestido que eu tive desenhado pelo meu pai e confeccionado pela minha mãe! Dos dois, acho que herdei o gosto por várias áreas, até o de ensinar, de partilhar conhecimentos; aprendi, também, a não separar o trabalho manual do intelectual; os dois completam-se, os dois enriquecem o ser humano. 

(Este texto foi escrito ainda em vida dos meus pais.) 

 Ana Maria Santos

2 comentários:

A.Tapadinhas disse...

Bom texto para ser lido no Natal, não esquecendo que Natal é sempre que nós quisermos, também para ler!

O último parágrafo (o que está entre parêntesis, como este), para mim, foi o primeiro...

António Tapadinhas

luis santos disse...


E se... fosse todos os dias Natal?
Ou por outro lado, "Então não é que o Natal é coisa de todos os dias!".

Abraço.