Uma Revista que se pretende livre, tendo até a liberdade de o não ser. Livre na divisa, imprevisível na senha. Este "Estudo Geral", também virado à participação local, lembra a fundação do "Estudo Geral" em Portugal, lá longe no ido século XIII, por D. Dinis, "o plantador das naus a haver", como lhe chama Fernando Pessoa em "Mensagem". Coordenação de Edição: Luís Santos.
segunda-feira, 29 de junho de 2020
REAL... IRREAL... SURREAL... (402)
Nascimento a 29 de Junho de 1900, em Lyon, França
Morte a 31 de Julho de 1944, local incerto ao largo de Marselha
Antoine de Saint Exupéry foi um escritor, ilustrador e piloto francês, autor de um clássico da literatura, “O Pequeno Príncipe”, escrito em 1943.
Era o terceiro filho do conde Saint-Exupéry e da condessa Marie Fascolombe, família aristocrática empobrecida. Estudou no colégio jesuíta Notre Dame de Saint Croix e no colégio dos Marianistas, em Friburgo, na Suíça.
Em 1921 ingressou no serviço militar, no Regimento de Aviação de Estrasburgo. Tornou-se piloto civil e subtenente da reserva. Em 1926 foi admitido na Aéropostale, onde começou sua carreira de piloto de linha, voando entre Toulouse, Casablanca e Dacar.
Com a invasão dos nazis em França, Exupéry fugiu para os Estados Unidos. Nesse período, escreveu "Carta a Um Refém" e incentivado por editores americanos, que viram sua habilidade como desenhista amador, foi desafiado a fazer uma obra para crianças. Até ali, seus livros falavam de sua paixão profissional: a aviação.
Em 1943, Antoine de Saint-Exupéry voltou para a força aérea no Norte de África e tal como o Pequeno Príncipe no final do livro, Saint-Exupéry parece ter apenas desaparecido da terra, abatido por um caça alemão durante uma missão de reconhecimento, no dia 31 de Julho de 1944,.
Seu corpo nunca foi encontrado. Em 2004, foram descobertos os destroços do avião que pilotava, a poucos quilômetros da costa de Marselha, em França.
Selecção de António Tapadinhas
segunda-feira, 22 de junho de 2020
REAL... IRREAL... SURREAL... (401)
Quase Auto-retrato, Autor António Tapadinhas, 2020
Acrílico sobre Tela, 60 x 80 cm
Selecção de António Tapadinhas
sábado, 20 de junho de 2020
sexta-feira, 19 de junho de 2020
Pedro Du Bois, Poemas
APRENDENDO A VOLTAR
XXIX
voltar é a representação gráfica
do naufrágio
e
a antevisão do encontro
não acontecido
ao acaso
nos cestos os ovos permanecem
estáticos em vidas
interiores
anteriormente
pensei desenhos
decompostos em traços
onde enredei
o sentido
da lembrança
a vida explode receptáculos
e retorna como sina.
(Pedro Du Bois)
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outros poemas:
terça-feira, 16 de junho de 2020
O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA
ADEUS, ATÉ OUTRAS ÁGUAS!
E chegámos às linhas de circunstância do último dia. Amanhã a Matilde apresentar-se-á para o segundo ano e por isso eu terminarei o meu trabalho em torno dos diários.
O mundo continua louco, numa deriva terrorista que nos ameaça o modo de vida e sem que se vislumbre no horizonte uma resposta cabal para o problema.
Só espero que não venhamos a chorar lágrimas de sangue por tanta tibieza.
De Portugal só posso esperar que o pessimismo venha a ser uma benevolência, mas tudo indica que não seremos capazes de sair dos tentáculos dos polvos que atrofiam a nossa sociedade.
Estamos a caminho de um misto entre o Brasil e a Tailândia e eu só espero que as minhas filhas venham a fazer os cursos superiores no estrangeiro e que aí fiquem para as respectivas vidas pessoais e profissionais.
Nada me repugna que a minha descendência venha a ter outra nacionalidade.
Em parte gostei do que vi no dia de apresentação da Margarida.
O horário é bom, todo ele concentrado de manhã e com três tardes livres por semana. Das oito e meia às treze e trinta, permitirá à minha filha estudar e ter tempo para brincar, sequer havendo grandes alterações quanto à hora do almoço.
Para além disso, a escola tem uma boa biblioteca e um bom espaço de ludoteca em que os alunos sempre podem passar os tempos livres que por ventura tenham.
E o Director de Turma é um bom Professor de Música, cujo trabalho tivemos oportunidade de ver este ano através dos alunos da turma da Inês Ourives, uma amiga da Margarida desde os tempos do jardim de infância.
Esperemos agora para aquilatarmos da qualidade do restante corpo docente.
A turma que é a mesma da quarta classe é boa e vem muito bem preparada, assim os novos mestres saibam e consigam puxar pelos alunos que terão pela frente.
Ando agora a ler mais um volume da história da literatura mundial. (1)
Trata-se do período em que Portugal começou a afastar-se do mundo civilizado.
A Matilde, apesar da apresentação ser amanhã, ainda terá mais uns dias de férias pela frente, pois as aulas, propriamente ditas, apenas começarão na próxima quarta-feira.
“-Olha que sorte, heim pardalito!”
E eu dou por encerradas estas páginas e, com elas, os diários das minhas filhas.
Foi um trabalho e peras, devo reconhecer e acreditem que me sinto satisfeito por escrever até sempre, o que não será um adeus definitivo, pois aqueles que me vão lendo sabem muito bem que certamente voltarei em outras águas.
Alhos Vedros
16/09/2004
NOTA
(1) Ibañez, Eduardo, HISTÓRIA DA LITERATURA MUNDIAL, IV – AS LITERATURAS NO SÉCULO XVII
CITAÇÃO BIBLIOGRÁFICA
Ibañez, Eduardo, HISTÓRIA DA LITERATURA MUNDIAL, IV – AS LITERATURAS NO SÉCULO XVII, Tradução de Serafim Ferreira, Círculo de Leitores, Lisboa, 2002
FIM
segunda-feira, 15 de junho de 2020
REAL... IRREAL... SURREAL... (400)
“A Balada do Mar Salgado”
Autor Hugo Pratt
Hugo Pratt nasceu em Rímini, Itália a 15 de Junho de 1927
e morreu em Grandvaux, Suíça a 20 de Agosto de 1995.
"Tudo
começou na ponta de uma navalha: Corto Maltese, nascido a 10 de
julho de 1887, em La Valletta, marinheiro e filho de uma cigana
feiticeira andaluza e de um marinheiro britânico da Cornualha, não
gostou da linha da sorte que viu na sua mão, e resolveu solucionar o
assunto, rasgando uma mais do seu agrado. Da sua morte temos apenas
algumas pistas, numa outra obra de Hugo Pratt, “Os Escorpiões do
Deserto”, em que o guerrilheiro o guerreiro danakil Cush, em
conversa com um fascista italiano, que acabará por matar, fala do
amigo desaparecido na Guerra Civil de Espanha. Num livro sobre Corto
constará que terá morrido fuzilado em Málaga, pelos franquistas." (1)
Fez
mais de meio século, este ano, que Hugo Pratt publicou as primeiras
pranchas da “A Balada do Mar Salgado”, a obra que inaugurou a
saga de Corto Maltese.
Selecção
de António Tapadinhas
sábado, 13 de junho de 2020
Uma disponibilidade para o Tudo
A "Ilha dos Amores" e o “Quinto Império”: entre Luís de Camões, Padre António Vieira, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva
Luís Carlos dos Santos
O Padre António Vieira, o Imperador da Língua
Portuguesa, como Pessoa o designa no seu livro “Mensagem”, exemplo vivo do
homem total e do universalismo português, uma das personalidades mais distintas
e originais da nossa cultura, é herdeiro da teoria joaquimita das “Três Idades”
que são constituídas, como já se disse, pelas eras do Pai, do Filho e do
Espírito Santo, que têm correspondência na Terra a três grandes períodos
históricos, o primeiro, desde a Criação anunciada no Evangelho até à conversão
de Constantino, imperador Romano, ao cristianismo; o segundo, até à expansão da
mensagem cristã ao mundo com os Descobrimentos Portugueses; o terceiro, com a
consumação até ao final dos tempos do V Império, ou seja, da consolidação do
Reino de Deus na Terra, com a descida do Paráclito, na unificação de todas as
nações do mundo numa comunidade eclesial conforme a profecia bíblica.
Mas Vieira há-de demarcar-se de Joaquim de Flora, pois
que para si são Cristo e a Igreja, e não o Espírito Santo, os consumadores do
Reino Divino na Terra. Como nos diz Paulo Borges, “…uma igreja composta de
santos e abrangente de toda a humanidade.”[1]
Depois da queda a libertação será em Cristo. A progressiva apropriação de todos
os homens em Cristo, pela universalização da Igreja e da santidade. Ou seja, do
“fim dos tempos” em que Deus será tudo naqueles que nele transfigurados, já não
serão muitos mas Um só, suponha o necessário esforço humano de uma remoção dos
impedimentos à manifestação de tal Unidade.[2]
Seguindo Paulo Borges, “Mais do que uma realidade
histórica, determinada por contraste com tudo quanto a antecede, a real
Jerusalém Celeste é o “estado” de uma plenitude não compartimentada, em todos
transparecente e toda de todos para todos fluente, na integral comunhão
amorosa: “…porque todos perpetuamente se vêem a si mesmos, todos vêem a todos,
e todos vêem tudo. Nada se esconde ali, porque lá não há vício; nada se
encobre, porque tudo é para ver; nada se recata, ou dificulta, porque tudo
agrada; e porque tudo é amor, tudo se comunica.”[3]
Em Vieira, a ideia de Santo Agostinho sobre a existência
das “duas cidades”, “cidade dos homens” e “cidade de Deus”, correspondem à
existência de Quatro Impérios já historicamente verificados, assírio, persa,
grego e romano, e ao “Quinto Império” que estaria por vir, por construir, e que
seria português.
Vieira vai relacionar a missão de Portugal na
construção do “Quinto Império” com o que ele “encontra prefigurado no sonho de
Nabucodonosor, interpretado pelo profeta Daniel: a pedra que, sem intervenção
de mão alguma, embate violentamente nos pés de ferro e argila da terrível
estátua antropomórfica, com cabeça de ouro, peito e braços de prata, ventre e
coxas de bronze, pulverizando-a e convertendo-se numa “grande montanha” que
enche a terra inteira (Daniel, 2, 31-45). Abatendo o gigantesco ídolo de pés de
barro – símbolo dos quatro impérios e dos poderes mundanos (…) e da própria
história enquanto exílio do Paraíso original -, a pedra, figura do Messias, do
Cristo, ou da consciência desperta e livre, converte-se na montanha cósmica,
símbolo da totalidade e do eixo que une céu e terra, espírito e matéria,
transcendência e imanência.”[4]
É a missão da consolidação do Reino de Deus na Terra
em que Vieira vê Portugal como o seu mais elevado representante, desde a
aparição e profecia de Cristo a D. Afonso Henriques, antes da Batalha de
Ourique quando lhe diz: “Vai e funda o meu Reino.” Cristo faz de Portugal a
vanguarda do seu crescimento terreno, compreendendo-se que na consumação do
império português a própria “potência” divina resulte “sublimada.”[5]
A Missão de Portugal é, pois, a de fundação de um
Reino de Deus na Terra, fundado não para fins políticos como acontece com
outras nações, mas com um fim apostólico que lhe é particular. É esse também o
objetivo primordial dos Descobrimentos Portugueses.[6]
Como refere Agostinho da Silva, “O Vieira falava do
mundo redimido, do mundo restituído plenamente ao Cristo (…) Afinal o povo
português tinha o ideal de cumprir Cristo! (…) e que esse mundo perfeito tinha
que ser fabricado por portugueses e por espanhóis.”[7]
Para o nosso autor, a profecia de Vieira está
concretizada até à parte em que Portugal se autonomizou das colónias que
administrava, acabando assim também por se libertar a si próprio, “O nosso
ideal é que cada homem seja um universo nele próprio. O nosso ideal é que cada
comunidade seja um universo nela própria. (…) Portugal está autónomo. Os outros
bocados do que era Portugal autónomos estão. Mas isso não impede que haja entre
eles relações de franqueza, não de política, e de atenção ao que neles há de
comum para que se ressuscite um conjunto de comunidades capazes de partirem
para um projecto que todos aceitem.”[8]
A obrigação hoje de cada português é a de pensar o
mundo inteiro em paz com plena liberdade de pensamento em cada um. Claro que a
paz e a liberdade devem ser construídos por todos, e não será obra exclusiva de
portugueses. Mas, diz Agostinho, “o que acontece é que eu nasci em Portugal! O
que acontece é que eu me fiz num país, o Brasil, que fala português, que tenho
conhecimento de outras terras que falam português, pelo menos oficialmente, e
que a minha primeira atenção vai para esses. A minha primeira atenção vai para
os que estão mais perto de mim.”[9] E,
por outro lado, cada vez que Portugal seguiu mais outros países que não o seu
próprio íntimo, Portugal falhou. “ Então eu realmente quero pensar o problema,
desejo pensar o problema quanto possível no âmbito possível dos povos que falam
português ou espanhol. Depois veremos os outros. Por enquanto, eu não quero
implicar os outros nesta história, porque de cada vez que eles entraram na vida
portuguesa e na vida espanhola atrapalharam muito a outra que estava correndo
bastante bem. É o problema que se põe agora com a CEE.”[10]
Voltando ao nosso Padre, Vieira tal como Camões ambos
sustentaram que no tal mundo divinizado corpo e espírito ambos se conservam em
liberdade. Em Camões isso aparece de forma muito mais ampla que em Vieira,
eventualmente, pela influência que poderá ter recebido da filosofia oriental.
Não se sabe. De qualquer forma, “um homem superior acaba por ser ao mesmo tempo
do Ocidente e do Oriente. (…) E é a isso que devemos rumar.”[11]
Pessoa tem uma ideia diferente de Vieira sobre Quinto
Império. Em Vieira o princípio dinâmico é mais político, em Pessoa mais
unipessoal. “É que ao passo que o caso de Vieira é um caso político, o caso do
Quinto Império do Pessoa é um império em que cada homem e cada mulher se
soltem, um império que eles próprios exercem sobre si mesmos. Que cada homem e
cada mulher possa atingir um ponto em que tenha a absoluta liberdade.”[12]
Mas Vieira também não seria contra essa conquista de
liberdade, simplesmente, o caminho para lá chegar é diferente, o que é normal
porque Vieira e Pessoa são personalidades históricas muito diferenciadas… “O
próprio Camões o tinha pensado assim na Ilha dos Amores. Ali não há nenhum
aspecto de limite à liberdade, está-se fora do tempo e fora do espaço, até
disso se soltaram os homens. (…) Ao passo que o Vieira é, digamos, o político
do colectivo, o Fernando Pessoa aparece como político do individual.”[13]
Seguindo as palavras de Agostinho, “O Vieira tem por
último ideal, porque não podia ter outro, que o império que ele deseja
construído por portugueses seja um império sem imperador, um império que os
homens vivam numa fraternidade humana e numa compreensão divina, sem que nenhum
homem mande em outros homens, sem que nenhuma nação mande em outra nação.
Quando ele diz que o Quinto Império é instaurado por Portugal, não quer dizer
que Portugal continue como imperador.”[14] O
Vieira “era um homem de Brasil e Portugal, ele pensava fundamentalmente como é
que vamos unir essas duas coisas, problema que ainda hoje anda por aí. Para já
não falar das outras colónias ou províncias ultramarinas mais recentes. O
Fernando Pessoa talvez tivesse achado que o grande caminho para isso não era a
política que fez o Vieira e que ele perdeu… O Pessoa, já que ele não se sentia
com capacidade de acção junto dos outros, talvez ele tivesse achado que o
importante dele era aprofundar-se e soltar-se a si mesmo antes de soltar os
outros. E quem sabe se não é esse realmente o caminho mais certo?”[15]
Mas Agostinho não deixando de reconhecer a importância
dos dois pensadores portugueses e que, no fundo, embora as diferenças sejam
substanciais, como diferentes são as épocas em que ambos viveram, não deixa de
relevar o objetivo comum que os une, o que o leva a afirmar que “talvez o
melhor seja juntar os dois e chamar-lhes Fernando Vieira…”[16]
Fernando Pessoa decidiu pôr-se à disposição de tudo o
que aparecesse, do imprevisível, e aqui coloca-se a questão do Espírito Santo
como a entidade do imprevisível de tão grande importância para o nosso
Professor. “ E quando o São João diz no Evangelho, pondo as palavras na boca de
Cristo, que será o Espírito santo o verdadeiro consolador dos homens, ele está
a tirar a ideia de que pode haver um consolador muito mais válido, muito mais
amplo do que o próprio Cristo. Um consolador que não venha curar as feridas e
consolar o desastre, mas um consolador que venha de dentro pondo o espírito
criador em perfeita liberdade. A verdadeira libertação dos homens, a verdadeira
revolução seria pôr em perfeita liberdade o criador, o poeta que provavelmente
todos os homens são. Não é o político, o poeta!”[17]
Então se pensarmos num império universal, que sirva um
e outro lado, tanto o Vieira como o Camões têm limitações, porque defendem o
Deus ocidental, ou seja o Todo. Já em Pessoa encontramos pela primeira vez a
ideia de um Deus que é tudo, mas tem ao mesmo tempo a ideia de um deus que é
uma disponibilidade.
Então, para Fernando Pessoa, “um império instaurado
por gente do tipo português, essa unidade do mundo, em lugar de império podemos
chamar-lhe uma unidade do mundo, essa unidade do mundo teria como filosofia e
como teologia uma que declarasse verdadeiros todos os seus aspectos: o aspecto
de tudo e o aspecto do nada. E podia unir isso não como alguma coisa
contraditória à maneira do zen, como alguma coisa que tivesse dois aspectos
contrários na sua unidade, mas por exemplo como alguma coisa que nós pudéssemos
representar pela palavra disponibilidade.”[18]
Portanto, Agostinho da Silva vê uma perfeita linha de
continuidade entre Camões, Vieira e Pessoa, embora pesem os diferentes tempos
em que viveram e a inevitabilidade de serem influenciados pelas ideias de seu
tempo. No fundo, Camões, Vieira e Pessoa são heterónimos do desejo de que haja
no Mundo alguma coisa que seja a realização plena do homem. Ou, concluindo com
palavras suas, “entendendo que o homem não é apenas esta coisa que vive aí uns
anos e morre, mas que é alguma coisa de eterno, como uma centelha de fogo. É a
centelha que se apaga, mas é também o fogo que sempre existe no mundo, qualquer
aspecto que tomemos! Então o Camões, Vieira, Pessoa são aspectos de várias
épocas, de várias tonalidades, de vários temperamentos, com o mesmo ideal de
que haja no mundo alguma coisa que seja a realização plena do homem. A ideia de
que essa realização plena não existirá se nós escolhermos, se fizermos tal
coisa e abdicarmos de tal outra! Mas que essa realização plena é a
disponibilidade para tudo. Uma disponibilidade que é ao mesmo tempo quieta,
sentada, passiva, e uma disponibilidade que tem um ideal. É a disponibilidade
para o tudo, nos vários aspectos com que o tudo nos aparece.”[19]
Quando Camões fez, no regresso da viagem de Vasco da
Gama à Índia, os nautas aportarem na Ilha dos Amores abriu um “rasgão” no tempo
e no espaço. De facto, essa ilha não existe. Não há rota, ninguém sabe que
caminho os navegantes percorreram. “Os fenómenos desaparecem. Isto é, o Camões
declara afinal, de outra maneira, que, para chegar àquela verdade absoluta que
é a divinização do homem sem perder o humano, tem que se ultrapassar todo o
mundo dos fenómenos. Estamos ultrapassando? Estamos desde o Descartes.”[20]
“Então, agora trata-se de inventar uma política
adequada ao regresso para tornar a partir. E tornar a partir não é
evidentemente para ir a qualquer espécie de fenómeno, é para tornar a ir outra
vez meter-se no rasgão do espaço e ir para além da ilha dos Amores (…) Dizer
Ilha dos Amores ou Quinto Império, vamos a isso, é mais completo até! Então o
que se trata de fazer agora de mais importante é uma arrumação interna de
Portugal que está bastante desarrumado.”[21]
(SANTOS, Luís Carlos dos (2016) Agostinho da Silva: Filosofia e Espiritualidade, Educação e Pedagogia. Vila Nova de Gaia: Euedito, pp.134-140)
[1] Paulo Borges, A
Pedra, a Estátua e a Montanha, o V Império no Padre António Vieira, Lisboa,
Portugália, 2008, p.65
[2] Cf., idem: 73
[3] Idem: 95, cf., Padre António Vieira, Sermoens, 2, pp.189-192.
[4] Idem: 21e 22
[5] Idem:129, cit. Padre António Vieira, Clavis Prophetarum, liv. 2º, cap. 13, XI, p.523
[6] Cf., idem: 130
[8] Idem: 110
[9] Idem: 110
[10] Idem: 110
[11] Idem: 108
[12] Idem: 115
[13] Idem: 115-116
[14] Idem: 115
[15] Idem: 116
[16] Idem: 116
[17] Idem: 117
[18] Idem: 120
[19] Idem: 123
[20] Idem: 126
[21] Idem: 127
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Ilha dos Amores,
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Quinto Império
quarta-feira, 10 de junho de 2020
Do mar, da floresta, da pedra, do ritmo e do infinito
Risoleta Conceição Pinto Pedro
(Foto: Café Central, Sesimbra, 1990. Rafael Monteiro, António Reis marques, AntónioTelmo)
Num texto intitulado "Teixeira de Pascoaes" inserido nas suas Páginas Autobiográficas, António Telmo conta que, quando «era moço, pelos meus vinte anos, enviei a Pascoaes um soneto que tinha como tema a magia poética da Lua Plena». O poeta não lhe respondeu e ele confessa: «envergonhado, não contei nada aos amigos».
Quem eram esses amigos? Nesta idade, eram amigos de Sesimbra, que, diz ele, andavam «todos então pelos arredores da filosofia portuguesa». Por aquilo que vamos lendo e ouvindo aos raros que podem hoje testemunhar, porque lá estiveram, como é o caso de António Reis Marques, e o próprio Telmo conta, liam «Teixeira de Pascoaes uns aos outros, ansiando ser em espírito levados nas ondulações dos misteriosos versos», a lembrar, e agora é da minha responsabilidade, Camões n’Os Lusíadas: «estava-se co as ondas ondeando». Segundo diz o organizador das Obras Completas de António Telmo, Pedro Martins, em nota de rodapé, faziam também parte deste grupo, para além de António Reis Marques, Rafael Monteiro, José Preto e Gilberto Pinhal.
Quem eram esses amigos? Nesta idade, eram amigos de Sesimbra, que, diz ele, andavam «todos então pelos arredores da filosofia portuguesa». Por aquilo que vamos lendo e ouvindo aos raros que podem hoje testemunhar, porque lá estiveram, como é o caso de António Reis Marques, e o próprio Telmo conta, liam «Teixeira de Pascoaes uns aos outros, ansiando ser em espírito levados nas ondulações dos misteriosos versos», a lembrar, e agora é da minha responsabilidade, Camões n’Os Lusíadas: «estava-se co as ondas ondeando». Segundo diz o organizador das Obras Completas de António Telmo, Pedro Martins, em nota de rodapé, faziam também parte deste grupo, para além de António Reis Marques, Rafael Monteiro, José Preto e Gilberto Pinhal.
Acrescenta Telmo que Pessoa dizia dos versos de Pascoaes que «eram extraordinários, mas que uma vez lido um estavam lidos todos». Por sua vez, numa carta a Pascoaes, o espanhol Unamuno «aconselhava Teixeira de Pascoaes a encurtá-los, pois cansavam pela melancolia».
E Telmo, certeiro, comenta que «um e outro não eram decerto capazes de passar horas a olhar o mar, a vê-lo onda após onda desfazerem-se na praia, procurando observar a diferença qualitativa de cada rebentação, o tom de verde e azul na espuma branca.»
Não lembra a ninguém criticar o autor d’Os Lusíadas por ter feito a epopeia demasiado grande, acusar o criador de ter feito o mar demasiado extenso ou o ritmo das ondas demasiado igual. Até porque, como refere Telmo, a rebentação não é toda igual nem o é o tom das cores na espuma. Mas assim são os comportamentos da humanidade, não digo a natureza humana, porque, como diz Agostinho, já recebemos tantas influências que é difícil saber hoje o que é a natureza humana. Mas sabemos como são alguns comportamentos humanos. Em muitos existe um polícia a criticar nos outros aquilo de que não gosta, e isto verifica-se até ao nível dos criadores. Poemas demasiado longos, poemas demasiado melancólicos… deviam ser encurtados. O ser humano comporta-se como um bebé que chora, sempre que o mundo não corresponde às suas expectativas. O problema é que frequentemente as expectativas são baixas e quantas vezes aqueles que estavam acima das expectativas exigidas não tiveram de ser eles a “encurtar-se”, a diminuir-se. Para alguns, não se pode ser grande, neste mundo.
Telmo via mais alto. Ele sabia que os longos poemas de Pascoaes, como os do próprio Pessoa através do seu heterónimo Campos, como os versos do poema de Deus chamado “Mar” em rebentação na praia de Sesimbra, não são mais que uma tentativa e uma oportunidade para quem cria e para quem desfruta, de aprender e em suma, de apreender o infinito.
No entanto, para podermos aperceber-nos dessas diferenças que imprimem as ondas no seu original rebentar, precisamos saber parar, rendermo-nos ao ritmo só aparentemente monótono.
A vida é ritmo. Por isso a poesia, esse lugar do ritmo, nos é tão essencial. Vida é alternância. Daí à noite seguir-se o dia; à lua plena com que o jovem Telmo construiu o malogrado soneto, o quarto minguante; a uma estação outra diferente, e assim sucessivamente. Porque se é ritmo, nunca é igual. Aliás, é precisamente por ser ritmo que nunca é igual, e a condição para a emoção da diferença é entregarmo-nos à disciplina da observação da repetição na alternância. Pessoa e Pascoaes são dois enormes autores com que a grande poesia universal cria, ela própria, um grande ritmo, na alternância dos estilos. E não tão divergentes como possam parecer, nos seus azuis-rio, nos seus verdes-serra.
António Telmo viveu em Sesimbra desde a sua adolescência e por isso cedo acostumou os olhos à subtileza das diferenças e à grandiosidade do mar, esse mestre da eternidade.
O facto de o poeta Pascoaes não ter reagido ao seu soneto, não o impediu de continuar a admirar a imponência do poeta da serra, pois nele via o ondular das florestas como ondas de um grande mar verde. Aqui em Sesimbra amadureceu o alfabeto poético na contemplação do mar e no contraste com a serra irmã tão próxima. Essa serra cuja presença e lembrança há-de acompanhá-lo até ao tempo em que o grupo da filosofia portuguesa se viria a reunir na Brasileira do Rossio, mais tarde transformada em estabelecimento bancário. Mas dessa altura guarda a «impressão de duas colunas de mármore castanho e brilhante da Arrábida numa casa comprida, escura e cheia do fumo dos cigarros. De um e de outro lado, espelhos paralelos multiplicavam as suas imagens até ao infinito». Como ondas que viessem rebentar uma em frente à outra. Porque tudo se encontra ligado. Como já estava ligado aos grupos das várias futuras tertúlias; na pertença ao inocente mas determinante grupo que se reunia no Café Central de Sesimbra. Como dito, mais tarde viria a integrar outras tertúlias de grandes nomes da filosofia portuguesa, mas foram os primeiros passos aqui dados com os seus companheiros, com o som do mar nos ouvidos e os olhos na serra, que lhe permitiram amar Pessoa sem trair Pascoaes e vice-versa, abrir o coração ao infinito mundo da poesia onde cabem todos os poetas e onde os poemas podem ser tão longos como tendo um único verso, aquele com que se criou o mundo pela divina «ambição primordial», como diria Pascoaes. E Telmo, esse grande e discreto ser, não deixaria de admirar.
No entanto, para podermos aperceber-nos dessas diferenças que imprimem as ondas no seu original rebentar, precisamos saber parar, rendermo-nos ao ritmo só aparentemente monótono.
A vida é ritmo. Por isso a poesia, esse lugar do ritmo, nos é tão essencial. Vida é alternância. Daí à noite seguir-se o dia; à lua plena com que o jovem Telmo construiu o malogrado soneto, o quarto minguante; a uma estação outra diferente, e assim sucessivamente. Porque se é ritmo, nunca é igual. Aliás, é precisamente por ser ritmo que nunca é igual, e a condição para a emoção da diferença é entregarmo-nos à disciplina da observação da repetição na alternância. Pessoa e Pascoaes são dois enormes autores com que a grande poesia universal cria, ela própria, um grande ritmo, na alternância dos estilos. E não tão divergentes como possam parecer, nos seus azuis-rio, nos seus verdes-serra.
António Telmo viveu em Sesimbra desde a sua adolescência e por isso cedo acostumou os olhos à subtileza das diferenças e à grandiosidade do mar, esse mestre da eternidade.
O facto de o poeta Pascoaes não ter reagido ao seu soneto, não o impediu de continuar a admirar a imponência do poeta da serra, pois nele via o ondular das florestas como ondas de um grande mar verde. Aqui em Sesimbra amadureceu o alfabeto poético na contemplação do mar e no contraste com a serra irmã tão próxima. Essa serra cuja presença e lembrança há-de acompanhá-lo até ao tempo em que o grupo da filosofia portuguesa se viria a reunir na Brasileira do Rossio, mais tarde transformada em estabelecimento bancário. Mas dessa altura guarda a «impressão de duas colunas de mármore castanho e brilhante da Arrábida numa casa comprida, escura e cheia do fumo dos cigarros. De um e de outro lado, espelhos paralelos multiplicavam as suas imagens até ao infinito». Como ondas que viessem rebentar uma em frente à outra. Porque tudo se encontra ligado. Como já estava ligado aos grupos das várias futuras tertúlias; na pertença ao inocente mas determinante grupo que se reunia no Café Central de Sesimbra. Como dito, mais tarde viria a integrar outras tertúlias de grandes nomes da filosofia portuguesa, mas foram os primeiros passos aqui dados com os seus companheiros, com o som do mar nos ouvidos e os olhos na serra, que lhe permitiram amar Pessoa sem trair Pascoaes e vice-versa, abrir o coração ao infinito mundo da poesia onde cabem todos os poetas e onde os poemas podem ser tão longos como tendo um único verso, aquele com que se criou o mundo pela divina «ambição primordial», como diria Pascoaes. E Telmo, esse grande e discreto ser, não deixaria de admirar.
Texto partilhado, com publicação no Jornal Raio de Luz, Maio 2020
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António Telmo,
Risoleta Conceição Pinto Pedro
terça-feira, 9 de junho de 2020
O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA
As férias estão a chegar ao fim.
Amanhã será o dia de apresentação da Margarida e no dia seguinte o da Matilde.
Hoje foi então o primeiro dia de ginástica em que o pardalito não contou com a companhia da irmã mais velha.
Tal como tínhamos visto com a Sofia, integrámo-la na classe seguinte e gostei de ver como a minha querida filha se adaptou facilmente ao convívio com os mais velhos e aos novos exercícios.
Inicialmente esteve em silêncio, embora tenha ajudado no transporte dos materiais, após o que se sentou sozinha a um canto. Depois reparou em outras duas miúdas mais novinhas e juntou-se a elas.
Mas o que me deixou todo satisfeito foi vê-la repetir os exercícios com toda a concentração e sempre bem executados; a Professora dizia o que eles tinham que fazer, a pardaloca olhava para o lado, via como os mais velhos faziam e, em acto continuo, tratava de os imitar.
Serena vai a noite, como sereno vai o crescer da minha pardalada adorada.
Eu não tenho razões para me sentir um homem feliz?
Alhos Vedros
15/09/2004
segunda-feira, 8 de junho de 2020
REAL... IRREAL... SURREAL... (399)
Cristo na Casa de seus Pais, Sir John Everett Millais, 1849/50
Óleo sobre Tela, 86,4 x 139,7 cm
Falecimento: 13 de Agosto de 1896, Kensington
Sir John Everett Millais, 1º Baronete de Millais of Palace Gate and Saint Ouen, Jersey foi um pintor e ilustrador inglês e um dos fundadores da Irmandade Pré-Rafaelita. Uma criança prodígio, aos 11 anos tornou-se o estudante mais jovem a ingressar na Academia Real Inglesa.
Este quadro, Cristo na Casa de seus Pais, levantou grande polémica por causa de seu realismo na representação de Jesus Cristo.
in Wikipedia
Selecção de António Tapadinhas
quinta-feira, 4 de junho de 2020
Graffitar a literatura (IV)
"Conta-me histórias... de pescarias"
«Pescador de cana mais come do que ganha.»
(provérbio)
Este é um ‘pormaior’ de um mural que ocupa toda a fachada de uma velha casa na Rua Nova da Alfarrobeira, 16A, em Cascais (‘património’ do Muraliza 2014).
Trouxe-me à memória dois capítulos do romance de Cristóvão de Aguiar (1978) Raiz Comovida (A Semente e a Seiva). Esta obra inicia uma «trilogia romanesca», a que se seguiu Vindima de Fogo (1979), O Fruto e o Sonho (1981); estes três romances, a partir da edição da Caminho de 1987, ficaram reunidos num só volume.
O escritor açoriano Cristóvão de Aguiar, de origens populares (avô tanoeiro e pai serralheiro) e «um virtuoso da língua» (Leocádia Regalo, 2008), soube transportar para a literatura, designadamente neste livro, a oralidade da etno-língua de camponeses e pescadores da Ilha de São Miguel. Daí, a obra incluir um precioso glossário com 154 «açorianismos, arcaísmos e americanismos».
«o Ti António Rosado não foi nado e criado aqui na nossa freguesia, era natural do lugar das Calhetas, a dois passos da última casa pra quem vai pela Tronqueira abaixo; (…)
o charrinho grado e fresco, as vejas, as garoupas, as abróteas, a petinga, os blinguéis, os bonitos, as tainhas, eu sei lá, vêm de Rabo de Peixe e das Calhetas freguesias à beira-mar; (…) mesmo estando à beirinha do mar do Norte, o lugar das Calhetas tem poucos homens do mar: meia dúzia de famílias; (…)
o Ti António Rosado não se podia dizer que fosse um pescador do alto, mas a família era dessa qualidade, pai e irmãos, pra não falar dos que estavam para trás; o Ti Rosado era o terçô de uma ranchada de nove filhos, cinco machos e quatro femas; ou porque era mais enfezadinho ou por outra coisa qualquer, o certo é que se meteu a aprender a arte de sapateiro, (…)
mesmo assim, o Ti Rosado avezou-se a ir todos os domingos assentar-se em riba de um pesqueiro e ali passava horas esquecidas, um caniço de pesca na mão e uma paciença de corno esperando que algum peixinho picasse a isca; em chegando à idade das sortes, lá foi ele juntamente com os da sua criação à Ribeira Grande, mas mandaram-no embora livre de todos o serviço, (…)
vai daí, o rapaz, (…) meteu-se a taberneiro; arranjou umas patacas a juro e lá montou uma lojeca em riba da barreira que desce prò Calhau do Porto; nessa altura, o home já era muito calado e metido na concha como um caracol não havia que ver, era o chamadouro do mar dentro dele como um búzio; os pescadores vinham-lhe beber os cales de cachaça e os quartilhos de vinho de cheiro e por lá se demoravam em conversas arrastadas de mar e pescarias, que deviam encher as medidas ao rapaz cismado; se o tempo andava de feição e a taberna ficava às moscas, não pensava duas vezes, fechava a porta da venda, descia o carreirinho empinado prò Calhau e ia-se empoleirar no pesqueiro do costume, a cana-da-índia na mão, os olhos caídos no lombo daquele mistero de água desarida; andou ele neste fado anos acrescentados, a alma alfinetada, via-se-lhe na cara, e nenhum bicho-careta se chegou à sua beira pra perguntar-lhe se estava sofrendo de algum moleste ruim; todos pensavam: aquilo é a natureza que puxa pràli, só Nosso Senhor é que deve saber o fundamento daquela cisma» (pp. 156-8, Amadora: Bertrand, 2ª edição, 1980)
«o Ti António Rosado lá se desfez com lágrimas nos olhos da lojeca em riba da barreira do Calhau do Porto: os seus ouvidos nunca mais iam escutar as istoras dos pescadores, quando o mar estava brabo e não podiam ir à faina; nunca mais se ia escapulir pelo carreirinho empinado que ia ter ao calhau pra passar horas esquecidas em riba do pesqueiro longe de si e do mundo; mas de umas coisas não quis ele desfazer-se: do caniço de cana-da-índia, da latinha do isco e da cestinha de asa, onde guardava a pescaria; todas estas coisas trouve consigo como dote prà sua nova freguesia» (p. 160)
Não há pescador sem estórias do arco-da-velha.
Sabemos que o que nos narram está longe da precisão e do rigor dos factos; em particular, sobre o tamanho do pescado. Mas todos eles são contadores de estórias: do mar, do peixe e de temporais. E nelas são, por norma, os “heróis”.
Este velho “lobo-do-mar”, do mural que Mário Belém concebeu, conta-nos estórias que já têm “barbas”…
Por isso, vou-me antes ao Guincho fazer um lance e “volto já” (ou seja, no próximo mês com outro «Graffitar a literatura»).
Post-scriptum (pessoal qb)
Cristóvão de Aguiar (1940-) licenciou-se em Filologia Germânica na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (com a tese O Puritanismo e a Letra Escarlate, 1971); foi obrigado a interromper os seus estudos por ter sido mobilizado para a Guerra Colonial na Guiné (1965-67). Foi professor na Escola Industrial e Comercial de Leiria (1969-72) e depois na FCT-UC como tradutor (1972) e Leitor de Língua Inglesa.
Recebeu vários prémios literários – P. Ricardo Malheiros da Academia das Ciências de Lisboa 1979 (Raiz Comovida), P. Conto RDP/Açores 1979, G.P. de Literatura Biográfica da APE/ CM do Porto (Relação de Bordo I, 1999), P. Literário Miguel Torga/ Cidade de Coimbra (Trasfega, 2002) – e foi agraciado, em 2001, pelo Presidente da República com o grau de Comendador da Ordem Infante Dom Henrique.
Tive o prazer de entrevistar este escritor micaelense em 28/04/01, em Lisboa; viria a ser publicada no jornal a Página da Educação, nº 105, Agosto/Setembro 2001, pp. 24-25 com o título “Cristóvão de Aguiar tinha medo da escola”; posteriormente, uma versão mais completa seria incluída no meu trabalho A Voz da Escrita: a escola na palavra dos escritores (ESE-IPS, 2002: 191-205).
A Editora Dom Quixote viria a incluir na contracapa – de reedições revistas e remodeladas de 2003, dos seus livros Transfega e Raiz Comovida – uma foto do escritor que eu lhe tirara durante a nossa aprazível conversa, tida no Centro Comercial Residence, ao Saldanha.
Conheci (literariamente) Cristóvão de Aguiar ao ler Ciclone de Setembro (1985) que me tinha calhado em sina, em Outubro de 1986, num dos sorteios mensais (no âmbito do 15º aniversário) que a (extinta) revista O Professor promoveu entre os seus assinantes.
O escritor, a dado passo da supracitada entrevista, afiançava-me:
«Não quero ser marginal mas gosto de estar à margem. Gosto pouco de aparecer.»
Mas nós gostamos mesmo (muito) de o ler!
Luís Souta
(texto e fotos)
Etiquetas:
Graffitar a Literatura,
Luís Souta
quarta-feira, 3 de junho de 2020
EG 123
ESTUDO GERAL
mai/jun 2020 Nº123
Sumário
à Língua Portuguesa
graffitar a literatura
poesia
uma rosa
pedagogia da situação
real…irreal…surreal…
diarística
diálogos
------------------------------ ---Fim de Sumário----------------------- -----------
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