sexta-feira, 19 de agosto de 2011

ENCONTROS COM AGOSTINHO

NAMORANDO O AMANHÃ
(2ª. Edição)

6. BRASIL, EXEMPLO DE MUNDO E OBRA PORTUGUESA

Meus amigos, quando os portugueses chegaram ao Brasil já havia um tratado que se chamava o Tratado de Tordesilhas que marcava uma linha, a partir da qual o Brasil era todo praticamente dos espanhóis e havia umas tirinhas de Brasil para o lado dos portugueses.

O português desembarcou e coitados dos espanhóis. Estavam seguros de que o português ia respeitar a linha.

E eu costumo contar a seguinte história.

A primeira vez que um português dormiu no Brasil, olhou para os lados e quando viu que toda a gente estava a dormir e ninguém dava por nada, foi com todo o cuidado, pegou no meridiano de Tordesilhas e pôs um bocadinho mais para lá..

Foi andando assim ano após ano.

Meus amigos, levou duzentos e cinquenta anos a carregar o meridiano aos bocados.

E quando achou que já era de mais que os espanhóis, apesar de não entenderem nada da ciência dos portugueses e de julgarem que os portugueses eram como o ambiente deles e ficavam quietos, quando viram que já era de mais, então resolveram falar aos espanhóis e dizer-lhes:

“-Até agora temos feito uns mapas que não eram exactos, sabem? A gente não sabia bem como eram as coisas, mas agora chegamos a um ponto em que já sabemos como é que é. E vamos ver se então fazemos um acordo entre nós. Há uns territórios que são indispensáveis a vocês espanhóis, há uns territórios que são muito úteis para nós e o melhor é trocarmos uns com os outros e ficarmos todos em boa paz.”

E os espanhóis disseram:

“-Óptimo!”

“-Então aí vai o mapa.” –Mandaram para o Rei. “-Para Vossa Majestade ver como é que é, se concorda ou não.”

E mandaram o mapa.

E como tinham pouca confiança que o Rei espanhol entendesse o que era o mapa e visse o que era para um lado e para o outro, eles puseram um fio no meio do mapa, a marcar aquilo que davam aos espanhóis e aquilo que dos espanhóis queriam receber.

O Rei olhou para o mapa e naturalmente disse para a mulher:

“-Menina!... Que gente generosa são estes portugueses. Olha o que eles nos dão e olha o bocadinho que eles querem para eles.”

E assinou o Tratado que se chamou Tratado de Madrid, em 1750, duzentos e cinquenta nos depois de Cabral ter abordado o Brasil.

O mapa era falso.

O mapa tinha inchado extraordinariamente as terras que os portugueses davam aos espanhóis e Mato Grosso que é do tamanho de Angola e Goiás que tem mais de dois mil quilómetros de Norte a Sul, eram umas tirinhas de terra que estavam ali em frente da América espanhola.

E foi assim que o Brasil tem o território que é hoje.

O Brasil foi a maior coisa que se fez no mundo que é a receita para todo o mundo se entender.

Eles ali juntaram, uns por cima, outros de qualquer maneira, eles ali juntaram o quê?

Os portugueses juntaram o Oriente que já lá estava –todos aqueles índios tinham vindo da Ásia. Numa altura em que no mundo houve grande frio, a água gelava, não caía em chuva, o nível do mar desceu e era possível passar por terra, sempre da Ásia para a América do Norte. Aquela gente foi descendo, quarenta mil depois de terem iniciado a marcha, eles chegavam ao Brasil mas eram parentes dos chineses e japoneses, eram, portanto, gente do Oriente- depois chegaram os portugueses e atrás dos portugueses muitos outros europeus que foram representar o continente, digamos, dos brancos e depois como era preciso gente para trabalhar a terra, os portugueses foram e trouxeram os africanos, contra a vontade deles, trouxeram para o Brasil e juntaram ali a África.

Então o Brasil é fundamentalmente o primeiro país do mundo, imaginado pelos portugueses e pelos portugueses realizado, para reunir gente dos três grandes continentes do mundo, da Ásia, da Europa e da África, povoando a América em que só havia, naturalmente, esse do Oriente que eram os índios.

E que vai suceder no futuro?

Meus amigos, vamos olhar o que é a Europa.

Hoje diz-se, Portugal está integrado na Europa.

Então vamos supor que amanhã, um de nós, feiticeiro, sujeito extraordinário no mundo, podia cercar a Europa com um muro e dizer:

“-Portugal fica do lado de cá do muro à espera de criar uma boa porta para entrar na Europa.”

Não podia demorar muito, porque hoje sabe-se que daqui a quinhentos anos, se ninguém entrar na Europa, se ficarem só aqueles que lá estão, como não nascem meninos, não vai haver mais europeus. Os meninos não estão nascendo na Europa. Como se costuma dizer, a natalidade é negativa.

Os que lá estão estão envelhecendo cada vez mais, daqui a pouco morre tudo, não nasce mais ninguém e eu até às vezes digo que deviam começar a fazer ao lado do jardim zoológico, em Sete Rios, um jardim para ter os restos dos alemães e ingleses para as crianças poderem estudar.

Bom, felizmente não vai suceder nada disso. O que vai suceder é que vai imigrar muita gente para a Europa.

E que gente vai emigrar?

Vão emigrar latino-americanos, aqueles que os portugueses fizeram no Brasil e os espanhóis fizeram na América espanhola; vão emigrar, já estão emigrando, muitos africanos, do Norte de África e do resto de África e vai correr muita gente chinesa do Oriente.

Então podemos dizer, amanhã que vai ser a Europa?

Vai ser um novo Brasil.

Não a falar só português. Vai falar várias línguas e depois se vê quais são as línguas que vão ficar mais usadas por tofda aquela gente.

Mas é outra vez gente de todos os continentes, gente de todas as culturas, gente de todas as cores que se vai juntar ali e fazer alguma coisa nova que é uma nova Europa, ajudá-la a fazer-se por aquilo que os portugueses e de algum modo os espanhóis criaram no mundo.

Mas a Europa é uma terra que sempre tem procurado espalhar-se pelo mundo.

Amanhã vai espalhar-se.

Então a ideia que podemos ter do mundo é que, amanhã o mundo, em toda a parte haverá gente de várias culturas e haverá gente de várias raças, quer dizer, o mundo, um dia, vai ser todo ele, aquilo que este pequeno povo sonhou para o Brasil.

E essa ponte se vai fazer do modo que eu quiser.

Com uma condição. A tal condição de fazermos da estrada que existe com buracos, uma pista da qual se vai levantar voo para todos os lados.
(continua)

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