Agostinho da Silva e a "Ilha dos Amores"
pintura de Hieronymous Bosch
Agostinho da Silva encontra grandes semelhanças entre
as ideias de Quinto Império tal como foram definidas pelo Padre António Vieira
e por Fernando Pessoa, tal como vê semelhanças entre essas ideias e as de Luís
de Camões nos Lusíadas, muito particularmente
quando se refere à Ilha dos Amores
(Canto IX).
Na viagem capitaneada por Vasco da Gama, quando os portugueses deixam a Índia e empreendem o caminho de regresso, Camões vai assinalar um encontro
inesperado que aguardava pelos nautas. Em pleno Índico, por obra divina
“aqueles marinheiros portugueses, aquela esquadra de Gama que volta, não trazia
nenhuma carta geográfica, nenhum dos pilotos tinha pensado naquela
possibilidade e é uma Deusa de fora, é a força interna do mundo, é a máquina
interna da História que leva a Ilha dos Amores para diante dos navios
portugueses.” (Conversas com Agostinho da Silva, entrevista de Vítor Mendanha,
Lisboa, Pergaminho, p.74)
Não foi preciso que os marinheiros fizessem nada. Foi,
por assim dizer, o destino, os deuses nas palavras de Camões, que acabaram por
fazer esses marinheiros, por serviços prestados, serem premiados com uma
realidade transcendental caracterizada pelo Amor que mais do que grandes feitos
na Terra acabam por conjugá-la com a perfeição de um mundo divino. “ É um
comportamento que se caracteriza por estarem apaixonados por toda a espécie de
fenómeno que lhes aparece nessa ilha, sem que possamos ali entrar com os
preceitos morais do bem e do mal, do lícito e do ilícito que nós,
continuamente, usamos na vida. É como se eles tivessem entrado em alguma coisa
na qual tivessem plena licença de serem homens inteiramente livres. São as
ninfas, é a comida, é a paisagem, são os passeios, o encanto das conversas,
tudo isso há. Portanto, para Camões, um projecto de futuro inclui uma inteira
liberdade do homem e um inteiro gosto do homem pela apreciação dos fenómenos.”
(idem, 76)
Por consequência da empresa portuguesa que tornou una
a terra que o mar separava, acontece no poema de Camões esse fenómeno
surpreendente aos nautas lusos, “a Deusa leva os marinheiros portugueses a um
monte, para verem, ao longe, a Máquina do Mundo” e “ouvem da Deusa aquilo que
será o futuro da História de Portugal.” (idem,
78 e 79) Quer dizer, os marinheiros portugueses são libertos naquela Ilha, da
prisão do tempo mas, também dos limites do espaço.
Então, a pergunta inevitável em Agostinho, como
podemos nós aceder a essa experiência vivida pelos nossos antepassados
marinheiros, entrar nesse “céu aberto na terra” que nos liberte do tempo e do
espaço? E a resposta é automática: teremos de suplantar esta organização
económica capitalista que se vem desenvolvendo no ocidente desde o
renascimento, a que nos conduziu a filosofia, a ciência e a técnica, tal como a
organização da escola que lhe é subjacente, e que tão amarrada trás o homem a
um mundo de condições insuficientes que lhe permitam caminhar rumo a uma Ilha
plena de Amor. É certo que foram, a Filosofia e a Ciência, “bons instrumentos
para subirmos, como são os degraus da escada e o corrimão, mas talvez não um
patamar em que fiquemos, nem um terraço para contemplarmos o verdadeiro Céu.” (idem, 84)
Então, é também esta a
ideia da “Ilha dos Amores”. Com ela Camões incita-nos a realizar esse Céu na
Terra.
Luís Santos
Luís Santos
2 comentários:
Boa tarde, Luís Carlos!
Que excelente 'artigo' aqui nos apresentas!
Quão ACTUAIS são as PALAVRAS de Agostinho da Silva!
Também perfilho a 'ideia' de que se pode construir o 'céu' aqui na Terra, como preparação do outro Céu - a Eternidade!
Começa por ser NESTE MUNDO que CADA UM DE NÓS TEM A OBRIGAÇÃO de CONSTRUIR a PAZ, a JUSTIÇA e a IGUALDADE DE OPORTUNIDADES entre os HOMENS!
«Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.»
Aquele abraço.
Francisco
Bom Dia Francisco.
Bem hajas.
Aquele Abraço.
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