II
A rainha, o infante e o monge, ou a experiência do chão
Descubra as semelhanças nas diferenças. Ela, a rainha, traz
para Portugal o culto do Espírito Santo, casa-se com 11 anos com um rei amante
de muitas mulheres, mas também da arte e do reino, pois entre uma trova e outra
trova cria no chão o berço onde hão-de ser embaladas as caravelas, como treino
para o futuro balanço do mar. A infelicidade conjugal não a faz perder o foco
da obra: o serviço, sob manto real. Ele, o infante, sem nunca daqui ter saído,
leva o Espírito Santo até ao mundo através de madeira, árvores sobre água, cria
um império intemporal de que é rei sem coroa. O terceiro nasce em berço real e
vê o seu reino usurpado, o seu povo reprimido, a sua cultura perseguida. Nasce
para liderar um reino onde a aristocracia e a religião não se distinguem, e de
tudo isso apenas lhe sobram o hábito e os hábitos de monge. E o perdão.
Falo, obviamente, da rainha Santa Isabel, do Infante também
Santo e de sua Santidade o Dalai Lama. Falo de três seres humanos considerados
santos. Nascidos, todos, em berço de ouro, mas fadados logo no berço pela fada
da lucidez e da modéstia. Não lhes subiu o poder à cabeça, souberam enfrentar
as adversidades, sonhar, realizar, superar ódios e divergências, dar um passo
atrás e colocar-se atrás da sua obra. Nascem grandes, não permitem que o brilho
das pedras os ofusque, tornam-se pequenos e assim se elevam a um lugar onde
nunca nenhum trono os alçaria.
Foi na primeira semana deste mês de julho que os três
tiveram, em dias seguidos, 4, 5 e 6, as suas efemérides. Acaso? Certamente.
Dirão. Como posso negá-lo? De que serviria?
Santos? Eu diria… humanos. Verdadeiramente humanos. Uma
raça em construção. Como eu quero ser. Quando for crescida.
Risoleta Pinto Pedro
2 comentários:
Belo texto Risoleta, parabéns.
Como tu, também eu quero.
Quando for crescido ou quando for criança outra vez.
Um beijo,
Manuel João Croca
Curiosa observação, muitíssimo pertinente a conclusão; humanos, como eu quero ser. E a verdade é que nós não nascemos humanos, fazemo-nos humanos ao longo das nossas vidas e mesmo sem querermos ser pessoas Santas, como aqueles que o conseguiram pelas respectivas práticas do quotidiano, nada nos diz que a procura de uma vida ética seja uma impossibilidade, isto é, conseguir viver tendo em conta os pontos de vista e os interesses dos outros, sermos capazes de nos colocar no seu lugar em cada uma das nossas acções em relação aos nossos semelhantes. Talvez seja esse um dos caminhos da harmonia, para e entre as pessoas simples, como nós. Não foi Einstein que disse ser a guerra uma doença infantil da Humanidade? Palavras destas são os pequenos contributos para que possamos um dia chegar à idade adulta.
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