sexta-feira, 5 de julho de 2013

Livros d'África



“O FEITIÇO DA RAMA DE ABÓBORA”. Delicioso título este que, só por si, dá vontade de ler. Trata-se de uma publicação de 1996 da Editora Campo das Letras. O autor Tchikakata Balundu, pseudónimo de Aníbal João de Ribeiro Simões, nascido em 1955 na aldeia de Chilume na província do Huambo, transporta-nos para uma Angola rural, tema pouco abordado na literatura angolense mas que, ainda assim ou talvez por isso, ganhou o Prémio Sonangol de Literatura em 1991. Ainda sobre o autor deve dizer-se que, até 1990, foi docente de Psicologia na Universidade Agostinho Neto e que, neste momento, já terá terminada a tese de doutoramento em Psicologia da Educação na Universidade do Minho.
A história pode resumir-se assim: anos antes da chegada dos europeus ao continente africano, dá-se numa aldeia um acontecimento imprevisto: um aldeão obtém do exterior gado bovino da raça barrosã. O facto desencadeia vários conflitos que culminam com a desgraça de um dos filhos: Cisoka. Este, enfeitiçado com a rama de abóbora, fica privado de memória.

O jovem descreve deste modo a sua desventura: “Chamo-me Cisoka, filho de Ciwale e Esendje, a quem os homens lançaram ao corpo o feitiço da rama de abóbora; a abóbora que cresce no arimo; o arimo que amaldiçoou a maldade dos homens; os homens manchados com o mal por terem visto o gado; o gado obtido na terra dos homens que andam no mar.”

E quem melhor que José Luandino Vieira, o prefaciador deste livro, para nos explicar/resumir o que de facto se passa? Eis parte das suas palavras: “(…) E não um feitiço qualquer, desses curiais para facto ou situação avulso na vida quotidiana do angolano, o sabido e consabido. Mas o poderoso, o raro, o quase absoluto: o feitiço da rama de abóbora.
A um feitiço desses não se exige palavras. Dele nos damos conta não por nos dizerem, denuncia. Só no descomportamento da comunidade se revela o que é, para todos, loucura do enfeitiçado. Simultaneamente é clareza, lucidez, luz que desvela e revela actos, acções e peripécias, próprias ou alheias, a seus próprios olhos. Um homem em busca da sua identidade profunda pode por vezes esquecer o que parece óbvio: o feitiço da rama de abóbora lhe foi posto pela posse pura e simples, em sua família, de riqueza proveniente de bois estrangeiros, bovinos de raça barrosã, animais originários dessa terra dos homens que andam no mar…”.

Cuidado, muito cuidado com o feitiço da rama de abóbora!


Tomás Lima Coelho


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