domingo, 25 de agosto de 2013

 



 
 
 
DEMOCRATIZAR A DEMOCRACIA.

 

As crianças brincam aqui na praceta. Oiço o barulho que fazem, as fantasias que inventam. Um anda no baloiço e é trapezista, outro anda de bicicleta e é o líder do prémio da montanha pois chegou em primeiro lugar ao cimo da montanha que se ergueu nas voltas que dava à praceta, outro joga à bola e é o Cristiano Ronaldo enquanto o outro diz que é o Messi. As brincadeiras das crianças são a sério e elas são sérias a brincar. Enquanto brincam são aquilo a que brincam.

Da mesma forma que com outras ocupações e profissões.

Os sapateiros são a sério e a prova é que andamos calçados, os pedreiros também o são porque temos casas para morar, os agricultores igualmente porque nas nossas mesas “caiem” as sopas, as saladas e muitos outros alimentos (infelizmente alguns não têm nada disto). E os pescadores também são a sério. E os artistas que nos oferecem outros mundos, outras realidades, também. E os professores que nos ajudam a aceder aos conhecimentos.

As árvores também o são com seriedade e temos os frutos, a lenha, as mesas, portas, janelas, barcos para navegar, para o provar.

E a água que nos sacia e lava.

Enfim poderíamos prosseguir por aqui afora mas, já agora que se aproximam mais umas eleições, chegamos aos políticos. Políticos que deveríamos ser todos mas que como sabemos não somos. Não políticos no sentido de profissão, antes no sentido da participação. Políticos no sentido da cidadania.

Pois bem, quanto aos políticos, que temos?

Os políticos e os partidos políticos só ganham razão de ser se com a sua acção contribuírem para a resolução dos problemas das pessoas já que é para isso que a política serve, é isso a política.

Como problemas das pessoas entendam-se as questões relacionadas com o trabalho, a educação, a saúde e a justiça económica e social, sendo que todas as restantes serão derivadas e sucedâneas destas. Se não for para isto, a política tenderá a evoluir para um exercício de retórica onde a demagogia e a arte de bem falar (muitas das vezes sem nada dizer) ganharão a primazia, e para a defesa de interesses em lugar de princípios e valores.

Cada um deverá fazer a sua própria leitura a partir do que observa e verifica e das ideias e sentimentos que tal lhe proporciona mas, talvez seja tempo de cada um assumir um papel mais activo e participativo nesta chamada vida política e que mais não será que o exercício da cidadania. A participação na actividade social e política não se esgota nos partidos políticos. Muito longe disso, há muitas outras formas de organizar e concretizar a nossa participação e muitas outras poderão ser criadas se disso houver vontade. Parece-me ser essa a condição primeira para democratizar a democracia e rasgar outros horizontes quando os que nos oferecem não nos servem.
 


Foto: Edgar Cantante; Texto: Manuel João Croca

5 comentários:

luis santos disse...


Tá bom.

Mas existe uma categoria de participação social e política, entre outras, que gostaríamos de contemplar, sem que se ache que o texto tivesse obrigação de esgotar o tema: a dos que participam não participando.

No fundo, numa tentativa de incluir todos no direito a Ser em liberdade sem a habitual obsessão da disputa pelo poder. Uma a-narquia democrática e Abraços.

MJC disse...

A possibilidade de participar não participando está à partida considerada já que essa é a situação em que se encontra a grande maioria da população, creio.
O texto pretende convocar a reflexão das pessoas e a partir daí apelar/propor/sugerir a assumpção de uma outra atitude para obter, talvez, outros resultados.
Naturalmente que, em qualquer apelo/proposta/sugestão, aderir ou não é da responsabilidade do foro íntimo de cada um e o exercício do livre-arbítrio que a cada um cabe.

Abraço.

Manuel João

luis santos disse...


Sim, tudo bem.

A reflexão à volta da questão de partida parece-me plena de pertinência e de boa argumentação.

Ainda assim gostaria de dizer mais qualquer coisa:

Nestas coisas da participação social e política, da dinamização cultural, da intervenção artística, reparo que ocorremos com frequência num erro. Vejo muitas propostas cheias de plena convicção, de boas intenções, que depois olhando para os resultados ficamos decepcionados.

Vemos muitas vezes pretender-se que os outros sigam pelo nosso caminho quando ele é cheio de incerteza e em vez de se ajudar, prejudica-se e confunde-se.

É sobretudo neste sentido que se diz ser preferível, muitas vezes, participar não participando do que criar equívocos. Nem vale a pena exemplificar.

Quer-se dizer, estamos convencidos que muitas vezes é um problema de falta de clarividência. O outro, antes de mais, deve sempre merecer mais o nosso melhor reparo, do que a nossa deficiente liderança.

Anónimo disse...

Participar ou não participar eis a questão.
Sinceramente, acho que é preferível errar fazendo do que nada fazer para não errar. Transportando este velho provérbio para a temática em causa, é muito interessante o exercício filosófico em torno do "nada" poder ser tudo, mas quase sempre nada resulta desse exercício.

MJC disse...

Amigo Luís, atendendo aos comentários concluiria que fazemos leituras diferentes do mesmo texto. Não é nada de mais e provavelmente até é bom.
Mas, como há alguns pontos sensíveis em relação aos quais gostaria que não ficassem dúvidas relativamente ao que penso, passo a esclarecer.

O texto não pretende apontar caminhos a ninguém e muito menos liderar seja lá o que for.
Apela a uma maior participação cívica nas questões da sociedade admitindo que tal poderá melhorar o sentido da nossa vida colectiva. As possibilidades de participação são imensas e cada um poderá (ou não) fazê-lo em torno das questões a que é mais sensível ou para que se sente mais apetrechado para introduzir melhorias. Será uma questão de bom-senso que terá a ver com cada um.
Parece-me que depois de diagnosticadas as deficiências que a todos afectam e a falta de perspectivas de que todos se queixam, assumir uma atitude mais activa e participativa poderá ser um passo em frente.
Há quem ache que as coisas se mudam por cima e pretendem uma revolução.
Há outros que acreditam mais em mudanças sustentadas e progressivas a partir de baixo e feitas pela comunidade. É neste segundo grupo que eu me incluo e, por isso, vou participando.
A minha participação, contudo, poderá não se esgotar na actividade que já tenho, poderei estar disponível para outras participações, contribuir em outros projectos.
Mas, para que fique claro, liderar é algo que nunca esteve nos meus objectivos. Desde logo, por falta de vontade e, também, de jeito.
Quanto a convicções permito-me assumir a crença em que uma comunidade empenhada e participativa poderá operar transformações mais consentâneas com aquilo que essa mesma comunidade acha mais correcto.

Abraço.

Manuel João