quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Plantas que Curam: Estevão-macho



por Miguel Boieiro


Ao calcorrear montes e vales para observar a natureza, hábito antigo, acabo por fixar uma ou duas plantas originais que, pela sua graciosidade, me despertam os sentidos. Já no remanso do lar, procuro identificar-me com essas plantinhas e descobrir os seus atributos. Tem sido sempre assim e os leitores hão-de notar que, quando regresso de uma viagem, trago sempre algumas novidades botânicas para as minhas croniquetas.

Há tempos um aluno do Instituto Hipócrates, onde episodicamente lecionei a disciplina de fitoterapia, desafiou-me para ir a Portalegre, a fim de investigar a flora da Serra de São Mamede. Aceitei com entusiasmo, visto não conhecer suficientemente a região. Se excetuarmos duas visitas rápidas que, em tempos, fiz à cidade e estâncias mais demoradas em Castelo de Vide e em Marvão, o conhecimento que tinha do nordeste alentejano era reduzido.

Fomos (a minha esposa viajou comigo) recebidos principescamente por jovens afáveis da Associação Ambientalista “Ficar”, onde tomámos as refeições e pernoitámos. O objetivo primordial era o de colher plantas silvestres para confecionar um lauto jantar vegetariano.

Juntando os saberes de todos os participantes, lá fomos caminhando e apanhando plantas, ensinando e aprendendo. Regressámos com os alforges cheios e, sem dúvida, muito mais enriquecidos de saberes.

Em determinada altura, a partir da aldeia de Besteiros de Cima, entrámos, quase sem dar por isso, em território espanhol (Codocera – Província de Badajoz). Descansámos um pouco junto à capelinha de Nossa Senhora da Lapa onde já havia a identificação de um trilho pedestre escrito em castelhano e uns metros adiante lá estava o marco com o P deste lado e o E do outro. E foi a descer, até chegarmos a um formoso afluente do Xévora, que fizemos o percurso espanhol. Eis então que, nesse caminho com vegetação muito densa, encontrámos o estevão-macho, a planta escolhida para este escrito.

O nome desta cistácea é assaz curioso. Logo se vislumbra que é uma esteva com folhas grandes, por isso, a designação estevão seria suficiente. Porquê então juntar o adjetivo macho? Apenas para reforçar, creio bem!

Mas o mais curioso ainda é que em Portalegre ninguém diz esteva, preferem dizer jara como os espanhóis. Logicamente, o estevão macho aqui é conhecido apenas por jara-macho.

Pois a jara-macho, como localmente se diz, é cientificamente a Cistus populifolius, enquanto a vulgar esteva dá pelo nome de Cistus ladaniferus.

O estevão-macho é um arbusto muito bonito e poderia, sem favor, integrar os nossos jardins como espécie ornamental. Possui muitos ramos, formando uma mancha densa. As folhas apresentam-se simples, opostas, pecioladas, pegajosas, grandes, de verde intenso, parecidas com as folhas do álamo (Populus spp), daí a designação latina, populifolius. As flores, brancas, um pouco mais pequenas do que as da esteva, nascem em compridos pedúnculos, em forma de corimbos e são muito vistosas. Os frutos estão encerrados em cápsulas ovadas e deiscentes.

Encontrei pela primeira vez o estevão-macho nas imediações do Penedo Furado (Vila de Rei) e logo me encantou. Mais tarde, tornei a encontrá-lo num passeio organizado pelo Clube Ar Livre, na serra algarvia. Contudo, nunca o tinha visto tão alto e em tão grande profusão. Aliás, a altura deste arbusto tem a ver com a disputa face a outras plantas concorrentes para alcançar um lugarzinho ao sol.

Nesta fase da descrição já os leitores estarão impacientes e naturalmente indagarão: “mas para que presta o estevão-macho?”

Pois o estevão-macho serve para fazer loções destinadas ao couro cabeludo. Dizem os compêndios que previne eficazmente a queda do cabelo.

Todas as espécies do género Cistus L têm as folhas e os ramos revestidos de uma oleorresina, exsudada por pelos glandulares, conhecida por lábdano. Este extrai-se através da fervura das plantas em água e tem utilização em farmacopeia, perfumaria e fabrico de vernizes. (Elementos da Flora Aromática de Aloísio Fernandes Costa). O lábdano existente na esteva e no estevão-macho é de composição complexa. Para além do óleo essencial, tem ácidos aromáticos, triterpenóides e mucilagens com ação antissética e mucolítica e foi outrora usado em problemas do foro respiratório, nomeadamente para tosse e bronquite. (Plantas Aromáticas em Portugal de A. Proença da Cunha e outros – Edição da Fundação Calouste Gulbenkian)

E mais não digo!


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