domingo, 17 de novembro de 2013

 
 
O Estado do Tempo – II


TEMPO(s)
 

Como água circulando pelos tecidos-terra vivificando-a, o pensamento. Envolvido em cadência de tambor, evocação de uma solenidade antiga trocada por repugnante pantomina.

Tum-Tum.
Tum-Tum-Tum.

Todo o tempo é temporário, transitório.
Sem palavras, apenas um leve rumor e, contudo, perfeitamente audível, de dentro, fala que é longe o cais dos abraços e move-se, ainda.
Continua a afastar-se e regressamos agora e sós.
Será? Ou não? 

Tum-Tum.

 
De-vagar o olhar
antecede o tacto
e o enleio que o aroma
arquitecta.

De-vagar o alheamento
cobre de indiferença
os dias desesperançados
de brilho.
 
De-vagar o ouvir
que soçobra no silêncio
dos voos parados
das gaivotas.
 
De-vagar seca,
em combustão interna,
a pele curtida
do tambor-alma.
 
De-vagar a viagem
de dentro p’ra fora
tudo à volta acontece
sem espanto.
 

De-vagar o tempo

coisas sonhadas

canções por inventar

na raiz dos sons


De-vagar se apronta
o levantamento sem rebelião
antes consciência
feita acção.

De-vagar o tempo
afasta a névoa, o desamparo
ateia-se o soletrar do fogo
e, no seu devir, o tempo sussurra:
SERVIR.

Tum-Tum.
Tum-Tum-Tum.

 
(in “Humanascer ou a Procura da Luz” de Manuel João Croca)

 
 
 
Anta, Sol e Árvores
(óleo sobre tela)
Pintura de Luís Delgado

2 comentários:

luis santos disse...

No servir é que está o ganho! Abraço.

MJC disse...

Sim, acredito nisso.
Servir, aqui entendido como o oposto da subserviência. Evidentemente, como sei que tu bem sabes.
Abraço.

Manuel João