domingo, 9 de março de 2014



A PROPÓSITO DE UMA HOMENAGEM


 
TEJO, UM RIO PARA VIVER
 
Corre, da nascente até à foz, corre.
Um rio, o rio, nós.
 
Neste nosso exercício do viver, talvez valha a pena olharmos o rio que nos é vizinho como exemplo. Quando nasce é apenas ténue fio de água mas já tem um propósito, desaguar. No seu percurso recebe muitos afluentes que o engrossam e dão caudal. Arrasta sedimentos vários, atravessa fronteiras, irriga campos, dá luz, alinda paisagens, umas vezes acelera, outras apenas desliza como um bocejo mas, nunca pára e vai sempre crescendo.
E é esse aumento de caudal que permite as inúmeras navegações.
Uma das várias navegações que se podem praticar é percorrer os trilhos onde o rio estanca o seu deambular insaciado no abraço à terra, sua eterna e insubmissa namorada. E ela acolhe-o enfeitada por salgadeiras, cardos (que picam mas também dão flor) e outras plantas que ali fizeram a sua casa e colonizam as zonas húmidas. Namoram ao som do regurgitar dos bivalves quando as marés baixam, e dos gritos e chamamentos das aves do mar que folclorizam o ambiente. A elegância sumptuosa dos flamingos desliza sobre o cinzento lodoso e o seu colorido conta-nos que há outros mundos neste mundo que sentimos mais nosso apenas por nos ser mais próximo. O brilho do Sol, o vento no cabelo, o cheiro da maresia, os barcos típicos sobre as águas que com arte bolinam os esteiros, domesticados pelo saber dos últimos intérpretes da faina, ou por navegantes ocasionais que no ócio exercitam e cumprem o fado ou desígnio da alma lusa marinheira.
 Este braço do rio pára aqui. Um pouco porque esmorece na correria, outro tanto porque as muralhas que mãos humanas construíram lhe cortam o fôlego para prosseguir. O rio é o Tejo. É um rio muito grande mas gostamos particularmente deste seu braço que aqui vem descansar. Talvez porque, como dizia Paracelso, “quanto maior o conhecimento inerente numa coisa, tanto maior o Amor”. E nós aprendemos a amar este rio na medida exacta em que lhe fomos percebendo os pormenores. E ele tem muitos. Tantos que, de certeza, ainda há muito por descobrir. E, então, é muito giro porque, ao mesmo tempo que já é um depositário de memórias, continua a ser um apelo de descobertas com o travo de aventura que as descobertas sempre acalentam. E, assim, vamos crescendo com o rio e as navegações que ele possibilita porque, navegar é preciso.
 
                                                                                                               Manuel João Croca
 
 
 
 


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