sexta-feira, 7 de março de 2014

Livros d'África




PEPETELA (Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos) 


Este sociólogo angolano, nascido em Benguela em 1941, é um dos nomes mais destacados das letras angolanas. Em 1997 foi-lhe atribuído o Prémio Camões e em 2002, no Brasil, foi condecorado com a Ordem do Rio Branco. Recentemente foi distinguido com o Prémio Rosalía de Castro, organizado pelo Pen Clube da Galiza.

Militante activo do MPLA desde 1963, combateu na guerrilha nas matas de Cabinda cuja experiência vem relatada naquele que é o seu livro mais traduzido: “Mayombe”. Foi vice-ministro da Educação de Angola durante o governo de Agostinho Neto. Actualmente é docente de Sociologia na Faculdade de Arquitectura de Luanda.

Uma das suas obras mais interessantes, na minha opinião, intitula-se “A GLORIOSA FAMÍLIA” publicada pelo Círculo de Leitores em 1999. É uma história passada em Luanda no tempo em que esta estava ocupada pelos holandeses e os portugueses viviam refugiados em Massangano. Ali, segundo Cadornega, “assistia hum homem por nome Baltazar van Dum, Flamengo de Nação, mas de animo Portuguez que havia ido nos primeiros Arrayaes”, oportunista mercador de tudo um pouco e também de escravos. É através do olhar, pragmático e com sentido de humor, de um dos seus escravos, mudo, que acompanhamos as vicissitudes do tal Van Dum que, querendo agradar a holandeses e a portugueses, via perigar frequentemente os seus negócios e a sua vida.

“(Fevereiro de 1642) – O meu dono, Baltazar Van Dum, só sentiu os calções mijados cá fora, depois de ter sido despedido pelo director Nieulant. Mijado mas aliviado, com a cabeça de raros cabelos brancos ainda em cima dos ombros. O meu dono saiu do gabinete do director tão pálido como entrou, mas com o risinho de lado que lhe fazia tremer o bigode. Por vezes o risinho era de nervosismo, hoje era de euforia. Os dois escravos que com ele entraram no antigo Colégio dos Jesuítas já não saíram. Quem perdia era o proprietário deles, português de Massangano, que os tinha enviado com a célebre carta. O meu dono não teve tempo de ler a carta, como terá defendido junto do director. Mas ele e eu e toda a gente sabíamos o conteúdo, um pedido para indicar todas as posições defensivas dos inimigos holandeses e os efectivos de cada ponto.”

Este é o primeiro parágrafo do livro. A partir daqui a sua leitura torna-se irresistível.


Nota: os descendentes deste Baltazar Van Dum são hoje uma das famílias mais conhecidas em Angola: os Van Dúnem.


Tomás Lima Coelho


1 comentário:

MJC disse...

Que bom trazeres o meu Amigo Pepetela aqui a esta ilustre galeria literária.

É de facto muito bom o que aconselhas mas, se não te importas permito-me recomendar, do mesmo Autor "A Geração da Utopia" e a "Parábola do Cágado Velho".

Já agora convém também realçar que este nosso Amigo é também Prémio Camões".

Parabéns pela tua crónica. Abraço.

Manuel João Croca