PEDRO FÉLIX MACHADO (1860, Luanda – 1907, Lisboa)
Com a obra “SCENAS
D’ÁFRICA. ? ROMANCE ÍNTIMO” este autor, advogado,
nascido em Luanda, filho de pai açoriano e de mãe angolana, foi um dos
precursores da Literatura Angolana, seguindo os passos dos seus antecessores
Maia Ferreira e Cordeiro da Matta. Foi contemporâneo de Alfredo Troni, advogado
português radicado em Angola, que escreveu uma das mais importantes obras da
Literatura Angolana, o livro “Nga Muturi”.
Pedro Machado colaborou
desde sempre nas revistas e nos jornais portugueses e angolanos com diversos
artigos de opinião e também com muitos poemas. A obra que hoje trago foi
publicada pela primeira vez em livro em 1892, e depois em folhetins, primeiro
em Portugal na revista “Gazeta de Portugal” e mais tarde em Angola através do jornal
“O Angolense” (1907-1911).
Em 2004 a Imprensa
Nacional/ Casa da Moeda resolveu voltar a editar este romance. Nesta edição vem
inscrito um completíssimo Prefácio do escritor angolano E. Bonavena (Nelson
Pestana), sobre a bio-bibliografia de Pedro Félix Machado.
Profundo admirador de
Eça de Queiroz, no excerto que aqui deixo deste autor se pode avaliar o seu
estilo e a inclinação queirosiana, bem patente na minuciosa descrição dos
cenários:
“(…) A habitação de
Ernesto compunha-se da sala em que ele agora passeava, espaçosa, de paredes
estucadas, um quarto de cama acanhado e sem janela para a rua, e uma casa
interior ou varanda, comunicando por um corredor com a sala, aberta em arcarias
largas, que davam para um pátio, a que se descia por uma escada de alvenaria,
praticada no extremo esquerdo.
A mobília não primava
pelo luxo, mas era notável pela variedade. Havia ali o sofá de assento de
palhinha antigo, com passarinhos em relevo na madeira polida das costas,
rigorosamente divididas em três, confraternizando com cadeiras de vime da ilha
da Madeira, deselegantes e ruidosas representando o honroso papel de fauteuils, mesas de pé-de-galo, étagères
modernas, estantes de tacula, manufactura indígena, contendo larga cópia de
romances, alguns tratados elementares de ciências naturais, em escandalosa
promiscuidade com livros muito modernos em encadernações de luxo.
Pelas paredes, algumas
oleografias tentando representar mulheres bonitas de cabelos azuis e faces cor
de laranja, no centro um candeeiro de petróleo, de suspensão, com pretensões a
lustre, e um largo espelho sobre o sofá.
No quarto, um largo
leito à francesa, de madeira polida, duas ou três cadeiras austríacas,
mesa-de-cabeceira com pedra, e um toucador-cómoda muito vulgar em cuja pedra se
ostentavam alguns vidros de essências e um velador de abat-jour verde.
Na varanda uma grande
mesa de pinho, cadeiras austríacas, cantoneiras e um candeeiro de suspensão
para petróleo.
As paredes tinham –
como em todas as casas de África – um aspecto herpético, devido ao salitre que
nelas produz a humidade e a impureza da cal de conchas de marisco, de que
exclusivamente lá se faz uso; nos tectos o vigamento ostenta-se caiado, sem
revestimento algum – o que dá ao interior das casas uma aparência triste e
desabrida.
Tal era a residência de
Ernesto.”
Tomás Lima Coelho
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