Ao fim de catorze anos de actividade cheia de contribuições para o avolumar do conhecimento sobre o sistema solar, em geral e, em especial, do sub-sistema que o gigante Júpiter e os seus satélites fazem, nível a que a particular atenção recaía no corpo central e em uma mão cheia de planetas secundários, entre os sessenta e tal que os acompanham, a sonda Galileu verá hoje o fim da sua jornada quando se despenhar e desfizer na atmosfera joviana.
Por via dos seus mecanismos assistiu-se, pela primeira vez, a uma erupção vulcânica em outro planeta que não o nosso. Mas também ficámos a conhecer a realidade do vulcanismo activo de Io, o berlinde onde aquela surpresa teve lugar, bem como a existência de um oceano de água salgada em Europa, sob uma capa gelada. Isto para só falarmos de dois dos casos mais espectaculares. Muito mais nos deu a conhecer aquele engenho fruto do génio da nossa espécie. E mesmo o simples aumento dos dados sobre a atmosfera do maior dos translacionandos solares, ou a verificação do número das suas luas, ambos são importantes contributos científicos.
Projecto bem sucedido, é um dos factos que nos permitem sustentar ser a exploração espacial um dos componentes de uma cultura da Humanidade, uma civilização humana, expressão de paz e aproximação entre os homens, capaz de assegurar a continuidade da nossa passagem pela Terra.
O chefe desta aventura diz que a haver um outro plano de acção complementar, estará exequível lá para dois mil e dez. Uma boa hipótese será fazer de um dos satélites o alvo preferencial.
Ficamos cheios de curiosidade em saber o que contem um oceano salgado em outro corpo do sistema solar.
Somos capazes de coisas tão lindas.
Interessa compreender que, em termos económicos, o espaço pode muito bem substituir a guerra, quer enquanto geradora de negócios e lucros, tal como no aspecto de ser capaz de funcionar enquanto motor de inovações científicas e tecnológicas e outras. O nosso quotidiano já está invadido por instrumentos que directa ou indirectamente resultam de conquistas tecnológicas e científicas que aqueles desígnios exploradores têm propiciado.
Se Portugal quer ficar no primeiro mundo da nova divisão do trabalho que tem vindo a ocorrer nas últimas décadas e ainda não terminou, é vital que entre nós se estabeleçam unidades empresariais que deem corpo a algumas das indústrias que concorram para aquele fim. Anteriormente, há que reformar e reformular as nossas Universidades e o trabalho académico que aí se pratica e, a partir disso, apostar num sistema de ensino capaz. Para já, a tristeza que encontramos é a investigadora portuguesa do Instituto Max Planck, na Alemanha que, entre nós, não conseguiu ganhar uma bolsa de estudo. (1)
É longa a lista de materiais escolares da Matilde que a Luísa adquiriu ontem de manhã e agora está preparando na sala.
São guaches, lápis de cor e de grafite, esferográficas e cadernos, isto sem contar com os livros, é claro, ao que se junta uma resma de papel de máquina de escrever, um bloco de folhas A4, marcadores, plasticinas, cartolina e uma tesoura e também um pano, um avental, uma caixa para arrumações e uma régua.
Como já possuímos algumas das parcelas do rol, a Luísa diz que a factura não foi muito pesada. O custo total saldou-se nos vinte e cinco euros.
Impreterivelmente, a Matilde responde com um sorriso à pergunta se está a gostar da escola.
Pois eu não devo estar enganado se aqui escrever sim.
Tenho para mim que ela sente este novo passo como uma aproximação à irmã mais velha e respectivas amizades de que a Beatriz é o melhor elo comum. Digamos que se sente ao mesmo nível delas e isso deve aumentar-lhe a importância aos seus próprios olhos.
É tão viva e alegre este meu encantozinho.
Temos que saber aproveitar este factor para fazer prolongar e sedimentar este impulso inicial.
Faz parte dos atributos da paternidade.
Domingo sem história; conversetas, jornais e leituras.
A minha prima-irmã Adelina visitou-nos e passou a tarde na companhia da Luísa e do pardalito.
Os céus deste fim de Verão quente enchem-se de algodões que brilham e atenuam o azul.
A Margarida está cheia de saudades.
Chegará depois do jantar.
Verei a tarde cair com a mais novinha.
Vamos andar de bicicleta.
A Margarida chegou satisfeita e cheia de novidades.
Vistos os materiais novos e contadas que foram as peripécias que, da praia ao campo, passaram por uma procissão na aldeia, esta manhã, uma vez lavados os dentinhos e tomado o fluor, ala para a caminha que amanhã começa a primeira semana completa de trabalho deste ano lectivo que para a Matilde será o baptismo neste grau de ensino.
Agora os anjinhos dormem e a noite, quente e serena, apela-me ao recato de um cigarro.
E já posso comprar uma bicicleta para mim.
Depois do passeio que fiz com a Matilde, desde o largo da esplanada da Júlia, onde enchemos os pneus, até ao cais novo, a miúda deixou bem patente a sua destreza no controle da pedaleira e ficou claro que já podemos encarar a possibilidade de a família fazer destes passeios um dos momentos do convívio e da alegria que tão importantes são para a harmonia do lar.
Alhos Vedros
21/09/2003
NOTA
(1) Nave, Filomena, A ÚLTIMA MISSÃO DA GALILEU, p. 27
CITAÇÃO BIBLIOGRÁFICA
Nave, Filomena, A ÚLTIMA MISSÃO DA GALILEU, In “Diário de Notícias”, nº. 49.122, de 21/09/2003