terça-feira, 28 de março de 2017

O DIÁRIO DA MATILDE - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

VAMOS CANTAR AS JANEIRAS

Faleceu o Sr. José Ribeiro Chula Júnior, amigo de sempre do meu pai e homem que gostava da vida e a viveu com a paixão e a intensidade de quem correu mundos e construiu um império, mas sempre gentil e delicado, respeitador do próximo a quem nunca ofendeu por dolo e jamais negando o convívio de muitos pratos já que, para ele, o estar vivo era isso mesmo, o acto de festejar alegrias uma vez findo o trabalho. 

A esta hora estará certamente a rever as faenas mais bonitas das incontáveis corridas que perseguiu por toda a Espanha que era a coisa que mais gostava de ver e o único devaneio que a si mesmo se permitiu ao longo de toda uma vida de labuta e progresso. Padrinho de Pedrito de Portugal, foi um aficionado até ao último suspiro e teve a justa recompensa no cortejo fúnebre em que a urna foi transportada pelas mãos dos forcados da Moita que em ele perderam um grande amigo e admirador. 

Criador de gado, com a ajuda da mulher que muita força e auxílio lhe deu, teve a capacidade de ver ao longe e conseguir transformar uma exploração tradicional de ovinos em vacaria leiteira industrial e mais tarde, depois do filho mais velho concluir os estudos e de se ter posto a trabalhar ao lado dele, teve a presença de espírito para compreender os novos tempos e deixar que a nova geração enveredasse pela aplicação do melhor aparato tecnológico a nível mundial, com o que formaram uma exploração de topo nacional que actualmente, com meia dúzia de braços, produz mais de quinze mil litros de leite por dia. 

Eu sempre admirei este homem que para mim representou o que de melhor tem o espírito empreendedor da Humanidade e que, pela cortesia e bons princípios, me foi apontado e serviu de exemplo. 

Tenho a certeza que agora estará junto de Deus que em seu Reino tem sempre lugar para as pessoas boas. 



Pois ao dia pardacento e húmido seguiu-se uma noite levrinhante. 
Sabemos que a Lua está lá por causa do clarão que as nuvens mais magras deixam transparecer quando passam. 



O robot “Spirit” continua a enviar excelentes imagens para a Terra mas, infelizmente, parece ter um problema que lhe impede a locomoção. Um dos airbags que lhe amorteceu o embate na superfície marciana está a prender-lhe uma das peças que lhe proporcionam o movimento. 
Naturalmente, os cientistas estão agora a avaliar e a preparar respostas ao problema. 
Façamos votos para que a operação de salvamento seja bem sucedida e a missão possa prosseguir com a mesma qualidade na recolha de dados com que até aqui nos presenteou com as fotografias. 



Hoje os alunos fizeram exercícios com as vogais e algumas das palavras dadas. Completaram a manhã com os números aprendidos. 



A Sorbonne suprimiu a cátedra de estudos de língua e cultura portuguesa. 
Falta de tempo, estão a perceber? 



E o que dizer da proposta de uma deputada do PSD para que se legisle no sentido de limitar o acesso da imprensa e a possibilidade de certas notícias de casos em processo de justiça. 
Fico arrepiado com o que ouço. 
Isto é o primeiro sinal do assalto ao aparelho legislativo que, por ora, ainda consagra as liberdades de expressão e informação entre nós. Para já não tem pernas para ir para a frente, seria demasiado descaramento uma vez que estamos em pleno decurso de um processo que envolve figuras do poder político e do alto funcionalismo do estado, bem como dos meios mediáticos. Contudo, receio que a coisa não fique por aqui. 
A lição Watergate serviu para todos, não tenho dúvidas disso e a verdade é que a liberdade de imprensa, hoje em dia, em Portugal, é mais um paradigma teórico que algo consistente na prática dos meios de comunicação social. 
Para que a actual classe dirigente – o termo tem valor sociológico – se mantenha no poder já não há alternativa à ditadura, naturalmente mitigada mas, é bom de ver que dada a nossa pertença à União Europeia, aquela não pode e também não precisa de ser explícita. Basta que o SIS investigue e fiche os mais inconvenientes da sociedade civil e depois será cair-lhes em cima com os desempregos ou as maquinações fiscais e legais e, com o pão e o circo em eco mediático, o povo acabará por ir à bola e ao cinema e não reparar que as fériazinhas estão garantidas pelo silêncio de toda e qualquer injustiça que, eventualmente, fosse corrosiva para a paz apodrecida em que este país de opereta passará a viver. Depois a criminalidade tratará do resto e, por preferência pela segurança, aceitaremos todos os policiamentos que nos queiram impor. 

Dizem que o vinte e cinco de Abril de setenta e quatro foi o primeiro movimento de uma onda democrática que se veio a repercutir por todo o mundo, levou à queda das ditaduras latino-americanas e do comunismo e ainda hoje faz sentir as suas réplicas. 
Pois bem, esperemos agora que a solução portuguesa não venha a consagrar a vitória das máfias sobre as democracias e a transformação dos estados de direito em protectorados legais do crime organizado. 

Deus queira que eu esteja redondamente enganado. 



E como é que eu posso deixar de viver encantado? 
Ao almoço tive um coro de meninas, com coreografia e tudo que quiseram presentear o pai com as canções aprendidas na hora de educação musical. 

Agora vou dar um beijinho aos meus anjinhos e depois dormirei com um sorriso na boca. 


 Alhos Vedros 
   08/01/2004

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