Nós, os portugueses, temos uma tendência -- às vezes até doentia -- para lamentar as oportunidades perdidas do passado. Mas continuamos, hoje mesmo, a descorar o muito que ainda temos de bom...
Creio que não exagero se disser que nenhum país do mundo desdenharia perante a possibilidade da língua que ostenta o seu nome ser considerada uma das mais faladas do mundo!
Olhe para a Inglaterra, o que eles ganham pelo facto da sua ser a "lingua franca" por excelência do mundo contemporâneo! Olhe para a Espanha, o que eles se esforçam por integrar continuamente os falarem latino-americanos (ao ponto da Real Academia Española considerar como correctos usos próprios dos hispânicos e que os castelhanos mais puristas sentem repugnância em aceitar...) e como eles se envolvem na expansão do idioma nos Estados Unidos! Olhe para a França, que através da sua política de francofonia, se esforça por travar a decadência do idioma francês, enquanto língua de comunicação transnacional...
E nós o que fazemos?
Permitimos que o nosso idioma tenha, há praticamente um século (a completar no, não muito distante, ano de 2011) duas ortografias oficiais diferentes; temos tendência a considerar o "brasileiro" como um outro falar, necessariamente mais pobre e adulterado; tardamos em definir (em conjunto com o Brasil) uma estratégia global para o ensino do português como língua estrangeira; não nos preocupamos com o facto do francês se expandir na Guiné-Bissau ou o inglês em Moçambique;... contrariando a nossa própria história, parece que queremos até "que a nossa língua continue a reflectir o povo português e não uma mescla multicultural"!!!
Li no Público que há 235 milhões de falantes da nossa língua. Já reparou no enorme mercado cultural que isto representa? Já reparou na notoriedade que Portugal tem, pelo simples facto dos falantes da nossa língua serem 23 vezes e meia o tamanho da nossa população? Já pensou que isso se pode traduzir, também, em benefícios políticos e diplomáticos?
Se a prática do "orgulhosamente sós" vingar, um dia os nossos netos vão lamentar o que estamos hoje a fazer ou, talvez melhor, a não fazer! Da mesma forma que nós hoje achamos que foi uma pena que as riquezas das índias e dos brasís se tenham esfumado e pouco, de duradouro, tenha ficado.
Acha verdadeiramente que é este o caminho mais proveitoso para os portugueses? Eu acho que não.
Cumprimentos,
Manuel de Sousa
9 Julho 2006
P.S. - Só um comentário final sobre as consoantes mudas: as pessoas não escrevem inflacção porque lhes soa melhor (aliás, como saberá, inflação nunca se escreveu com dois "cc"!), escrevem assim por uma "suposta coerência" com outros casos em que, apesar de serem completamente desnecessários, as regras ortográficas impõem que seja acrescentado um "c" ou um "p" lá no meio da palavra. Nada mais. Quanto à ortografia francesa, ela não é exemplo para nós. Era, para a ortografia etimológica que seguíamos antes de 1911. Agora, as ortografias do espanhol ou do italiano são mais próximas da nossa, uma vez que concedem uma preponderância maior à fonética do que o francês ou o inglês.
(in Wikipédia, Debate sobre a Língua)
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