quinta-feira, 13 de outubro de 2011

d´Arte - Conversas na Galeria LVIII


Foca Bebé Autor António Tapadinhas
Tinta da China sobre papel 56x44cm

Este trabalho, de 1998, resultou do apelo de uma câmara Municipal, aos artistas do Concelho, para colaborarem numa daquelas campanhas contra o massacre, especialmente repugnante, das focas-bebé. Continua actual, porque em 2006 foram alcançados números impressionantes: 355.000 focas mortas!
Eu fui atingido pelo problema num daqueles telejornais especialmente realizados por Cronenberg para a hora de jantar, em que se mostrava homens a matar aquelas coisinhas fofas com um bastão de basebol! Sem comentários. Adiante...
Quando tinha o trabalho quase concluído a minha filha Elsa passou no estúdio para ver o que eu estava a fazer. Adorou, claro (é filha!) e então eu disse-lhe que faltava pôr o sangue que inundava aquela água... Olhou para mim incrédula! Quando compreendeu que eu estava a falar a sério, tirou-me o desenho, que ficou sujo, não de sangue, mas de duas lágrimas que lhe correram pela face...

2 comentários:

Luís F. de A. Gomes disse...

Foca com olhos de gente, como que nos querendo dizer que é uma parte de nós que também se vai nessas matanças e isto sem esquecer que há caça a estes mamíferos que faz parte das ancestrais tradições culturais de vários povos mas é assim, só por relativismo moral que não tem o menor sentido, poderemos deixar de crer que nem todos os costumes e tradições são igualmente respeitáveis e isto sem embargo de, do ponto de vista antropológico, os podermos entender enquanto expressões da Humanidade.

E isto já deriva da pintura que conseguiste o que, por si, seria muito ou, se quisermos, o suficiente para dizermos que esta tua criação nos convida a pensar em coisas profundas.

Mas há uma outra linha de conversa que decorre deste quadro.
É aquela que se pode fazer em torno daquilo que genericamente poderemos desginar como arte socialmente interventiva.
Faz sentido que se acrescente esse desiderativo a esse vector da criatividade humana? Quais os contornos em que deve ser colocado se por esse caminho quisermos enveredar? Enfim, muitas outras perguntas haveriam a apresentar em face deste problema.
Pessoalmente não me revejo numa arte panfletária -do ponto de vista político e social, o realismo socialista que tembém ecoou pela pintura, foi o máximoexpoente- e nem mesmo me parece que a tanto tenhamos que chegar se quisermos passar uma qualquer mensagem com o(s) nosso(s) artifícios. Mas sou capaz de aceitar que o mestre do ofício pode ter em mente a ideia de querer convidar ao pensamento com aquilo que crie. É digamos, o cumprimento do papel de pretender elevar o espírito humano.

E, como vimos anteriormente, é isso que este teu trabalho, só aparentemente singelo, consegue.

A foca com olhar de gente, dizendo-nos com veemência que, afinal, também nós temos olhar de focaou não fossemos, por sinal, todos irmão do mesmo calhauzinho cósmico que é a Terra, a nossa casinha comum, por ora, o único lar que temos para viver -a mando das troikas, brevemente teremos que passar a escrever, sobreviver, embora isso seja outra história.

Aquele abraço, companheiro
Luís

A.Tapadinhas disse...

Os artistas, em diversas épocas, têm querido fazer parte de uma revolução social, levando-os a aderir a movimentos ou partidos revolucionários. Pensavam que a sua Arte, o seu pensamento individual, não teria a força para reagir aos fenómenos sociais no sentido que consideravam certo. Engano!

O artista é um individualista. Receber ordem dum comissário para fazer duma determinada maneira, para utilizar uma certa cor, vai contra este individualismo que é a essência da criação. As obras panfletárias estão condenadas ao fracasso: poderão ser úteis para um local ou um tempo reduzido. Muito longe da perenidade duma obra de Arte!

Onde eu já vou!

Abraço,
António