Hipnos e Tânatos (Fonte: Wikipédia Livre)
Na concepção da sociedade
atual, com tantas motivações para se ficar alerta, o dormir é, para muitos o
mesmo que perder tempo, um roubo de horas vividas, um exercício para a morte.
Desde a antiguidade a mitologia dava ao sono, processo biofisiológico rítmico,
cíclico, subordinado a estímulos elétricos e neuropsíquicos, a importância para
manter o homem em estado hígido. Os
grandes estudiosos do assunto, psicólogos e pesquisadores da mente, são
unanimes: há no domínio de Hipnos, deus do sono, filho da noite (Nyx) e de Érebo
(a treva primordial), irmão de Tânatos, deus da morte, outro mundo ainda não
totalmente desvendado, que comanda o subconsciente e favorece a
criatividade. Quando esse processo
neuropsíquico é afetado por doenças (físicas ou psíquicas) ou por comportamentos
que prejudiquem a rotina, aparece a insônia que, frequente, mina a qualidade de
vida. Dormir o que se precisa ajuda a
manter-nos física e psicologicamente saudáveis, mantém-nos vivos.
Aqueles que, por
necessidade ou tipo de trabalho, são obrigados a trocar o dia pela noite,
necessitam de mais tempo para descanso e de algumas compensações financeiras e
sociais, como aposentadoria mais
precoce. Mas nem sempre o preço pela falta
de sono é só esse. Os pesquisadores são enfáticos; a falta de um sono reparador leva a um
déficit cognitivo e motor, a alterações de humor, a fadiga crônica, a maiores
riscos de acidentes e erros que prejudicam os relacionamentos sociais e
familiares. A história mostra essa tendência. Relatos de tragédias como a do
Titanic(1912), a do petroleiro da EXXON Valdez (1989), a da usina nuclear
de Chernobyl (1986), foram acidentes que ocorreram à noite, quando equipes
submetidas a longas jornadas de trabalho sem o descanso necessário, com
privação de sono, tiveram falhas ou cometeram mais enganos que o normal. Embora não divulgado à priori, soube-se
posteriormente que a equipe de manutenção do ônibus espacial Challenger havia
trabalhado exaustivamente na noite anterior, para reparar o defeito numa peça
do tanque de combustível. Problema que ficou aparentemente resolvido... até à explosão do ônibus.
Mas como tudo tem
exceções, há também aqueles que julgam a noite a parte do dia mais produtiva,
pela quietude e sossego de que se dispõe. Poetas, escritores, artistas,
cientistas, cérebros diferenciados há que encontram nessa ocasião o seu melhor
tempo. O Nobel de Química de 2003, R. MacKinnon disse: “Meus momentos mais
produtivos são aqueles em que não consigo dormir”. Em geral são mentes
privilegiadas que conseguem funcionar tanto pela atividade cerebral racional,
como pela intuição, quando esta está liberada, sem o controle e censura da
racionalidade, como um caleidoscópio que pelo movimento ao acaso mostra novas e
inesperadas formas de visão. Para os
filósofos a intuição é uma modalidade rápida, fugaz, privilegiada de
conhecimento, que tem papel decisivo na criatividade, seja artística ou
cientifica. Mesmo nestes casos, as pesquisas comprovaram que o repouso
noturno aguça duas vezes mais o sentido intuitivo dos que repousam, do que os que
não repousam adequadamente. Logo Hipnos tinha razão em se deitar numa cama de
penas macias, numa caverna escura junto a uma das margens do Lethe, o rio do
esquecimento. Dormir não é perda de tempo, dormir faz bem à vida.
Maria Eduarda
Fagundes
Uberaba, 30/03/13
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