sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

ESTUDO DO RIO E DO CÉU E DAS OUTRAS COISAS GERAIS QUE ENTRE ELES SE ENCONTRAM



Presépio virtual

Num mundo onde tudo começa a ser virtual (e eu acredito que, ainda que ocultamente, virtuoso), onde os próprios cientistas começam a acreditar que o mundo é hologramático, olho as figurinhas do meu presépio e sinto que por muito que a ideia de um universo virtual me seja sedutora, adoro saber que as figurinhas são feitas de barro e que foram moldadas pelas mãos de alguém e que foram pintadas com um pincel de verdade, assim como gosto de saber que estão impregnadas das minhas memórias de tantos anos. O Menino Jesus assistiu à minha adoração e eu senti-me tantas vezes por ele adorada ao adorar. Onde está quem adora, onde está quem é adorado? Aquele menino é o meu companheiro de infância nas noites frias e solitárias de Dezembro de uma menina filha única e sensibilidade à flor da carapaça. Quem precisava mais de quem? Ele de mim ou eu dele? Ali, semi-despido sobre as palhinhas de verdade, o menino de barro só me tinha a mim, mas uma réplica dele tinha outros meninas e meninas em outras casas, ao passo que, pensava eu, outras meninas réplicas de mim, em outras casas, teriam um menino para adorar? Aquele Menino Jesus, a Barbie possível nesse tempo, tinha toda a minha atenção, para além de uma mãe e de um pai de barro e um burro, uma vaca, patos, ovelhas, um galo, um anjo, uma pastora, um moinho, um rio, um lago, um cão, três Reis magos, por ordem totalmente arbitrária. Só não tinha, ao contrário da Barbie, um guarda-roupa. O seu estilo era mais a fraldinha, e o seu conforto, o bafo do jumento. Recordo-me de me sentar ao pé dele numa divisão que eu mantinha às escuras, apenas iluminada pela pequenina vela de cera que ajudava a aquecer o corpinho de Deus e ali ficava só a olhar. Só pela companhia? Por compaixão? Por sentimento místico? Não me recordo de alguma vez lhe ter pedido nada. Porque seria? Por não me ocorrer que tal fosse possível? Por não acreditar que fosse atendida? Por não acreditar que aquele menino de barro tivesse poder para tal? Por não precisar de pedir nada? Por estar bem assim como estava, apenas em adoração na qual eu nem sabia que estava? Eu pastora, anjo e burro, fazia e ainda hoje me sinto, parte integrante das figuras de presépio, o qual, sem mim, não está completo. Tal como afirmam os cientistas em relação às partículas: estas têm um comportamento completamente diferente perante um observador. E se for um adorador? Como será? Que se passará na caixa do meu presépio com as figurinhas embrulhadas em folhas de revista no cimo do armário mais alto quando eu não as observo? Eu penso que reside aí o grande milagre e mistério do Natal E do Universo.

Risoleta C. Pinto Pedro

3 comentários:

luis santos disse...


Amiga Riso Cor de Luz

Já tinha visto, mas nunca tinha lido um presépio tão bonito. Muito Obrigado. Decididamente, as expectativas para este ano de um bom Natal são as melhores.

Beijinhos.

aluzdascasas disse...

Muito grata Luís, pela sensibilidade e pelo acolhimento. Este é um belo sítio para montar um presépio.
Abraços, calor no teu lar.

MJC disse...

Parabéns Risoleta por mais este belíssimo texto. Parabéns e obrigado por nos mostrares estes lugares onde nos sentimos bem.

Um beijo e Feliz Natal.

Manuel João