quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Tupinambo ou Girassol Batateiro


por Miguel Boieiro

Ouvi falar do tupinambo, como tubérculo comestível, há cerca de quatro décadas. Fiquei curioso, mas nunca tinha surgido a oportunidade de conhecer esta planta que os meus amigos vegetarianos consideram adequada numa nutrição saudável.

Até que no verão de 2010, quando visitei a pequena exploração de agricultura biológica de Miguel Gervásio, perto de Sesimbra, travei conhecimento com o tal tupinambo ou, como também é conhecido, o girassol-batateiro. Trouxe alguns tubérculos e enterrei-os descuidadamente no quintal. A verdade é que, fruto dos demasiados afazeres a que me dedico, nunca mais me lembrei da plantação. Na primavera seguinte brotaram, de facto, algumas plantas mas não deram flor e nada fiz. Este ano apareceram, como por encanto, uma dezena de vistosos girassóis. Esperei que as flores secassem e agora resolvi recolher alguns tubérculos. Cozi-os em água e uma pitada de sal, como se faz com as batatas, e apreciei finalmente o manjar. Está aprovado!

O tupinambo, Helianthus tuberosus, pertence à extensa família botânica das asteráceas ou compostas e ao género dos heliantos, de que se conhecem para cima de 70 espécies. É muito semelhante ao girassol, Helianthus annuus. As suas folhas são igualmente grandes, simples, dentadas, ovais e rugosas, alternas ou opostas. Os caules atingem facilmente 3 metros de altura. As inflorescências formam capítulos amarelos dourados e as sementes são aquénios. As duas plantas distinguem-se exteriormente pelo tamanho das flores, já que os girassóis possuem-nas em maior dimensão. No resto são aparentemente iguais. Todavia, se bem que ambas tenham ciclo anual, a maior diferença encontra-se nas raízes e na forma de reprodução. O tupinambo reproduz-se essencialmente pelos rebentos que brotam do seu raizame, sendo, por isso, uma espécie perene, enquanto o girassol nasce, todos os anos, se se deitar a semente à terra.

Ora sendo uma herbácea vivaz, de fácil cultivo, muito resistente a doenças, não exigindo solos férteis e aguentando-se bem em climas frios, o tupinambo está, nalguns países, classificado como espécie invasora, a extirpar por ser atentatória de outras culturas. Erradamente, julgo eu, pois não se toma em conta o seu assinalável valor alimentício, como a seguir vamos ver.

Os tubérculos do tupinambo têm constituintes semelhantes aos da batata, mas possuem sobre esta uma enorme vantagem. A batata é provida de amido, ao contrário do tupinambo. Ao invés, este possui inulina que é um polímero da frutose, o qual não influencia a glicémia dos diabéticos. Para além dos hidratos de carbono de que a inulina é o principal, encontram-se também vitaminas, em especial a C, a B, a provitamina A e sais minerais, especialmente o potássio.

Os tubérculos que colhi no meu quintal são pequenos, mas, em vários tomos sobre botânica que consultei, refere-se que podem atingir 10 cm de comprimento e 5 cm de grossura. São de configuração nodosa e irregular, fazendo lembrar, pela forma, o gengibre. A sua cor é branco-amarelada com laivos avermelhados e purpúreos. Podem ser comidos frescos (crus) ou cozidos como as batatas, não sendo necessário retirar-lhes a pele. É possível obter deles uma fermentação alcoólica com fama de ser diurética, tónica e afrodisíaca.

Tanto as folhas como os caules são ricos em matérias proteicas e, por isso, tornam-se adequados para ensilagens destinadas à alimentação do gado.

Oliveira Feijão indica “a maceração das folhas em vinho tinto como calmante e resolutivo e o infuso das flores como febrífugo e anti oftálmico”.

No século XVII, quando foi trazido da América do Norte, donde é oriundo, o cultivo do tupinambo passou a ter grande repercussão na Europa, tornando-se popular como sucedâneo da batata. Contudo, o seu menor rendimento, o efeito invasivo e as dificuldades de armazenamento acabaram por arrefecer o entusiasmo inicial dos agricultores. Com efeito, os tubérculos murcham e secam alguns dias após a colheita o que impossibilita a sua rendível comercialização. Em contrapartida, podem ficar enterrados no solo sem se degradarem, mesmo em climas muito frios, desde que não haja excesso de humidade. A solução será recolhê-los só quando necessitarmos de os consumir.


E pronto! Ficam estas “dicas” para espicaçar a curiosidade dos leitores e induzi-los à experimentação alimentar de mais um vegetal esquecido. Em época de guerra (ou de crise aguda) “não se limpam armas”!

5 comentários:

Luís F. de A. Gomes disse...

Estes seus textos, Miguel, constituem uma leitura sempre interessante e, no meu caso pessoal, altamente instrutiva. Através dela, tenho aprendido imensos dados e, sobretudo, melhor entendido os equilíbrios em que a Natureza assenta e como os mesmos são fundamentais para as nossas vidas de humanos. Este, não foge à regra.
Apenas uma curiosidade que não ficou resolvida nestas suas palavras e que desde já agradeço se a souber resolver.
Diz que a planta é oriunda da América do Norte, mas eu pergunto se a sua designação, o nome com que é conhecida, tupinambo, tem a mesma origem. Será que a planta, embora oriunda do Norte daquele continente, não nos terá chegado por via dos nossos contactos com as populações do Sul do mesmo? É que o vocábulo tupinambo, especialmente pela sua primeira partícula - tupi - parece ser de origem dessas latitudes mais meridionais, mormente do grupo linguístico composto pelo Tupi Guarani. Sabe dizer-me algo a esse respeito? Seria deveras curioso o nome ser, também ele, oriundo do Norte. Poderia tratar-se de um engraçado enigma antropológico.

fary frank disse...

onde poço adequirir o tupinambo se souberem contactem me para o meu email faryfrank@gmail.com obrigado.

Adina disse...

Wikipedia: Os tupinambos foram cultivados pelos povos ameríndios muito antes da chegada dos europeus. O explorador francês Samuel de Champlain encontrou esta planta semeada em Cap Cod, costa nordeste dos Estados Unidos em 1605. Apesar de ser originária a América do Norte, o nome tupinambo é provenientes dos Tupinambás, povos indígenas que viviam no Brasil. Alguns indivíduos desses povos foram levados a Paris em 1613 na mesma época em que se difundiu o cultivo desta planta na França e logo ao resto da Europa, o que fez que os europeus associassem os indígenas brasileiros à planta de origem norte-americana.

Miguel Boieiro disse...

A amiga Aldina apresenta um esclarecimento adequado sobre a origem do termo "tupinambo".
No meu quintal eles já estão bem viçosos. Irei ter uma boa colheita com toda a certeza.

Miguel

Anónimo disse...

Maravilhoso, seu texto. Obrigadas!