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I
VOLTAR AOS MERCADOS,
a gramática da economia
Não se ouve outra coisa: temos de
voltar aos mercados. Na tentativa de entender, poderíamos analisar sintaticamernte
a frase. Sujeito: “nós”? Claro que o sujeito de “temos” é “nós”. Mas é
realmente de nós que se trata ou deles? Partindo do princípio que somos nós (e
de que a frase é gramatical) quantos de nós cabem na casca de noz que é este
nós? Será este nós grande como as caravelas da Índia onde cabiam especiarias,
madeiras raras, ouro, ideais e sei lá que mais?
Deixemos o sujeito, que se
afigura nesta frase muito complexo. Passemos ao predicado. Composto. Por dois
verbos: “ter” e “voltar”. Voltar significa que já lá estivemos, Mas quem seria
tão idiota que estando num sítio onde se sentisse bem o ia deixar? Admitindo
que sim, que estivemos, saimos e temos de voltar, esbarramos novamente com o sujeito,
porque é preciso saber quem é que volta. Adiante, que este enigma gramatical
não está fácil e voltar também não. Voltemos então “aos mercados”, que se
chama, com a nova moda, modificador. Poderia ser complemento oblíquo, mas como
estes são “grupos de palavras indispensáveis ao verbo para que este complete o
seu sentido”, teremos de pôr de lado esta hipótese. E aqui não poderia estar
mais de acordo. Muito oblíquo, este regresso de quem não sabemos, aonde
desconhecemos e de uma forma que é um completo mistério. Temos então um “nós”
muito enleado que não sabemos quem é, que se convenceu que precisa de voltar a
um sítio onde já estivemos (partindo do princípio de que nós somos nós) e onde
não sabemos como se regressa (partindo do princípio de que já lá estivemos). Espero,
com esta reflexão erudita, ter contribuído para a clarificação da questão dos
mercados, segundo os economistas, vital, mas com que o Governo não parece estar
muito preocupado, porque o negócio dele é outro. Para remate, e partindo da
noção de modificador,que segundo a definição é “dispensável e poderia ser
eliminado da frase”, parece-me estarmos perante uma evidência que a gramática
nos traz, para possível mas não provável embaraço dos
economistas. “Mercados” é a parte que pode ser eliminada, permanecendo o
“voltar”. Teremos então de voltar. Mas
onde? Onde? E quando? E como? E principalmente... para quê?
Fará tudo sentido se este voltar
se concretizar num regresso a “nós”, uma espécie de “À procura do sujeito
perdido”. Não é Pessoa que escreve num poema do ortónimo “É em nós que é tudo”?
E não é isto verdade? Sem que seja necessário saber gramática, nem as cotações
da bolsa ou a flutuação dos mercados.
Risoleta C. Pinto Pedro
4 comentários:
Brilhante exercício, para meditar, em torno de "nós", "voltar" e "mercados"! Uma palavra mais pode resumir a moral da história: "acordar"!
Parabéns Risoleta.
O conteúdo é rico e direccionado.
A forma é de um torneado belo e estimulante.
A formulação é em torno do que nos é essencial, a todos.
A temática é a que concentra conversas de todos os dias, demagogias de todas as horas.
Haveria melhor forma de inaugurar uma colaboração (que desejo possa vir a tornar-se frequente)neste nosso blogue?
Beijinho prá Autora.
Manuel João Croca
O Estudo do nosso rio e céu é coisa que nos é muito comum. Sempre desbravando o azul. Em cima e em baixo. E por dentro o por-menor dos mercados.
Hoje o rio está calmo. Até parece que medita ou faz a sesta. As gaivotas riem e sentam-se, e alguns peixes inquietam-se com as sombras que correm por cima das águas.
Muito orgulhosa esta revista multimédia em formato de blogue. Com tão maravilhosos participantes não se pode fazer por menos.
E Abraço.
Caros amigos:
É um prazer que me põe feliz, ter-me juntado a vós! Muito agradecida pelas vossas leituras. Aqui estarei sensivelmente de mês a mês. Como leitora, mais frequentemente. Abraços
Risoleta
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