por Miguel Boieiro
Chufa
O Homem, como elemento integrante da Natureza, deve procurar,
onde vive, todas as condições necessárias ao seu equilíbrio biofísico.
A alimentação diversificada que logra tirar partido do meio
natural, das suas peculiaridades climatéricas e da especificidade física e
química dos solos e dos aquíferos, constitui um dos principais vetores da saúde
das populações.
Diversificar, em termos de alimentação racional, significa
enriquecer a dieta, educar o paladar viciado por uma ementa padronizada e
artificial de duvidosa qualidade, e até completar uma restauração individual e
coletiva demasiado carente.
Vem isto a propósito da divulgação de uma plantinha que, por
graça, digo que serve para fazer leite e café, a qual tem todas as condições
para ser cultivada com êxito em grande parte do nosso País. Ela necessita
fundamentalmente de terrenos leves e arenosos e de atributos climáticos de tipo
atlântico-mediterrânicos.
Importa desde já esclarecer que não me movem intuitos
científicos ou económicos, para os quais não me encontro suficientemente
preparado e que a outrem competem. Apenas pretendo despertar curiosidades no
campo da alimentação natural, segundo uma perspetiva atraente, útil e acessível
à maioria das pessoas.
A plantinha em questão denomina-se chufa, ou amêndoa-da-terra,
por ser uma oleaginosa substituta da amêndoa, ou ainda, juncinha-mansa
por se parecer com a junça, essa terrível infestante que alastra pelos nossos
campos. A parte comestível é constituída pelos seus tubérculos acastanhados de
formato ovoide irregular, os quais terão, no máximo, 2 cm de comprimento.
Estes pequenos tubérculos possuem cerca de 30% de fécula ou
amido, 14% de açúcar, 20% de um óleo finíssimo de qualidade comparável ao
azeite e 28% de proteína. Como se constata, trata-se de um produto altamente
nutritivo, mas igualmente delicioso.
A Cyperus esculentus L.
(seu nome científico) pertence à família das ciperáceas e é conhecida e
utilizada desde remotas eras. Foram encontradas sementes, ou melhor,
tubérculos, em sarcófagos egípcios de há 2000 anos a.C.
O cultivo da chufa generalizou-se na Europa a partir do
século VIII, por ação dos árabes, e hoje está mais divulgado em Espanha
(Andaluzia e sobretudo, província de Valência).
Costumo afirmar que com a chufa se obtém simultaneamente leite
e café, o que causa o maior espanto aos desprevenidos. Na verdade, os
tubérculos moídos num moinho de café ou noutra máquina apropriada do tipo
“1,2,3”, a que se junta água, formam a famosa “horchata de chufa”, tão
conhecida em Valência, Granada ou Córdova, onde a encontramos amiúde nas
“gelatarias”.
Mas vamos explicar melhor como se faz este leite vegetal.
Colocam-se os tubérculos de molho durante 24 horas. Seguidamente lavam-se em
várias águas para desprender a terra que trazem agarrada. Procede-se depois à
trituração, finda a qual, se junta água a gosto. Agita-se bem para favorecer a
dissolução e côa-se através de um passador fino. A quantidade depende de cada
um. Quem desejar um leite espesso e nutritivo deve usar, como mínimo, 250 g de
chufa para um litro de água. Pode adoçar-se com açúcar ou mel (preferível) e
beber frio ou quente, consoante o gosto do consumidor.
E como se faz o “café”? Pega-se simplesmente nos resíduos da
trituração depois de obtido o leite e torram-se os mesmos em forno brando. O
produto final dá origem a uma bebida muito agradável que substitui o chá ou o
café. Experimentem!
Há também quem consuma a chufa de outras maneiras. Os
espanhóis comem-na crua e demolhada como os tremoços. Outros utilizam a farinha
de chufa como aditivo em pastelaria.
Vamos agora à plantação. O solo tem de ser leve e silicioso,
como já foi dito, e conter alguma humidade pelo que convém regá-lo
assiduamente. São de rejeitar terrenos declivosos e pedregosos. A cultura é
excecionalmente produtiva, basta dizer que um só tufo pode gerar, nas condições
mais favoráveis, até um milhar de tubérculos. A “sementeira” processa-se em março
e a colheita em setembro. Os pequenos tubérculos são colocados a uma
profundidade de 2 cm, separados de 6 cm e em filas paralelas distanciadas entre
si de cerca de 30 cm, levando, obviamente, algum estrume bem curtido. Aquando
da colheita, que é a parte mais trabalhosa, convém lavá-los e secá-los bem para
permitir uma conveniente conservação. Se não se conseguir adquirir as sementes
no nosso país, é fácil obtê-las em Espanha.
E pronto, fica feito o repto aos amantes da agricultura e até
aos grandes agricultores. Quem sabe se a cultura da chufa não será um bom
negócio?
Mas para isso, fica também a sugestão aos que prezam uma sã
alimentação. Experimentem o leite de chufa e também o café e irão ver como são
saborosos e nutritivos.
1 comentário:
Mais uma rúbrica deveras interessante no nosso EG que não pára de se enriquecer.
Parabéns aos seus autores.
Manuel João Croca
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