terça-feira, 13 de novembro de 2012

FRESCOS


O casco de um navio, à superfície do céu que, não podendo deixar de ter o seu rasto de espuma, se perde, de cá para lá, entre o vento e as ondas laranjas das nuvens, silenciosamente, ainda quarto crescente e já luz e sombra
e o navio passa e dissolve-se numa longa estrada azul, por quanto os carros passem e o asfalto molhado se transforme em cintilações decompostas do branco.

2 comentários:

Anónimo disse...

Gosto das viagens que me proporcionam os teus Frescos - ora no fumo de um cigarro, ora na música, mas sempre nas memórias de quadros observados algures e que, por um motivo ou por outro, me ficaram na memória! E que me chegam outra vez, trazidos pelas belas pinturas que fazes com as tuas palavras! Turner, hoje, sem dúvida! Terás, também, pensado nele quando escreveste?

Luís F. de A. Gomes disse...

Turner, gosto muito de Turner e já vi muitas das suas obras - ao vivo - e compreendo a evocação que faz, os navios, o laranja das nuvens, o próprio vento, Turner, como diz, não sei se sem dúvida, mas Turner, o Turner que captou momentos únicos da atmosfera terrestre e os deixou para o futuro, para a pintura e os amantes da pintura, certamente, mas também para os geofísicos que dele extraem muito mais que ele sequer poderia imaginar. Só posso dizer pois o quanto me sinto lisonjeado pela companhia que me atribui. Fico grato por isso.

Mas é companhia que só a mim engrandece e certamente apoucaria o pintor genial que ele foi. Não é só o deleite da contemplação do belo o que, por si, tanto seria, é também a viagem, não é, no tempo e no espaço, é tal e qual aquela viagem que o Golding nos leva a fazer na companhia do inolvidável Talbot, nós sentimos aqueles ambientes porque lá entramos pela grandeza dos Mestres que os criaram. Turner seria assim uma excelente fonte de inspiração para uma qualquer pena, mesmo como a minha.

Contudo, não posso dizer que tenha sido essa a companhia quando escrevi estas palavras. Nem mesmo a partir das mesmas sou capaz de as contextualizar e a distância de trinta anos muito contribuirá para isso. De qualquer forma tenho dúvidas que a referência tenha sido assim tão elevada. O que eu então pretendia mais não era que registar o que estivesse pensando ou sentindo ou, como é o caso destes frescos, tão só vendo, num dado momento. Era essa a regra que, se outra ocasião anterior não houvesse para o fazer, pelo menos ao chegar a casa, me levava a escrever todos os dias. Foi nesse contexto que surgiram este conjunto de poemas, assim lhes chamo e, neste sentido, seguramente mentiria sequer se insinuasse que no momento em que escrevi este, tivesse o genial Pintor em mente.

O que é muito diferente de deixar de admitir o quanto me satisfaz que seja a Turner, justamente o Turner do meu encanto, a estrela a que este meu poeminha o conduziu. É algo que certamente me eleva e que duvidosamente merecerei. Sou, por isso, agradecido.